postado em 09/10/2011 08:02
Pão, futebol e política. O que seria mais uma repetição da máxima romana resume a trajetória do deputado Vicente Cândido (PT-SP). Na Vila Formosa, em São Paulo, Cândido é um dos sócios da Luxo Real Panificadora. Na Região Metropolitana e no ABC, é o vice-presidente da Federação Paulista de Futebol. Já em Brasília, o cartola assumiu a relatoria da Lei Geral da Copa no Congresso. A influência do deputado no meio desportivo e a amizade com o ex-ministro José Dirceu contaram pontos para que o parlamentar de primeiro mandato emplacasse em seus primeiros meses no Congresso a relatoria do principal projeto do governo para a Copa do Mundo de 2014.Apesar do trânsito do corintiano no mundo do esporte, o histórico do petista envolvendo delicadas questões do direito desportivo e internacional contaram mais na escolha. Vicente Cândido é sócio de Marco Polo Del Nero. O presidente da Federação Paulista de Futebol está na lista dos possíveis sucessores de Ricardo Teixeira no comando da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).
O sócio do relator da Lei Geral da Copa já acompanhou Alberto Dualib, ex-presidente do Corinthians, em depoimento dado à Polícia Federal para explicar envolvimento do clube com a empresa Media Sports Investments (MSI), firma estrangeira acusada de fechar negócios irregulares com o clube, representada pelo iraniano Kia Joorabchian.
De acordo com interlocutores do deputado, Vicente Cândido se aproximou do presidente da Federação Paulista por intermédio do empresário russo Boris Berezovski, que seria um dos investidores da MSI, empresa que injetou recursos no Corinthians antes de a Polícia Federal intervir nas operações de suposta lavagem de dinheiro em âmbito internacional. O bilionário russo é acusado de corrupção em seu país e o governo local tenta parceria com outras nações para fechar a extradição do empresário.
Com o intuito de alcançar asilo político para Berezovsky, Vicente Cândido e José Dirceu teriam pressionado o governo a permitir a permanência do russo no país sem que ele corresse risco de ser extraditado, em 2007. Nos planos do empresário estavam investimento de recursos na construção de um estádio para a Copa, em São Paulo.
[SAIBAMAIS]As relações de Vicente Cândido com o universo empresarial e de dirigentes do futebol fazem do relator o interlocutor ideal da CBF e da Federação Internacional de Futebol (Fifa) para a Lei Geral da Copa, segundo dirigentes ouvidos pelo Correio. A escolha do petista foi comemorada por representantes da bancada da bola, que apostam em um relatório brando para conciliar as exigências da Fifa com a legislação brasileira. A missão do parlamentar é evitar conflitos jurídicos no texto, para que o documento chegue ao plenário da Câmara sem entraves constitucionais.
A habilidade político-desportiva de Cândido, afirmam aliados, foi descoberta em São Paulo, durante a gestão de Marta Suplicy na prefeitura, quando o então vereador conseguiu contornar conflito entre a Federação Internacional de Automobilismo (FIA) e o governo, isentando a entidade de impostos depois da ameaça de tirar o evento anual da Fórmula 1 da capital. Entre as posições já anunciadas pelo relator da Lei Geral da Copa, está a liberação de bebidas alcoólicas nos estádios não só durante o Mundial, mas em todos os jogos.
TRÊS PERGUNTAS// Vicente Cândido
A criação de câmaras especializadas para julgar casos relacionados à Copa do Mundo fere a soberania nacional?
Acho supertranquilo. Em São Paulo, sou vice-presidente da Federação de Futebol e nós instituímos juizados especiais nos estádios. Isso é permitido pela nossa Constituição. Para um evento dessa grandeza, acho positivo, não fere nossa cultura jurídica. Vou propor um complemento obrigando as partes a elegerem uma câmara arbitral, acho mais eficaz. Por exemplo, instituindo um juizado especial para o caso, as partes podem resolver o litígio ali mesmo, mas, discordando, cabe recurso e pode ficar alguns anos pendente na Justiça brasileira. Com a eleição de uma câmara arbitral, a Fifa vai embora com o caso resolvido. Vou propor isso, seria uma solução complementar.
A Fifa será isenta de pagar, até mesmo, despesas processuais, isso é regular?
A maior isenção é a tributária. Isso está dentro do acordo, assinado pelo ex-presidente Lula. Em São Paulo, fui autor do Fundo Municipal de Esportes, na ocasião queria taxar a Fórmula 1. O presidente da Fia (Federação Internacional de Automobilismo) chegou para a Marta Suplicy, que era prefeita, e falou: ;você vai estacionar desse jeito, estou indo embora daqui e não faço Fórmula 1 em São Paulo;. E a Marta teve que vetar o dispositivo que taxava a Fórmula 1. Isso é um padrão das entidades internacionais, eles usam o poder que têm e cabe ao governo dizer se aceita ou não aquela condição. Não vejo nenhum absurdo, é uma praxe de grandes entidades que organizam eventos mundiais.
O governo será responsabilizado e terá que fazer um seguro para cobrir eventuais danos provocados à Fifa e sua delegação?
O seguro internacional está dentro da prática de mercado. Em relação à responsabilidade, ela é objetiva, em caso de omissão de membros da União. Se eu sou o patrocinador do evento e convido você para fazer na minha casa, na minha cidade, eu tenho que ser responsabilizado pelos meus atos. A Fifa tinha outra exigência (em relação à responsabilização da União) que a presidente Dilma não aceitou, com razão. A Fifa queria que escrevesse (na lei) em ato de terrorismo, em acidentes dessa natureza, a presidente Dilma não aceitou, porque não é da natureza do Brasil a prática de terrorismo.