Luciana Bezerra
postado em 16/11/2010 08:15
Ao levantar a possibilidade de entregar a mulheres pelo menos 30% dos cargos na Esplanada, a presidente eleita, Dilma Rousseff, mal imaginava que abria uma brecha para reivindicação de representantes de movimentos de igualdade e em defesa de minorias. A Dilma, agora cabe materializar na equipe a diversidade sexual e racial que defendeu ao longo da campanha. Para os afrodescendentes, é importante que membros da comunidade estejam em postos importantes. Diferentemente do que pensam representantes de índios e de gays, lésbicas e transgêneros. Se a petista conseguir criar políticas públicas sérias para esses segmentos, já está de bom tamanho.Integrantes do movimento em defesa da mulher negra resolveram declarar que querem uma fatia do poder público a partir de 2011. ;Nós somos maioria, queremos representatividade não só no Ministério do Esporte e em secretarias especiais. Queremos ministras negras. Até porque a questão da mulher negra é muito mais grave do que a do homem negro. A sociedade nos colocou num lugar que não é nosso;, diz uma das coordenadoras do Fórum Nacional de Mulheres Negras (FNMN), da Bahia, Gicélia Cruz.
Ela engrossa o coro liderado pelo presidente da ONG Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro), frei David Santos. Na segunda-feira da semana passada, ele encaminhou carta à presidente eleita em que defende uma cota de 30% de negros na equipe ministerial. O frei ainda não recebeu resposta e acha que isso talvez não aconteça tão cedo. ;Entramos numa briga de foice. Todo mundo quer cargo;, afirmou ele. No Congresso Nacional, o pedido é considerado legítimo.
Para a senadora Fátima Cleide (PT-RO), sem reclamação não tem crescimento. ;Acho que Dilma vai considerar cada um dos pedidos para composição do governo;, afirma. ;É fundamental que esses movimentos sejam ouvidos;, acrescenta o senador Gilvam Borges (PMDB-AP).
Entre os indígenas, mais do que representantes no alto escalão, o que preocupa é o silêncio de Dilma em relação a eles durante e após as eleições. ;Não houve bom senso nem sensibilidade para lembrar o índio;, reclama o representante da Coordenação dos Povos Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Marcos Apurinã. No segundo turno, ele entregou aos candidatos à Presidência uma carta com as demandas da raça. Entre eles, a aprovação do novo estatuto dos Povos Indígenas e do Projeto de Lei do Conselho Nacional e Política Indigenista. ;Defendemos ainda a implementação de uma política educacional nas aldeias e uma saúde de qualidade.;
Uma outra fonte de dor de cabeça do dirigente diz respeito às grandes obras de infraestrutura tocadas pelo atual governo e que devem ser concluídas com Dilma. Segundo ele, nenhuma entidade ligada aos índios foi consultada sobre a construção das hidrelétricas de Jirau, no Rio Madeira (RO), que já está em andamento, e de Belo Monte, no Rio Xingu (PA). ;O governo fez vista grossa e nos empurrou goela abaixo essas obras. O Brasil quer ser de Primeiro Mundo sem levar em conta a voz das minorias;, diz. Apurinã defende a permanência dos titulares da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), Antônio Alves, e da Fundação Nacional do Índio (Funai), Márcio Meira. ;O importante é que se dê continuidade aos trabalhos;, afirmou ele.
Ameaça de barulho
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, Toni Reis, não há qualquer interesse por cargos ou status. Mas isso não quer dizer que o movimento seja indiferente às indicações para o próximo governo. Caso um dos ministros, por exemplo, tenha um histórico de comportamento homofóbico, a categoria vai fazer barulho. ;A presidente vai se incomodar com a gente. Não vamos aceitar quem não nos respeita;, afirma ele. A única reivindicação do segmento é a execução do Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos para a população LGBT. ;Queremos gente competente para discutir políticas para essa faixa de brasileiro;, declara Toni.
Enquanto os demais movimentos tentam encontrar um lugar no governo Dilma, feministas festejam a intenção voluntária da presidente de aumentar a presença das mulheres na Esplanada. Para a coordenadora nacional da União Brasileira de Mulheres, Elza Campos, a decisão da presidente eleita é carregada de simbolismos. ;Embora ela não seja feminista, ela tem sensibilidade e compreensão sobre o papel da mulher.;
Única mulher eleita da bancada da Bahia para o mandato de 2011 a 2014 na Câmara dos Deputados, Alice Portugal (PCdoB), também celebrou a iniciativa. ;É uma decisão muito avançada. É uma forma de afirmar o gênero, já que isso ainda não aconteceu no Legislativo;, declarou. Nas eleições deste ano, foram eleitas 45 deputadas federais e oito senadoras. Juntas, elas ocupam menos de 10% das cadeiras do Congresso. ;É uma situação vexaminosa;, afirmou Alice.