postado em 30/06/2010 08:25
Brasília e São Paulo ; Com uma série de feridas por cicatrizar, o DEM pretende anunciar apoio à candidatura de José Serra (PSDB) na convenção nacional da legenda, na manhã de hoje. Em pé de guerra com os aliados tucanos, o partido mudou o tom do discurso. Admitiu que, mesmo sendo preterido na indicação do vice de Serra, o acordo está próximo. Isso significa que engolirá, a contragosto, a chapa puro-sangue com o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) na vice. Depois de disparar contra o PSDB durante o fim de semana, o presidente do DEM, Rodrigo Maia, viu o descontentamento diminuir em uma reunião de três horas com caciques tucanos e o presidente de honra da legenda, Fernando Henrique Cardoso. ;O DEM tem toda a vontade de continuar nessa aliança. Acreditamos na vitória de Serra. O partido não pode ir desunido à convenção nacional;, desviou.As principais lideranças do DEM saíram da reunião com o PSDB praticamente admitindo a derrota no embate pelo posto de vice. Antes defensor de um nome do partido, Maia se recusou a citar uma alternativa para o posto e disse que o maior descontentamento não é pela opção por Dias, mas com a forma como a escolha foi divulgada. O anúncio foi feito por um aliado, Roberto Jefferson (PTB), pelo Twitter, sem consulta prévia ao DEM. O líder do partido no Senado, José Agripino Maia (RN), saiu do encontro ressaltando a necessidade de as legendas evitarem arestas. ;O que queremos é que aquilo que estava conversado lá atrás se reconduza. Isto é, zerar o jogo, retomando o compromisso que existia. A forma do encaminhamento [da escolha do vice] é que é importante. A forma de você, de uma maneira parceira, encontrar um nome que conjugue os interesses da oposição, passando pelo PSDB e pelo DEM;, disse.
Antes de Agripino e Maia descerem da reunião, ocorrida num dos hotéis mais caros de São Paulo, eles tiveram o cuidado de ver nos sites o que FHC e o presidente tucano, Sérgio Guerra, haviam dito aos jornalistas na saída. A precaução foi adotada para decidir qual o tom seria utilizado pelo partido nas declarações. O primeiro a deixar o hotel, Fernando Henrique, disse que há uma possibilidade remota de ruptura. ;Certeza, nunca se pode dizer que sim. Mas estou otimista;, ponderou, ao responder se a aliança estava mantida. FHC disse ainda que acha difícil eleger Serra sem a parceria do DEM.
Irreversível
O presidente tucano, Sérgio Guerra, esticou a corta com o aliado e disse que a escolha de Dias para vice de Serra seria irreversível. ;Estamos desde ontem conversando com o DEM. Essa conversa começou ontem à noite, continuou hoje e vai terminar mais tarde;, disse. O encontro de segunda-feira acabou por volta das 4h da manhã e fez o presidente do PSDB chegar atrasado ao evento de ontem. Abatido, ele voltou a dizer a interlocutores que uma ruptura com o DEM comprometeria a vitória de Serra.
Até o fechamento desta edição, as principais lideranças do DEM permaneciam reunidas em Brasília para definir uma estratégia conjunta para a convenção, que não significasse uma derrota interna humilhante para a legenda. Antes de entrar no encontro, Rodrigo Maia disse acreditar que o problema seria equacionado. Ele comparou a crise entre DEM e tucanos a uma briga de casal e afirmou que as arestas serão devidamente aparadas antes da convenção. ;O casamento está em crise, mas todo casamento precisa de maturidade;, comparou. A convenção do DEM, marcada para hoje, em Brasília, servirá para definir se haverá ou não coligação formal com o PSDB para apoiar Serra.
