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Juristas e ministros do STF criticam descumprimento de decisões judiciais

postado em 23/10/2011 08:00
O descumprimento de decisões judiciais é um mal que aflige o Brasil. São comuns os casos de liminares ignoradas pelo poder público e de sentenças que levam anos para serem cumpridas ou caem no esquecimento. As inúmeras possibilidades de recursos contra ordens de juízes não são as únicas culpadas pela falta de execução das decisões. Mas a desobediência também resulta na impunidade e causa o desprestígio do Poder Judiciário.

Entre os exemplos de recentes casos de decisões desrespeitadas estão liminares do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), que, no começo do ano, determinou que a Câmara desse posse aos suplentes dos partidos, e não da coligação, no lugar de deputados licenciados. O presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), porém, não cumpriu as ordens (veja quadro).

Juristas alertam também para o elevado índice de descumprimento do pagamento de precatórios (dívidas dos estados) e de decisões que determinam a interrupção de greves. ;Há um sistema no caso da greve em que se impõe uma multa ao órgão de classe quando o trabalhador não volta ao trabalho, mas quase sempre o sindicato não tem como fazer frente à multa;, destaca o ministro Marco Aurélio.

Outro problema verificado em alguns estados é o desrespeito a sentenças que determinam a reintegração de posse de terras ilegalmente ocupadas por invasores. O Pará é, inclusive, alvo de um pedido de intervenção federal por não ter cumprido decisões.

Redemocratização
A avaliação de juristas é de que o Brasil ainda não concluiu seu ciclo de redemocratização, iniciado na metade dos anos 1980. ;Avançamos muito do ponto de vista da maturidade institucional e também em relação ao processo civilizatório, mas é preciso reconhecer que ainda não percorremos todos os ciclos do atraso;, afirma o advogado constitucionalista Luís Roberto Barroso. Para ele, quando uma decisão judicial fica apenas no papel, não só o Judiciário, mas também o Estado democrático de direito, está com a credibilidade comprometida.

Marco Aurélio concorda que a ;democracia ainda não está bem sedimentada; no Brasil. ;Num Estado realmente democrático, a decisão judicial, principalmente da Suprema Corte, tem que ser observada de imediato;, opina. ;Eu próprio tive situações em que a Câmara deixou de observar liminar. Um exemplo é quando deferi a um jornal a abertura das despesas dos deputados, o que não foi cumprido.; Para o ministro, quando um órgão público deixa de observar uma decisão judicial fica o mau exemplo para o cidadão comum.

O ministro do Supremo Luiz Fux observa que a desobediência é crime. ;O Judiciário tem meios de fazer valer as suas decisões;, alerta. Os juízes brasileiros, porém, não seguem à risca essa previsão, que pode levar até à prisão de quem desobedece a uma ordem judicial.

Questionados sobre a solução, os juristas disseram que não há uma fórmula simples. ;O Judiciário não tem nem armas, nem a chave do cofre. Para algumas discussões da vida existem remédios adequados. Para outras, precisamos de amadurecimento institucional e avanço civilizatório;, resume Luís Roberto Barroso.

Dura lex sed lex*

Veja exemplos de decisões judiciais descumpridas

Precatórios
Os maiores descumpridores de ordens expedidas por juízes são os estados brasileiros, que frequentemente desrespeitam decisões judiciais que os obrigam a pagar precatórios.

Greves
Não são raros os casos de sindicatos que ignoram decisões de juízes determinando a volta da categoria ao trabalho. Dois recentes casos ocorreram no Ceará, onde os professores da rede estadual permaneceram em greve após decisão judicial, e no Maranhão, onde os rodoviários não voltaram ao trabalho mesmo depois de uma liminar que declarou a paralisação ilegal.

Pará
Tramita no Supremo, desde dezembro de 2009, um pedido de intervenção federal no Pará, devido a sucessivos descumprimentos de decisões judiciais que determinam a reintegração de posse de terras das regiões sul, sudeste e oeste do estado. Muitas propriedades continuam ocupadas por integrantes de movimentos sociais de sem-terra.

Câmara dos Deputados
O presidente da Câmara, Marco Maia (PT), não acatou em fevereiro decisões liminares do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, que determinou a posse de deputados suplentes dos partidos, e não das coligações. Somente em abril, o plenário do Supremo definiu que os suplentes das coligações têm o direito a vaga dos parlamentares licenciados. Ou seja, durante dois meses, as decisões liminares que vigoraram não foram cumpridas.

*A lei é dura, mas é lei (em latim)

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