Jornal Correio Braziliense

Politica

Saúde pública preocupa presidenciáveis

Candidatos precisam de propostas concretas para convencer o eleitorado

Carolina Khodr

A peregrinação interminável por hospitais da rede pública em busca de internação para a sobrinha com câncer solidificou uma certeza na cabeça da eleitora Liliane Gomes da Silva, 49 anos. Em outubro, ela utilizará a urna eletrônica para votar no candidato à Presidência da República que apresentar as melhores propostas para a área de Saúde. ;Na hora em que mais precisamos do sistema público de saúde, esbarramos na péssima qualidade do atendimento, na falta de médicos e em muita burocracia;, dispara a profissional autônoma. Abordada com frequência pelos três principais candidatos ; José Serra (PSDB), Marina Silva (PV) e Dilma Rousseff (PT) ;, a saúde deve ser o ponto central trabalhado no debate presidencial de hoje à noite, na TV Bandeirantes. Mesmo porque, pesquisas indicam que o tema é prioridade para o brasileiro na hora de escolher o futuro presidente da República.

O grau de preocupação dos principais presidenciáveis sobre projetos para a melhoria da saúde pública pode ser medido por uma pesquisa do Ibope, encomendada pelo Movimento Todos pela Educação, no início da corrida eleitoral. Nada menos que 63% dos eleitores escolherão o candidato, prioritariamente, pelas promessas relacionadas à área. Sentindo o pulso das ruas, Dilma, Serra e Marina destilaram, desde a pré-campanha, várias ideias para incrementar o serviço oferecido ao cidadão. Aprovar a Emenda Constitucional n; 29, que estabelece percentuais mínimos de repasse do governo federal, estados e municípios para a saúde, e fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS) são teclas batidas à exaustão. A repetição, contudo, ainda não solucionou o nó principal das promessa: nenhum dos candidatos explicou na prática como tiraria esses planos da prancheta.

Atendimento à família
Para especialistas em gestão pública na área de saúde, o principal gargalo no atendimento à população diz respeito à falta de incentivo aos chamados programas de atendimento familiar. ;O país avançou muito implantando os agentes comunitários e as equipes de saúde da família, mas os projetos estão no limbo há 16 anos. Toda família brasileira deveria ter a visita de um agente de saúde. Precisamos universalizar o serviço para evitar a superlotação nos hospitais;, opina a diretora do Núcleo de Estudos em Saúde Pública da Universidade de Brasília (UnB), Maria Fátima Souza. De acordo com a pesquisadora, o reforço na prevenção diminuiria a necessidade de investimentos concentrados na melhoria da rede hospitalar.

Outros desafios para o próximo presidente da República na área da saúde incluem a aprovação de uma carreira nacional para profissionais da área, nos três níveis de governo ; federal, estadual e municipal. A criação de um serviço obrigatório civil para médicos formados por instituições públicas, bem aceita pelos três candidatos, também é tida como solução para o atendimento, especialmente no interior do país. Pela proposta, os recém-formados teriam de restituir o investimento feito pelo Estado na formação profissional, atendendo pacientes durante um ano em regiões com escassez de médicos. A maioria desses temas serão postos no debate presidencial de hoje à noite e, provavelmente, seguirão em voga até a véspera do pleito. Tudo para não confrontar os 41% dos eleitores que, na pesquisa Ibope/Todos pela Educação, cravaram: a saúde é o ponto mais crítico do país.

Texto ainda na gaveta

O próximo presidente da República dificilmente escapará da regulamentação da Emenda Constitucional n; 29. A proposta dorme na Câmara desde 10 de junho de 2008, mas a pressão para que ela seja aprovada já ultrapassou o ponto ideal no Congresso.

Cálculos de profissionais da área indicam que somente o governo federal deixou de investir R$ 57,7 bilhões em saúde nos últimos três anos, por conta do atraso na aprovação do dispositivo. Levantamento feito pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) aponta que 12 unidades da Federação repassam para a saúde um percentual menor da arrecadação do que determina a emenda (veja quadro). Os pisos são de 10% para o governo federal, 12% para o estadual, e 15% para os municípios. (II e CK)


Palavra do especialista
O gigante agoniza

Apesar dos enormes avanços, o SUS tem sido vítima de uma ação deliberada, que o coloca no seu mais difícil momento. Entre os problemas, destaque para o subfinanciamento crônico; a opção pelas ações especializadas e de alto custo, com o consequente desleixo no que toca a prevenção da doença e a promoção da saúde; a substituição da rede pública estatal, previamente desestruturada pelos serviços privados, contratados a um custo impossível de ser financiado; o sistemático desrespeito aos conselhos de saúde; a precarização da força de trabalho e uma predadora ação patrimonialista na gestão exercida por meio das organizações sociais e das fundações. Essa realidade tornou o SUS um gigante agonizante. Como consequência, estamos totalmente reféns do setor privado e das corporações organizadas.

Para a superação desses gargalos estruturantes, entendemos ser urgente a regulamentação da Emenda Constitucional n; 29 e o fortalecimento da rede pública própria, além de se priorizar a estruturação da atenção básica em todos os municípios, profissionalizar a gestão do sistema, regulamentar a autonomia administrativa e orçamentária dos serviços, criar a Carreira Única do SUS para todos os trabalhadores e implementar o Serviço Civil em Saúde pelo prazo de um ano.

Francisco Batista Júnior, presidente do Conselho Nacional de Saúde


Propostas

Os três principais presidenciáveis prometem regulamentar a EC n; 29 e fortalecer o SUS. Conheça outras promessas:

Dilma Rousseff (PT)
# Serviço médico obrigatório para alunos de medicina formados por instituições públicas
# Criação de um complexo industrial de saúde
# Desoneração de remédios de uso geral

José Serra (PSDB)
# Formação de 300 mil técnicos de enfermagem
# Criação em todo o país de 154 Ambulatórios Médicos de Especialidades (AMEs)
# Instituição de uma rede de hospitais direcionada às doenças do aparelho locomotor

Marina Silva (PV)
# Fortalecimento do Programa da Saúde na Família
# Formação prioritária de médicos generalistas, enfermeiros, assistentes sociais e agentes comunitários
# Expansão das farmácias populares