Politica

Prefeitos reclamam que envelheceram, a saúde piorou e o dinheiro diminuiu

postado em 08/05/2011 21:00
;Reeleição? Estou correndo disso;, deixa escapar o prefeito de Jacuí, no Sul de Minas, João Arantes (PSDB). Ele parece ser mais uma vítima de certa ;epidemia; que se arrasta pelo estado, segundo outro chefe de Executivo: ;Olha o meu cabelo. Não tinha fios brancos antes de ser prefeito, não. A prefeita de uma cidade vizinha está tomando remédio de tarja preta, coisa que nunca havia feito. O prefeito de outro município teve um piripaque. O outro prefeito reclama de enxaqueca todos os dias... Ninguém está dando conta;, comenta Giovane Neiva (PR), que comanda Catas Altas da Noruega, na Região Central. A menos de dois anos das eleições, prefeitos dizem que não desejam outro mandato. Para eles, ;está difícil trabalhar; com orçamentos escassos, implicâncias da oposição, cobrança da população e fiscalização das câmaras municipais e do Ministério Público.

Não tem deputado, senador, governador ou presidente da República que sirva: quando um morador de Jacuí, ou de qualquer outro pequeno município, vê um buraco em sua rua, precisa de leito para mãe doente, pretende colocar o filho numa escola pública ou deseja esgoto tratado em casa, exige que alguém solucione o problema mais do que depressa. ;E quem está na linha de frente? O prefeito. Não importa se a responsabilidade não é sua. Você tem de resolver. E isso é muito desgastante;, afirma João Arantes, acrescentando que não pensa em reeleição. Ele diz que a crise econômica de 2009 complicou ainda mais o seu mandato. ;Não dá para cortar gastos com educação e saúde. Também não posso reduzir a folha de pagamento. O jeito é não fazer investimentos.;

No meio do mandato, o prefeito de Jacuí tem mais uma dor de cabeça pela frente. Segundo ele, com a expectativa de receber verba de emenda parlamentar ao Orçamento da União do ex-deputado federal Carlos Melles (DEM), fez uma obra na cidade. ;O dinheiro não saiu, a empreiteira está me cobrando e agora não sei de onde tirar recurso para pagar;, afirma. Para completar, há ainda outro motivo citado por José Arantes para nem pensar em segundo tempo de mandato. ;A cobrança é enorme de todos os lados. Ministério Público e Câmara Municipal não saem do meu pé;, afirma, corrigindo-se imediatamente para: ;Não tenho problema com os dois órgãos, mas estão sempre cobrando informações;.

Sonho
A pequena Catas Altas da Noruega não tem nem 4 mil habitantes, mas isso está longe de significar que o prefeito de lá tem vida mansa. ;Não dá nem para assistir à missa. É só você se sentar para rezar que a pessoa ao seu lado faz alguma crítica à administração ou pede algo. Quando há algum problema, o morador toca campainha na sua casa para que você resolva;, comenta Giovane Neiva. Nas palavras dele, chegar à prefeitura sempre foi um sonho. ;A realidade é mais complicada. Uma cidade pequena depende apenas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) para sobreviver. Esse orçamento é muito limitado para resolver as nossas carências;, diz.

As preocupações com a administração são, para ele, a culpa dos fios de cabelo brancos aos 40 anos. ;Minha maior frustração foi descobrir a linha tênue entre o ser político e o administrador;, afirma. Segundo Giovane, ao entrar na prefeitura, ele desejava ;apenas fazer uma boa administração;. ;Mas esbarrei na contradição de ser político também e precisar do voto do eleitor, que tem seus interesses;, diz. Para o prefeito, o coronelismo está deixando a cidade, mas ainda deixa suas marcas no voto dos eleitores.

Com tantos problemas e a falta de vontade de continuar no cargo por mais quatro anos, será que valeu a pena sonhar com a prefeitura? ;Sim. Ter a certeza de que nenhum ;caudilho; vai conseguir destruir a política que a gente implantou é a nossa grande vitória;, diz. Ele se orgulha de ter criado o programa 100% Saúde, escolinhas de futebol, projetos de divulgação da cidade para turista, entre outros.

Segundo mandato é mais difícil
O próprio ex-presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM) José Milton de Carvalho (PSDB) costuma dar um conselho para quem deseja seguir carreira política. ;Não comece como prefeito;, alerta. Ele comanda a Prefeitura de Conselheiro Lafaiete, na Região Central, e atribui uma parada cardíaca há dois meses às preocupações com a administração. ;Depois de um problema de saúde tão sério, a gente começa a avaliar se vale a pena mesmo tentar um novo mandato;, afirma. Segundo ele, em conversas com outros chefes de Executivo, vem sentindo que o interesse pela reeleição está cada vez menor.

Na avaliação de José Milton, um possível segundo mandato é ainda mais difícil. ;Se você fez um bom mandato, a população vai cobrar um ainda melhor na segunda vez. Se foi regular e o povo deu uma segunda chance, vão cobrar uma revolução;, comenta. Para ele, nenhum prefeito tem noção do que é a administração pública antes de assumir o cargo. ;Se tivesse, não entraria. A gente inicia o primeiro mandato acreditando que vai resolver todos os problemas da cidade. Afinal, o outro prefeito não resolvia porque era incompetente. Quando chega ao cargo, percebe que não é bem assim; há limites.;

Foi o que descobriu o prefeito de Cachoeira de Minas, no Sul de Minas, Carlos Augusto (PV), o Guto. ;Já fui vereador, mas é completamente diferente. Uma coisa é você ver o problema e denunciá-lo. Outra coisa é ver e ter de resolver;, afirma. Ele diz que tem apenas 10% do orçamento da cidade para investimentos. ;O resto está comprometido com pagamento de pessoal, saúde, educação e outras necessidades. Além disso, você é responsável por uma cidade e pode responder por isso na Justiça;, diz.

Guto também não deve ser candidato novamente. Quer ter mais tempo para a família e pretende retomar a carreira de oficial de Justiça. ;Ser prefeito é um choque entre o interesse privado e público. Você descobre que está remando contra a maré: as pessoas não querem nem saber do coletivo. Estão muito mais interessadas em resolver seus problemas.;

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