PARA SERRA, AINDA HÁ MUITOS NOMES
; O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, preferiu não citar o nome de Álvaro Dias como o vice definitivo na corrida pelo Planalto. Durante entrevista à jornalista Miriam Leitão para o programa Espaço Aberto, da Globonews, Serra definiu a missão de achar o nome adequado como ;mais difícil do que convocação de seleção;. Na véspera da convenção do DEM e quatro dias após a indicação do nome de Dias para a chapa, Serra preferiu ser evasivo. ;Olha, há muitos nomes. Acho que vai ter uma boa solução. Estou convencido disso, como sempre estive. Tem muita gente boa;, argumentou. ;E não é nenhum processo de barganha, com cargos, nomeações, ministérios, negócios. Vice é uma pessoa atuante. Vai ser alguém muito bom, isso não tem problema.`
PSC ensaia debandada
O embate interno com o DEM não é a única ameaça de baixa dos tucanos para as eleições de outubro. O partido também deve perder o apoio formal do nanico PSC nesta quarta-feira. A legenda havia acertado o apoio a José Serra (PSDB) em abril, mas dá claros indícios de que mudará de lado. Ontem, o vice-presidente da legenda, Pastor Everaldo, esteve reunido com o líder do governo na Câmara dos Deputados, Cândido Vaccarezza (PT-SP), e o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, para discutir a debandada pró-Dilma Rousseff (PT).
O partido alega que foi posto para escanteio no processo de escolha do vice de Serra ; a legenda sonhava emplacar o senador Mão Santa (PSC-PI). Desconsiderado pelos tucanos, o partido decidiu abrir conversas com os petistas. Sobre a mesa, colocou o tempo a que tem direito no horário eleitoral, de cerca de meio minuto. O acordo nacional, contudo, não modifica os apoios a tucanos nos estados. Em São Paulo, a legenda está fechada com Geraldo Alckmin (PSDB). No Distrito Federal, a tendência do PSDB é apoiar Joaquim Roriz (PSC).
Na opinião de Rubens Figueiredo, cientista político da USP e diretor do Centro de Pesquisas e Análises de Comunicação (Cepac), o imbróglio e a debandada do nanico PSC da chapa tucana tem muito mais repercussão no plano político do que no plano eleitoral. O reflexo, segundo o especialista, é partidário. ;É evidente que essa confusão demonstra certa incapacidade do PSDB em agregar aliados e não deixa de ser uma certa prepotência querer uma chapa puro-sangue. Isso tende a desagregar;, aponta.
A mesma avaliação faz o cientista político da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), Malco Camargos. ;Para o eleitor, isso é completamente indiferente neste momento. O eleitor vai começar a processar esse fato quando os nomes forem colocados, definidos, e quando começar o horário eleitoral gratuito.; De acordo com o pesquisador, a indefinição não influencia as pesquisas eleitorais. A queda de Serra no último levantamento Ibope/CNI, segundo Camargos, tem muito mais relação com a transferência de votos do presidente Lula à candidata petista Dilma Rousseff. ;Esses bastidores, nesse momento, só interessam às elites políticas, aos partidos e aos financiadores de campanha;, afirma. (II, DA e UC)
Memória
Arestas antigas
Se a relação do PSDB com o DEM é um casamento, não é de hoje que os dois partidos travam brigas conjugais. Quando o tucano Geraldo Alckmin se lançou candidato à Presidência, em 2006, a escolha de um vice oriundo do então PFL foi abalada porque o então presidente da legenda, senador Jorge Bornhausen (SC), disparou críticas ao governo tucano em São Paulo no ponto mais delicado, a segurança pública. As críticas surgiram num momento nervoso, logo após a onda de ataques da facção criminosa PCC. Na época, a crise foi contornada e o vice escolhido foi o senador José Jorge (PFL-PE).
O desgaste entre PSDB e DEM não ameaça apenas a eleição de Serra. Em pelo menos 8 estados há dificuldades no relacionamento entre as duas legendas. Os líderes do PSDB e do DEM garantem que a maior parte dos problemas será resolvida. No ano passado, as denúncias contra o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda (DEM), que segundo inquérito da Polícia Federal seria o chefe de um esquema de pagamento de mesada a deputados distritais e assessores, também abalou a relação entre democratas e tucanos. (UC)