postado em 24/03/2011 07:00
Há menos de um mês no cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux foi decisivo no julgamento de ontem, no qual a Corte definiu que a Lei da Ficha Limpa não poderá ser aplicada nas eleições de 2010. Depois de dois empates no ano passado, em virtude da ausência de Eros Grau, que se aposentou em agosto, o plenário determinou que a lei de iniciativa popular só poderá ser aplicada a partir de junho deste ano, um ano depois de sancionada. Os 10 ministros que já haviam se posicionado nas análises anteriores mantiveram os votos, o que selou que aqueles políticos barrados pela lei no ano passado, mas que conquistaram votos suficientes para serem eleitos, poderão tomar posse. O entendimento tem repercussão geral, o que indica que será aplicado a todos os recursos que tenham como objeto a Lei da Ficha Limpa. Assim, todas as decisões da Justiça Eleitoral que indeferiram candidaturas com base na norma serão anuladas. Sancionada em junho de 2010, a lei prevê a inelegibilidade daqueles condenados por órgão colegiado ou que tenham renunciado para escapar de cassação.
Em seu voto de 50 minutos, Fux posicionou-se pela aplicação do artigo 16 da Constituição Federal, que diz que uma lei só pode entrar em vigor um ano depois de sua publicação. No caso da Ficha Limpa, a legislação foi sancionada apenas quatro meses antes das eleições.
Luiz Fux elogiou a lei, classificando-a como ;um dos mais belos espetáculos democráticos;, mas ressalvou que em primeiro lugar é preciso verificar a questão técnica. ;A iniciativa popular é mais que salutar, mas sempre em consonância com garantias constitucionais (...) A nós não resta a menor dúvida de que novas inelegibilidades inauguram regra nova ao processo eleitoral;, afirmou. ;No ano em que a lei entra em vigor, não pode ela alterar qualquer fase do processo eleitoral;, completou.
Em plenário, o processo analisado era um recurso do candidato a deputado estadual Leonídio Bouças (PMDB-MG), condenado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais por improbidade administrativa. Ele conquistou quase 42 mil votos em outubro passado, quantidade suficiente para ser suplente, mas acabou barrado com base na lei. Com a decisão de ontem do STF, Bouças será suplente na Assembleia Legislativa mineira.
Em entrevista após o julgamento, Fux afirmou que a Lei da Ficha Limpa poderá ser aplicada normalmente nas eleições de 2012. Questionado sobre a retroatividade da lei, que atinge fatos anteriores a sua publicação, Fux observou que o assunto não foi alvo do julgamento de ontem e admitiu que outros aspectos da norma poderão ser questionados no futuro.
Igualdade
Antes de os ministros se manifestarem, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, reiterou a posição do Ministério Público favorável à validade imediata da Ficha Limpa. Segundo Gurgel, o fato de a lei ter sido editada em ano eleitoral não rompeu a igualdade na disputa. Já o advogado de defesa, Rodrigo Ribeiro, acusou o TSE de ter rompido a segurança jurídica, ao deixar de aplicar o artigo 16 da Constituição e barrar a candidatura de Leonídio Bouças. Ele também citou que ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença, ao observar que a condenação imposta a Bouças está em fase de análise de recursos. Primeiro a votar, o relator do processo, Gilmar Mendes, foi enfático: disse que a lei interferiu no processo eleitoral, assim desrespeitando a Constituição.
Como se posicionaram
Contrários
Gilmar Mendes
Afirmou que a Ficha Limpa ;talvez tenha conotação que tenha escapado a muitos ditadores em termos de aplicação retroativa;.
Dias Toffoli
Destacou que o artigo 16 da Constituição veta a possibilidade de uma lei que altere as eleições vigorar no ano de sua publicação.
Celso de Mello
Citou como ;gravíssima; a imposição da lei ao vetar a candidatura de políticos sem condenação com trânsito em julgado.
Marco Aurélio
Pautou-se pelo artigo 16 da Constituição. Para ele, os ministros ;não têm culpa; de o Congresso ter editado a lei no ano das eleições.
Cezar Peluso
O presidente do Supremo reforçou que os avanços sociais precisam obedecer a preceitos constitucionais.
Favoráveis
Cármen Lúcia
Enfatizou que os candidatos já conheciam as ;regras; durante as convenções partidárias, em junho, depois de a lei ser sancionada.
Ricardo Lewandowski
Para ele, ilícitos cometidos pelos condenados são suficientes para determinar a inelegibilidade.
Ayres Britto
Citou a moralidade como o princípio que norteia a investidura em cargo eletivo. Para ele, alguém que não era ;limpo eticamente; não poderia ser candidato.
Joaquim Barbosa
Criticou os colegas contrários.
Segundo ele, a discussão girava em torno de um confronto entre disposições legais. ;A minha parte eu fiz.;
Ellen Gracie
Considera que o artigo 16, que cita a anualidade, não poderia ser aplicado. Para ela, a inelegibilidade não é ato eleitoral.