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Ministério Público vai apurar gastança de deputados em Minas

Estado de Minas
postado em 28/04/2010 11:49
O procurador-geral de Justiça de Minas Gerais, Alceu José Torres Marques, informou que apresentará denúncia de crime de peculato contra os deputados que apresentaram notas frias para justificar despesas com verba indenizatória da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Com pena prevista entre 2 e 12 anos de prisão, o peculato é o crime cometido por funcionário que desvia dinheiro público para proveito próprio. O procurador instaurou na última semana procedimento para investigar irregularidades e abusos cometidos pelos parlamentares com o adicional mensal e prometeu divulgar as primeiras conclusões em 60 dias. Os envolvidos serão pressionados a devolver os recursos usados de forma irregular.

O processo foi motivado pela série de matérias Notas Frias S/A, do Estado de Minas, que na última semana denunciou o uso da verba indenizatória para pagamento a empresas que só existem no papel ou que já fecharam, restituição por despesas pessoais de parlamentares, emissão de notas fiscais fictícias ou com valores mais altos que os cobrados pelos serviços prestados, entre outros abusos. Única autoridade do Ministério Público com a prerrogativa de investigar a presidência dos três poderes em Minas (neste caso, os gastos com verba indenizatória foram autorizados pela direção da ALMG), Marques cogita pedir a ajuda de promotores e da Polícia Civil para garantir celeridade à investigação. Em entrevista ao EM, o procurador defende uma investigação que preserve as instituições e não exponha indevidamente parlamentares às vésperas do período eleitoral.

O sr. anunciou a abertura de processo para investigar a ocorrência de abusos e crimes com a verba indenizatória repassada aos deputados estaduais. Quais os primeiros passos dessa investigação?
O procedimento foi instalado no âmbito do Ministério Público. Vamos dividi-lo em dois grandes grupos. O primeiro diz respeito às questões de natureza civil, como reparação de danos e prejuízo causado ao erário. O segundo cuida da questão criminal, que diz respeito à falsificação de documentos e dos meios eventualmente ilícitos praticados. Queremos saber a forma como a Assembleia regulamenta a verba indenizatória. Vejo com muita felicidade o que eles já estão prevendo para o futuro, por meio de um convênio com a Auditoria Geral do Estado. (Na última semana, a Assembleia e a Auditoria celebraram um convênio para que todos fornecedores de deputados sejam auditados).

E a questão criminal?
Nós vamos olhar a natureza e a licitude das notas. Trataremos da denúncia trazida a público pelo Estado de Minas, de uso de notas frias, o que é crime, principalmente quando são usadas para aferir vantagem ilícita. Faremos um estudo mais amplo para saber se há aí uma grande conspiração ou se são casos isolados. Vamos subdividir a investigação de caso a caso, nota a nota. Podemos convocar alguns promotores da área criminal para darmos andamento ao caso.

Qual é a responsabilização prevista para deputados que apresentaram nota fria à ALMG?
Em tese, crime de peculato, que absorve o crime de falsidade. Na verdade, você está usando a nota para auferir vantagem indevida. (A pena prevista é de 2 a 12 anos de prisão)

Qual estrutura do senhor para conduzir as investigações?
Temos uma estrutura inicial. Eu quero saber da Assembleia quais ferramentas de controle ela tem, o que vai fazer, as informações que já estão prontas, dados dos casos específicos. Vamos fazer um exame dos documentos da Assembleia e dos divulgados pela imprensa.

Essa equipe terá quantas pessoas?
São dois promotores da área civil e dois da área criminal, fora os analistas. Vamos nos reunir para ver a necessidade de buscar outros colegas especificamente para este caso. Há duas questões antagônicas aqui, de momento e política, que gostaria de eliminar. A primeira delas: temos que fazer o possível para preservar as nossas instituições, elas têm que ser fortes. E uma forma de preservação do Poder Legislativo é separar as pessoas das instituições. Por outro lado, em um ano eleitoral, nós temos que ter todo o cuidado e todo o sigilo para que pessoas não sejam expostas indevidamente, para que o Legislativo não seja confundido com uma grande organização criminosa.

Se comprovadas as irregularidades, o dinheiro pode vir a ser devolvido?
Perfeitamente. Aquelas pessoas que disseram que não tinham conhecimento dos fatos, ou que insistem que por um equívoco usaram a verba, julgando que era uma situação de indenização que hoje não se justifica, podem reembolsar o dinheiro aos cofres públicos. Outras situações vamos tratar de maneira diferenciada. Há situações que chocam o valor moral do homem médio, apenas pelo conhecimento do caso. Você não tem como explicar isso. Estamos nos aproximando do fim do mandato dos parlamentares. É preciso que essas coisas não interfiram e que os justos não paguem pelos pecadores.

