postado em 29/03/2011 07:00
Políticos denunciados e acusados de cometer irregularidades na administração de recursos públicos comandam alguns dos cargos mais importantes do Congresso. Indicados por partidos para postos com poder de administrar orçamentos bilionários, influenciar votações e barganhar com o Executivo, parlamentares citados em órgãos da Justiça são responsáveis por 32% das vagas mais estratégicas do Legislativo. No Senado, a influência de quem tem pendências judiciais fez com que 44% dos cargos-chaves da Casa fossem ocupados por políticos processados. Na Mesa Diretora, das sete vagas, quatro estão com réus em ações. Uma delas, a que tem a função de gerir orçamento de mais de R$ 3 bilhões, foi dada ao senador Cícero Lucena (PSDB-PB) sem questionamentos quanto à ação que tramita atualmente no Supremo Tribunal Federal (STF) na qual ele é acusado de aplicar recursos públicos de forma irregular. Segundo a acusação do Ministério Público, o senador estaria envolvido na má aplicação de R$ 7,8 milhões entre 1990 e 1994. Na lista de possíveis irregularidades estão falhas como o pagamento por serviços não realizados, indícios de sobrepreço e não realização de licitação para estabelecer contratos. Todas referentes a funções que ele terá no cargo ocupado no Senado.
Para a Mesa Diretora, os senadores também optaram por João Ribeiro (PR-TO), contra quem pesam acusações de peculato e formação de quadrilha. Com a carta branca dos colegas, ele vai administrar a emissão de passaportes e será o responsável pelas reuniões secretas da Casa.
Na lista da Justiça e perto do poder no Senado ainda estão a vice-presidente da Casa, Martha Suplicy (PT-SP), o terceiro-secretário João Vicente Claudino (PTB-PI) e lideranças que resistem a escândalos e cujo poder permanece ano após ano. É o caso, por exemplo, de Romero Jucá (PMDB-RR), que, apesar de ter sido acusado de desviar verbas públicas, permanece acumulando influência graças à função de líder do governo. Além de Jucá, líderes como Renan Calheiros (PMDB-AL) e Gim Argello (PTB-DF) se mantêm no comando político apesar de pendências judiciais. Renan ainda levou na carona o recém-chegado Eunício Oliveira (PMDB-CE), que ganhou de presente a chefia da Comissão de Constituição e Justiça e o poder de interferir na pauta de votações da Casa. Ele é acusado de comprar votos para se eleger.
Na disputada Comissão de Infraestrutura, responsável por fiscalizar e decidir pautas importantes referentes às milionárias obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), está Lúcia Vânia (PSDB-GO). A senadora é ré em um processo no STF que a acusa de peculato.
Para lotear as cadeiras mais poderosas da Câmara, também foram designados parlamentares denunciados e cujos inquéritos tramitam na Justiça. Eduardo Gomes (PSDB-GO) foi eleito primeiro-secretário e passou a ser responsável por um orçamento superior a R$ 4 bilhões, além de receber um exército de servidores terceirizados. O tucano tem contra ele um inquérito que apura irregularidades em licitações na época em que comandava a Câmara Municipal de Palmas. De acordo com o Ministério Público, houve compras irregulares de itens, como baterias de celulares, sem licitação.
Na divisão de cargos, no entanto, nada causou tanta perplexidade quanto a indicação de João Paulo Cunha (PT-SP) para o comando da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Réu no processo do mensalão, ele tomará conta dos pareceres jurídicos dos projetos que tramitam na Câmara. Seu caso não é o único. À frente da Comissão de Viação e Transportes está Edson Ezequiel (PMDB-RJ), acusado de improbidade, peculato e corrupção passiva. Ele chegou a ter suspensos seus direitos políticos, mas ainda recorre. Mesmo assim, seu partido deu a ele uma vaga no comando do colegiado responsável pela fiscalização e decisões referentes às obras de estradas e rodovias. Outro exemplo na Casa é a indicação de Claudio Puty (PT-PA) para a Comissão de Finanças e Tributação. O deputado é acusado de comprar votos e de manter conduta vedada a agente públicos.
;Essas indicações mostram que pouco importa o passado desses parlamentares na divisão dos cargos. Não é de se estranhar que gente processada esteja cada vez mais poderosa, já que estamos em um país adepto da impunidade parlamentar;, afirma o cientista político David Fleischer.
Outro lado
Eduardo Gomes reage ao inquérito que o acusa de fraude em licitação afirmando que vai representar contra o autor da denúncia. Segundo ele, a acusação não faz sentido porque o valor do ato praticado anos atrás nem chega a R$ 1.500 e a licitação era dispensável pelo princípio da insignificância. ;Essa denúncia não tem sentido. O preço era irrisório e poderíamos ter corrigido facilmente se desconfiássemos de irregularidades. Minhas contas foram aprovadas durante minha gestão à frente da Câmara. Essa posição do MP é que foi um erro, mas não quis acordo para poder processar o procurador depois de ser inocentado;, diz ele.
Em sua defesa, Cícero Lucena argumentou que não poderia ser responsabilizado pela execução dos convênios firmados pela administração municipal porque não atuava como ordenador de despesas. Em seu site, João Ribeiro comenta as acusações e os inquéritos contra ele, afirmando que todos devem ser arquivados por falta de provas e por prescrição dos supostos crimes. A reportagem não obteve resposta dos demais citados.