Alice Maciel
postado em 21/07/2011 09:15
Algemados, de chinelos e com o uniforme do sistema prisional mineiro. Os vereadores de Fronteira, no Triângulo, acusados de desvio de verba, trocaram o terno e a gravata e se apresentaram nessa quarta-feira de uniforme para audiência no Fórum de Frutal. Presos na segunda-feira, os nove parlamentares passaram a noite sem as regalias de costume. Dormiram todos em uma cela em colchões, comeram da quentinha do dia, com feijão, arroz, carne e salada, preparada na penitenciária.
No primeiro dia como prisioneiros, prestaram depoimentos para tentar dar uma explicação para os gastos absurdos com a verba indenizatória, no valor de R$ 570 mil. Conforme o Estado de Minas mostrou com exclusividade em 22 de janeiro, o dinheiro desviado daria para comprar 169 mil litros de combustível, o suficiente para dar 54 voltas ao redor da Terra.
Os vereadores são suspeitos ainda de terem usado os R$ 3 mil mensais da verba indenizatória para bancar despesas pessoais em rodízios de carne, rodadas de chope, garrafas de vodca e também para custear a manutenção de veículos pertencentes aos próprios parlamentares em oficinas mecânicas e revendas de peças automotivas.
As notas forjadas custeadas pela verba extra resultou no afastamento dos parlamentares da Câmara Municipal em 8 de fevereiro, além do sequestro dos bens visíveis e o ressarcimento aos cofres públicos dos R$ 570 mil desviados. Eles estão sendo processados por formação de quadrilha, peculato (desvio de dinheiro público) e atos de improbidade administrativa. São acusados ainda de enriquecimento ilícito e dano ao erário, devido ao mau uso da verba indenizatória, criada em 2008 por eles.
Em audiência, os vereadores disseram que usavam o dinheiro da Câmara Municipal para prestar serviços à comunidade, como por exemplo, levar as pessoas aos velórios, festas e casamentos. Eles negaram, entretanto, que usavam notas frias para justificar os gastos e que tenham contratado uma empresa de contabilidade para invalidar as provas. A audiência estava marcada para segunda-feira, mas quando estavam a caminho, os nove parlamentares foram surpreendidos pela Polícia Civil e levados direto para a cadeia. O atual advogado dos vereadores, Arnaldo Silva Júnior, impetrou pedido de habeas corpus pela soltura dos vereadores, mas até o fechamento desta edição o Tribunal de Justiça ainda não havia tomado uma decisão.
A motivação da prisão, segundo o Ministério Público, foi a contratação da empresa de contabilidade, ao custo de R$ 5 mil, em nome da Câmara, para tentar derrubar as provas da promotoria que já havia ajuizado uma ação civil pública contra eles. A denúncia do desvio de dinheiro foi encaminhada à Justiça em dezembro e os vereadores contrataram a empresa em janeiro. O ato foi visto pela promotoria como uma ameaça à ordem pública e ao erário municipal.
Substitutos
Os suplentes dos vereadores presos estão à frente da Câmara de Fronteira. Assim como os afastados, eles têm rotina de trabalho branda. Além da verba extra de R$ 3 mil mensais, eles recebem salário de R$ 3,5 mil para participar de apenas uma reunião a cada 30 dias. O presidente da Câmara ganha mais: R$ 4.320. Pelas regras, eles podem gastar R$ 550 com alimentação e até R$ 2.450 com combustível. Basta apresentar uma simples nota fiscal, sem qualquer tipo de validade contábil, para embolsar o dinheiro.
Acusados de acobertar o golpe, três servidores da Casa também estão sendo processados. Como já haviam sido denunciados por peculato e formação de quadrilha, os assessores Fausto Rogério Marques, Adauto José do Prado e a contadora Luciana Biaggi foram acionados por terem cometido 216 atos de improbidade administrativa.
Memória
Caso parecido há cinco anos
Em 6 de julho de 2006, oito dos então 15 vereadores de Montes Claros, e um suplente foram presos pela Policia Federal na Operação Pombo Correio. Eles foram acusados do uso de notas fiscais frias e outros documentos para desviar recursos públicos da verba indenizatória de gabinete. Segundo as investigações, teriam sido usados recibos falsos de uma agência terceirizada dos Correios. Daí, o nome da operação. Todos os envolvidos negaram a acusação. O caso teve repercussão nacional. Os oito vereadores e o suplente tiveram a prisão provisória decretada pela Justiça e ficaram um dia e meio na prisão, sendo liberados depois de conseguir habeas corpus. Dos nove, somente três conseguiram se reeleger em 2008. Continuam tramitando na Justiça os processos criminal e civil (improbidade administrativa) contra os envolvidos na Operação Pombo Correio. Porém, segundo o advogado dos vereadores, Farley Soares Menzes, três foram excluídos do processo ainda na fase de investigação, por falta de provas: Raimundo Pereira da Silva (PDT) e Marcos Nem (PR), reeleitos em 2008, e Aurindo Ribeiro (PTN), que ficou com a suplência. O juiz Isaías Caldeira Veloso, da Primeira Vara Criminal, diz que o processo criminal continua em andamento, sendo ouvidas as testemunhas. (Luiz Ribeiro)