Politica

Governo vai rever leis para acatar ordens da Fifa sobre Copa de 2014

postado em 04/10/2011 07:45
Bruxelas ; O governo brasileiro já aceita mudar o projeto da Lei Geral da Copa de 2014, enviado ao Congresso há duas semanas. O ministro do Esporte, Orlando Silva, disse ontem que o Planalto está disposto a rever a redação da proposta para atender exigências da Fifa, a entidade máxima do futebol mundial, principalmente sobre os direitos de transmissão de televisão e venda de bebidas alcoólicas nos estádios. A declaração foi feita ao lado do secretário-geral da entidade, Jérôme Valcke, logo após uma reunião que os dois tiveram com a presidente Dilma Rousseff. Ela está no país para a V Cúpula Brasil-União Europeia, e decidiu receber pela primeira vez um dirigente da Fifa.

A reunião, que ocorreu no hotel onde a delegação brasileira está hospedada, foi acertada de última hora. Até sexta-feira, não era certa a ida do ministro do Esporte a Bruxelas ; o nome dele nem sequer constava na lista de autoridades da viagem. Após grande insistência por parte da Fifa, Dilma concordou em abrir o diálogo. Ficou acertada uma nova reunião para a próxima semana.

No fim do mês, segundo Valcke, o presidente da entidade, Joseph Blatter, deverá ir a Brasília para se encontrar com Dilma. Ele disse que haverá uma declaração conjunta de ambos, e até mesmo uma entrevista coletiva à imprensa, sobre ;o acordo que estão concluindo e que assinarão entre o Brasil e a Fifa;.

Os dirigentes da Fifa estão preocupados com várias das regras previstas para o Mundial de 2014: a meia-entrada para estudantes e idosos; a proibição de vender bebidas em estádios; a oferta de voos internos e de hospedagem a preços que não sejam muito elevados; e o uso de imagens dos jogos por empresas que não pagaram por direitos de transmissão (veja quadro ao lado).

Ao lado de Valcke, o ministro do Esporte procurou deixar claro que o governo não tem responsabilidade sobre a maior parte dessas questões. A venda de bebidas, disse, faz parte do regulamento da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), a partir de um acordo com o Ministério Público. A meia-entrada de estudantes é assunto tratado em leis estaduais. ;A própria Fifa, tenho certeza, pautará esse diálogo com os governos locais. E de nossa parte o que for possível colaborar para o ambiente ficar mais harmônico nós faremos;, disse ele.

O uso de imagens é o ponto com mais chances de avançar, segundo Orlando Silva. ;O acesso à informação está garantido pelo flagrante jornalístico. A preocupação relativa à manipulação desse acesso (jornalístico) às imagens, seja com fins comerciais, seja para divulgação em outros países, não é só da Fifa, é uma preocupação nossa. Esse é um exemplo de que a redação pode ser aperfeiçoada para evitar manipulação;, afirmou o ministro do Esporte. Ele disse também que o projeto poderá ser alterado para garantir que o credenciamento de jornalistas caberá à Fifa e que o governo brasileiro indenizará a Fifa se causar prejuízos à entidade, por ação ou omissão.

;Foi a primeira vez que nós, da Fifa, tivemos a oportunidade de nos expressar e de trocar informações com a presidente, a senhora Rousseff. Tivemos a oportunidade de dizer que ou nós trabalhamos juntos, e isso será um ganha-ganha, ou não trabalhamos juntos, e ambos perdemos: a Fifa e o Brasil;, disse o secretário-geral da Fifa.

Valcke afirmou que não há dúvidas na Fifa quanto à obrigação de cumprir leis locais. ;Temos que garantir que a Constituição Brasileira seja aplicada assim como os direitos da Fifa sejam protegidos.; Ele ponderou que é preciso lembrar que a Copa é um evento único, sobre o qual não devem ser aplicadas algumas regras que valem para outros eventos. ;Vocês têm de entender que a Copa do Mundo é financiada por parceiros privados e nós nunca, nunca colocamos nós, ou colocamos eles, em uma situação negativa em relação a esses compromissos. Vamos proteger nossos parceiros comerciais, TVs e patrocinadores tanto quanto pudermos. E está claro que isso será parte da discussão;, afirmou.

Estádios
O secretário-geral da Fifa disse que não há preocupação em relação aos estádios, que estarão prontos até a Copa, ainda que nem todos, talvez, para a Copa das Confederações, em 2013. No dia 20, a Fifa anunciará em que cidades serão realizados todos os jogos, da abertura à final. ;Eu já sei quais são. Mas cabe ao comitê executivo dar a palavra final.;

A preocupação da Fifa é quanto à falta de infraestrutura e às dimensões continentais do país. O secretário-geral da Fifa quer que seja garantida na Copa a oferta de passagens aéreas internas e hospedagem a preços razoáveis. E deixou subentendido que o governo precisa trabalhar para isso. ;É preciso ter a possibilidade de voar de Recife a Porto Alegre sem problemas. Se seu time está indo de uma cidade para outra, é preciso assegurar que seja simples se deslocar, e aliás que não seja caro.; Perguntado se tinha certeza de que a Copa ocorrerá no Brasil de acordo com os padrões da Fifa, ele hesitou: ;De acordo com as regras da Fifa, eu não sei;.

As divergências

Estatuto do Idoso
Fifa
Suspensão das meias-entradas para todos os torcedores.
Governo
A presidente Dilma bate o pé e diz que a meia-entrada para idosos é uma conquista social.

Estudantes
Fifa
Entrada inteira para todos os torcedores.
Governo
A presidente Dilma alega que a meia-entrada para estudantes é regida por legislações estaduais, não havendo espaço para interferência do governo federal.

Bebidas alcoólicas
Fifa
A entidade quer que a venda de bebidas alcóolicas seja permitida nos estádios em dias de jogos.
Governo
Dilma concordou em retirar, do Estatuto do Torcedor, a proibição de venda nos estádios. Mas a Fifa quer que, na lei, fique claro que a venda será permitida, o que, na análise da entidade máxima do futebol, está apenas subentendido.

Pirataria
Fifa
Cobra penas duras para quem piratear símbolos da Copa do Mundo.
Governo
A Lei Geral da Copa prevê penas de três meses a um ano de reclusão. No entanto, o acordo ainda não saiu porque a Fifa acha que reclusão de até um ano não é coercitiva e pede uma punição maior. O governo brasileiro alega que essa é a pena prevista para os casos de pirataria no país.

Direitos de transmissão
Fifa
Defende que o governo não deve interferir na distribuição das imagens da Copa do Mundo.
Governo
Avalia que a emissora detentora dos direitos de transmissão deve repassar para as demais emissoras, até duas horas após a realização do jogo, 6% do tempo total de duração da partida. A Fifa sabe que essa regra (obrigatoriedade de distribuir 6% das imagens) é universal no caso de grandes eventos. Questiona apenas o prazo máximo de duas horas para essa distribuição. O governo brasileiro quer evitar o monopólio.

Direitos do consumidor
Fifa
A entidade quer liberdade total se precisar alterar datas e horários dos jogos.
Governo
Dilma defende que, nesses casos, com base no Estatuto do Torcedor, quem comprou o ingresso terá de ser ressarcido ou ter o direito de entrar no evento remarcado sem a necessidade de comprar uma nova entrada.

Colaborou Paulo de Tarso Lyra

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