Politica

Oposição: decisões anunciadas por Dilma são as mesmas atribuídas a Serra

postado em 11/02/2011 08:23
As decisões anunciadas pela equipe de Dilma Rousseff mais parecem uma lista de consolidação das ameaças divulgadas durante a campanha eleitoral como primeiras medidas de um possível governo de José Serra (PSDB). Ao longo dos meses que antecederam a disputa, petistas e simpatizantes da candidatura que representou o continuísmo anunciavam que a gestão tucana estaria disposta a mudar o rumo do governo Lula, cortando a proposta de Orçamento apresentada no fim do ano passado e encolhendo a máquina de investimentos e contratações. Pouco mais de quatro meses separam o calor dessas discussões dos anúncios desta semana. Uma realidade que tem sido seguida de notícias que seriam uma crônica anunciada se não fosse o fato de o script ser protagonizado pelo governo do PT: integrado justamente por quem acusava a oposição de planejar tais medidas.

Durante a campanha, o candidato José Serra teve de modificar um dos programas eleitorais gratuitos para negar as notícias que circulavam na internet anunciando que ele estava disposto a suspender a convocação de concursados aprovados e de frear a realização de novas seleções públicas. ;Tivemos de mudar tudo para que o Serra aparecesse na televisão dizendo que foi o governador que mais contratou concursados. Foi uma resposta a uma rede de boatos que surgiam a todo tempo. Acreditamos que essa ameaça feita por nosso opositores interferiram no desempenho ruim do nosso candidato principalmente em Brasília;, avalia Juthay Júnior (PSDB-BA), um dos coordenadores da campanha tucana à Presidência.

Mas essa não é a única demonstração de afinidade entre o que os governistas diziam que José Serra faria e o que Dilma Rousseff tem decidido nesses primeiros meses de governo. Além do arrocho de gastos que vai resultar na suspensão de concursos e no corte das emendas parlamentares, a prática petista se distancia do discurso eleitoral quando o assunto é a privatização de aeroportos, alternativas ao Bolsa Família e até reajustes do salário mínimo.

Críticas
Pelo menos em três dos programas eleitorais gratuitos do PT, o tempo disponível foi usado para criticar privatizações e acusar os governos do PSDB de recorrerem à prática frequentemente. Na internet, o tema sempre constava dos manifestos contrários ao candidato tucano. Agora, no mundo real, o governo de Dilma Rousseff começa a perceber que, sem privatizar, será impossível concluir as obras de estruturação dos aeroportos a tempo da realização das Olimpíadas no Brasil.

Outra fonte de votos dados à Dilma Rousseff ; que agora tem tratamento diferente do que o anunciado durante a campanha eleitoral ; é o programa Bolsa Família. No decorrer da disputa presidencial, o PT falava apenas em ampliação dos beneficiários, e a oposição tinha de desmentir diariamente o desejo de reduzir o programa ou acabar com ele. Agora, a nova ministra do Desenvolvimento Social, Tereza Campello, adota o discurso da campanha fracassada do PSDB e diz que o principal desafio do governo é o de encontrar uma ;porta de saída; para os dependentes do auxílio entrarem no mercado de trabalho. Campello aceitou comandar a pasta porque a presidente concordou com a implantação de uma política destinada a reduzir o número de brasileiros que dependem do programa.

O polêmico reajuste do salário mínimo é outra mudança de discurso que não fazia parte do enredo anunciado na campanha de Dilma Rousseff. Com a sucessão de aumento real dado pelo governo Lula, a então candidata pouco detalhava valores durante os pronunciamentos que antecediam a eleição. Dizia apenas que daria continuidade a política adotada pela equipe do então presidente. Agora, propõe reajuste abaixo do esperado. ;Se os brasileiros analisarem bem, vão ver a lista enorme de coisas que diziam que o governo de Serra iria fazer para prejudicar nossa candidatura e o que estão fazendo agora. Eles pensavam em fazer e jogavam o boato de que éramos nós os idealizadores dessas propostas. Uma tática eleitoral que deu certo, mas não foi honesta;, critica Juthay Júnior.

Mudança de planos

Nos primeiros meses no comando do país, Dilma Rousseff anunciou medidas que foram tratadas na campanha eleitoral como ameaças em um provável governo tucano. Veja alguns exemplos:

P Suspensão de novos concursos públicos
P Cancelamento das convocações de candidatos aprovados em concursos
P Privatização de aeroportos
P Arrocho do salário mínimo e reajustes sem aumento real
P Freio nos investimentos e redução de gastos
P Corte no orçamento proposto pela equipe do governo Lula

Falta convencer o mercado

Gabriel Caprioli

Os analistas do mercado financeiro receberam com ressalvas o anúncio de corte de R$ 50 bilhões no Orçamento deste ano. Ao prometer o ajuste, os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento) esperavam alterar as expectativas dos economistas, que esperavam o tamanho da tesourada para fazer as contas e projetar, por exemplo, a trajetória da inflação e dos juros para 2011. Apesar de estar em linha com o que era esperado, o bloqueio não foi suficiente para convencer que o governo está disposto a apertar o cinto.

;Para começar, o corte foi feito em cima de uma proposta de orçamento bastante inflada. Além disso, os cortes só terão efeito ao longo do tempo porque estão focados, segundo os ministros, em medidas administrativas;, avaliou Carlos Thadeu de Freitas Gomes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e ex-diretor do Banco Central. Para ele, o esforço prometido pelo governo se traduzirá mais em uma racionalização de gastos do que em corte efetivo.

As declarações do ministro Mantega de que algumas ;exceções; podem modificar a programação orçamentária e resultar na liberação de parte do bloqueio aumentou as dúvidas. ;Ele não foi incisivo. Anunciou um corte, mas deixou a porta aberta para emergências e não deixou claro de onde vai cortar. A forma como o bloqueio foi divulgado, pouco claramente, decepcionou;, afirmou a economista-chefe da corretora Icap Brasil, Inês Filipa. Em sua avaliação, o corte de R$ 50 bilhões só será realizado efetivamente se atingir investimentos ou a área social. ;Mas o mercado ficou confuso. Alguns analistas acharam positivo. Aqui, não mudamos nossa percepção;, comentou.

As cotações dos juros futuros ; indicador que mostra diariamente a estimativa de avanço da taxa básica Selic nos próximos meses ; fecharam o dia com pequenas oscilações e sem tendência definida, sinal de que o anúncio do contingenciamento alterou pouco a percepção do investidor. O dado é negativo, uma vez que se esperava que o corte levasse os aplicadores a estimar juros futuros menores.

O diretor de Política Econômica do Banco Central, Carlos Hamilton Araújo, afirmou acreditar que o ajuste fiscal vai ajudar a conter a atividade econômica e, portanto, contribuir para que o cenário inflacionário seja mais favorável. Menor pressão do governo nos preços, na prática, contribui para reduzir a inflação. Para os economistas, o cumprimento efetivo do bloqueio de R$ 50 bilhões teria impacto equivalente ao aumento da taxa básica Selic em 1 ponto percentual.

Aumento preventivo
Quando os analistas estão pessimistas em relação ao futuro da inflação e elevam suas projeções, ocorre um fenômeno conhecido como profecia autorrealizável, que é o aumento preventivo de preços por parte dos produtores e comerciantes. Aquilo que era uma previsão vira inflação porque ninguém quer perder o poder do dinheiro. Controlar essas expectativas é um dos esforços do governo.

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