postado em 10/05/2010 08:33
Gilson Barbosa, 34 anos, pai de oito filhos, revira o lixo catando materiais que podem ser reaproveitados. O sol está forte na manhã de quinta-feira. O calor acentua o cheiro de podre que exala do lixão da Vila Estrutural. Ele senta para descansar numa das cadeiras de um boteco montado sobre a montanha de lixo. E fala das casas populares que estão em construção perto dali. ;Já tem tempo que a gente espera;, lamenta. Não dá para construir uma casa com a própria renda. ;Dá para tirar um salário, no máximo;, diz. Ele trabalha no local desde os 14 anos. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) prometeu atender 9,4 mil famílias da vila até o fim deste ano, num projeto de reassentamento de população em área de lixões, mas havia construído apenas 339 casas até o final de 2009. Só 69 foram entregues.Mas Gilson não tem grande expectativa em relação às casas que serão entregues. ;Pra mim não serve. Se eu botar os meninos todos pra dentro, durmo na rua.; As moradias têm 44m;, com dois quartos, sala e cozinha conjugadas e banheiro. Estão sendo construídas pelo Governo do Distrito Federal (GDF). Antônio Desidério, 23 anos, também catador de lixo, afirma que espera há dois anos pela entrega das casas. Ele vai ganhar uma. Questionado sobre o atraso, comenta: ;O governo não dá dinheiro para ninguém. Tão (sic) só enrolando e comendo o dinheiro;.
Em setembro do ano passado, o Tribunal de Contas da União (TCU) apontou um superfaturamento de 13% na construção do primeiro lote de casas populares na Estrutural. Foram pagos R$ 38 milhões na construção de 1.290 unidades, mas o tribunal apurou um sobrepreço de R$ 5,2 milhões, decorrente de preços unitários excessivos e quantitativo inadequado. Também identificou restrição à competitividade na licitação, inadequação ou inexistência de critérios de aceitação de preços unitários e global quantitativo inadequado; fiscalização deficiente e cumprimento apenas parcial de condicionantes ambientais. Ficou decidida a retenção cautelar do dinheiro que teria sido paga a mais.
Desidério afirma que estaria havendo outro problema: ;Ninguém quer as casas que ficaram prontas;. Por que? ;Porque ficaram muito perto do lixão. Tem cheiro, mosca;. Ao lado do primeiro lote, de 460 casas, tem uma enorme placa: ;Aqui tem investimento do governo federal;.
Serviço refeito
Na região mais baixa da vila, próxima a um riacho, o governo toca as obras de saneamento, para controle das águas pluviais. Uma escavadeira retira o lodo formado numa das caixas de contenção durante o período da chuva. ;A obra atrasou, não deu para fazer antes das chuvas. Agora, estamos refazendo tudo;, lamentou um operário. Mais abaixo, está sendo refeita a armação de concreto para um canal. ;Isso foi refeito várias vezes. A gente coloca as ferragens de dia e o pessoal da vila rouba à noite. Usam os vergalhões na construção de lages. Agora, a gente só traz o material que vai ser usado no dia;, informa outro trabalhador. Questionado por que não colocam vigias no local, ele responde: ;Aqui, nenhum vigia quer ficar;.
A proposta do governo era entregar a urbanização da favela até dezembro deste ano, no fim do governo Luiz Inácio Lula da Silva. O dinheiro foi disponibilizado em 2007, mas a licitação só saiu no ano seguinte. Até o final do ano passado, foram executados apenas 20% da obra. Está programada a execução de 70% da obra até dezembro deste ano. A conclusão ficou para abril de 2011, se tudo der certo a partir de agora.
O número
R$ 5,2 milhões
Foi o sobrepreço que o TCU apontou na construção de 1.290 casas na Vila Estrutural