postado em 10/10/2010 14:06
Brasília ; As pessoas perseguidas e os parentes de vítimas da ditadura militar (1964-1985) esperam que o futuro presidente da República abra os arquivos das Forças Armadas e revelem os documentos com as informações sobre o paradeiro dos corpos de cerca de 400 desaparecidos políticos. Além disso, pleiteiam acesso às informações sobre as operações militares de combate à luta armada para saber como se deu a captura e a morte dos parentes.
;A expectativa é de que quem for eleito democraticamente resolva essa história. As coisas não podem ficar ocultas;, disse Diva Santana, da comissão interministerial que acompanha as operações de resgate de restos mortais de pessoas envolvidas na Guerrilha do Araguaia.
A mesma esperança os parentes de vítimas e perseguidos da ditadura tiveram nas eleições de Fernando Henrique Cardoso (1994) e de Luiz Inácio Lula da Silva (2002). Diva Santana é irmã de Dinaelza Santana Cerqueira e afirma que passados mais de 35 anos dos combates no Araguaia ainda não tem informações sobre a irmã. ;Nós sabemos dela durante a infância e a adolescência. Sobre a vida adulta de minha irmã quem sabe são os militares;, disse.
As Forças Armadas, no entanto, alegam não ser possível resgatar a memória dos combates e das prisões porque os arquivos foram destruídos. Para Narciso Pires, do Grupo Tortura Nunca Mais (do Paraná), o ;argumento é falso;. Em sua avaliação os militares não eliminariam os arquivos: ;informação é poder. Não se joga fora;. Para ele, a não abertura dos arquivos estimula a tortura até hoje por causa da impunidade. Ele avalia que o país vive atualmente a ;plenitude da vida democrática, no entanto sem consolidá-la;, porque não esgotou a apuração do que ocorreu na ditadura.
Quem vier a ocupar o Palácio do Planalto deverá acompanhar a tramitação do projeto de lei (PL 7376/10) que cria a Comissão da Memória e da Verdade e poderá herdar a condenação do Estado brasileiro na Corte Interamericana de Direitos Humanos, ligada à Organização dos Estados Americanos (OEA), por causa das perseguições, mortes e desaparecimentos forçados de cerca de 70 pessoas durante a Guerrilha do Araguaia (1972 - 1975).
O julgamento na OEA deverá ser concluído em novembro. As audiências ocorreram em maio passado, em San José, na Costa Rica, quando o governo brasileiro defendeu a tese de que não há necessidade de julgamento na corte interamericana, uma vez que o país concede reparações a anistiados e atua em favor do direito da memória e da verdade.
A delegação brasileira também ponderou que a corte interamericana não teria como reformular decisões tomadas em processo judicial, como ocorreu em abril no julgamento sobre a abrangência da Lei da Anistia no Supremo Tribunal Federal (STF). Naquele julgamento, para a frustração de parentes de vítimas e perseguidos da ditadura, a corte desconsiderou a possibilidade de processar quem tenha cometido crimes como de tortura durante o regime.
;O Estado democrático de hoje não pode ser conivente com aquele regime que usurpou direitos;, criticou Iara Xavier Pereira, que teve a mãe presa, o pai exilado e ainda perdeu o marido e dois irmãos (ligados à Aliança Libertadora Nacional), mortos durante o regime.
Para Ivan Seixas, do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (SP), a mudança de atuação do Estado, a abertura de arquivos e a tramitação de projetos de lei no Congresso Nacional ;dependem da vontade popular. ;Não basta a vontade do presidente;. Vitória Grabois, presidente da seção fluminense do do Grupo Tortura Nunca Mais , lembra que é a pressão da opinião pública, inclusive estrangeira, que faz as coisas andarem.
Segundo ela, foi a pressão internacional que levou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso a sancionar a Lei 9.140/1995, que reconheceu como mortas pessoas desaparecidas em razão de participação, ou acusação de participação, em atividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979.
A Agência Brasil entrou em contato por telefone na última terça-feira (7/10) e por e-mail com a assessoria de comunicação do Ministério da Defesa para saber a posição do ministério e das Forças Armadas sobre a abertura de arquivos militares a época da repressão sobre movimentos de luta armada durante o regime militar (1964-1985), mas não teve retorno.