Que situações chocam o sr., particularmente?
Eu prefiro fugir dos casos concretos, porque seria uma maneira de estar adiantando um juízo de valor. Mas eu penso que existem situações que não se explicam por si só. A indenização tem que ter uma ligação direta com o trabalho. O que foge à natureza do trabalho do parlamentar, eu acho que é abuso. Sem levar em consideração, ainda, as notas frias, os fatos que sequer existiam.

Qual a opinião do sr. a respeito do pagamento de IPVA e outras taxas dos carros de luxo de propriedade dos deputados com uso da verba indenizatória?
É uma questão que vai ter que ser enfrentada. Este carro estaria direcionado ao trabalho, ou ao uso do cidadão que é proprietário? Independentemente do valor, em princípio, se houver a vinculação com o trabalho, nós temos que ter a coragem de admitir que isso tem um certo fundamento. Mas há outra questão: a Assembleia poderia dar isenção tributária aos parlamentares, por exemplo? Se for uma forma de isenção, ou coisa do tipo, essa forma poderia ser feita pela Mesa Diretora? Eu prefiro não emitir um juízo de valor agora.

O sr. falou na possibilidade de isenção dos impostos. Como o cidadão comum receberia a possibilidade de parlamentares, por serem parlamentares, não pagarem o IPVA?
Talvez fique mais barato você isentar o IPVA do que fornecer um carro público, por exemplo. Eu não estou justificando isso, não quero justificar. Mas quero insistir que antes de fazer um estudo e ouvirmos as outras razões, é muito prematuro e, da minha parte, temerário, emitir um juízo de valor da Mesa Diretora da Assembleia (autorizando o pagamento de impostos). O que não significa que nós não questionaremos a legalidade e a constitucionalidade desta decisão.

Dois empresários que prestam serviço de divulgação parlamentar disseram que grupos de deputados fazem uma caixinha para campanha, sugerindo a existência de caixa 2. Vão investigar isso?
Se alguém usou para fazer caixa 2, para aumentar patrimônio pessoal, vai mudar pouco o sentido da investigação. Agora, isso é uma coisa que tem que ser bem dita para o povo e para os eleitores: eles têm o direito de saber. Se verbas públicas estão sendo eventualmente desviadas, cabe ao povo conhecer e nosso papel é saber como elas estão sendo desviadas. O caso das notas frias é talvez o mais fácil de ser resolvido, embora dependa de uma perícia. Temos que ouvir as partes interessadas.

O sr. falou sobre a importância das pessoas saberem como os parlamentares gastam o dinheiro público. Em quanto tempo podemos voltar à esta sala e saber como se avançou nesta investigação?
Temos um trabalho de pesquisa, mais intelectual, e outro mais braçal. Podemos marcar 60 dias? Vou dar o primeiro andamento disso. É bom para mostrar que aqui as coisas não ficam paradas.


Apuração no TCE continua

Embora magistrados, advogados, prefeitos, lobistas e outros indiciados pela Polícia Federal (PF) no desdobramento da Operação Passárgada já tenham sido denunciados à Justiça pelo Ministério Público, o mesmo não ocorreu com os conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE) suspeitos de envolvimento com a organização criminosa. Responsável pela condução deste processo, o procurador-geral de Justiça de Minas Gerais, Alceu José Torres Marques, disse não ter realizado a denúncia porque a apuração ainda não foi concluída.

;São mais claras as condutas das pessoas envolvidas na linha de frente, na ponta, sem querer emitir juízo de valor. As pessoas que estavam por conta das decisões tiveram um envolvimento mais evidente, por isso foram denunciadas;, disse o procurador, que acredita estar perto de esclarecer a participação dos conselheiros do TCE nos crimes denunciados na Operação Passárgada, entre eles a venda de decisões envolvendo prefeitos que eram alvos de processos administrativos no tribunal.

Marques também disse que ainda não há uma conclusão do procedimento que investiga o pagamento de salários acima do teto do Judiciário aos conselheiros do tribunal. O processo foi motivado por denúncias publicadas no ano passado pelo Estado de Minas. ;O TCE informou como é feito o pagamento, mas ainda precisamos analisar caso a caso. O que houver de equivocado ainda vai ser objeto de estudo, seja para ressarcimento ou compensação em vencimentos futuros;, afirmou.

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