Cerca de 100 índios invadiram, na tarde desta terça-feira, o plenário da Câmara dos Deputados. Eles exigem que a Casa arquive uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que transfere a competência das demarcações para o Congresso Nacional. Hoje, a função é da Fundação Nacional do Índio (Funai). A bancada ruralista pressiona para que a PEC seja aprovada.
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Os índios que protestam contra a PEC 215/00, que transfere para o Legislativo o poder de homologar as terras indígenas, foram para um dos plenários das comissões discutir se concordam ou não com a sugestão dos partidos de congelar a tramitação da proposta até o segundo semestre e criar uma comissão para mediar o debate sobre o tema.
O líder indígena Marcos Apurinã disse que a proposta dos partidos não satisfaz as demandas dos índios. "Queremos a revogação do ato que cria a comissão especial, ainda não é um acordo viável para nós", disse.
Invasão
Os índios surpreenderam os deputados, que estavam envolvidos nas negociações para votar proposta que dificulta a criação de partidos. Antes de invadir o plenário, eles deram várias voltas, com chocalho na mão, na entrada do espaço, conhecida como Salão Verde. Depois, foram para a porta do plenário e entraram em conflito com seguranças. Os índios pressionaram até conseguir entrar no entrar no local.
Alguns deputados correram e outros ficaram paralisados, assustados com a cena. ;Nunca aconteceu isso no Congresso;, comentou o deputado federal José Genoíno (PT-SP). A sessão teve de ser suspensa e, durante 20 minutos, o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), tentou encontrar uma solução.
Enquanto os parlamentares tentavam se entender, os índios dançavam e cantavam no plenário. A ex-senadora Marina Silva, que estava na Casa para negociar a PEC que dificulta a criação de partidos, conversou com os índios, tentando uma negociação.
Alves, então, usou o microfone para dizer que o respeito ao plenário da Casa é ;inegociável; e, depois de frisar que a Câmara é importante para a democracia brasileira, encerrou a reunião e pediu que os índios desocupassem o plenário e fossem conversar com ele no gabinete da presidente, onde estão agora conversando sobre a PEC.
Indígenas
"Somos contrários à invasão de nossas terras. Nós somos os primeiros habitantes. O (homem) branco está mandando em nós, não gostamos disso. Têm que nos respeitar", disse o cacique Raoni em idioma próprio, ostentando um grande disco labial de madeira e um cocar de penas amarelas, diante de deputados e representantes dos indígenas de todo o país.
"Estamos exigindo a revogação destes projetos de lei, que são um trabalho assassino. Onde crescemos e nos criamos é que está o espírito do povo indígena, o espírito da água, o espírito da floresta, não deixaremos estas terras", disse Oriel Guarani Kaiowá, representante desta etnia do centro-oeste do Brasil.
No ano passado, os Guarani-Kaiowá chamaram a atenção do mundo ao resistir à desocupação de uma grande fazenda no sul do país, que dizem estar dentro de suas terras ancestrais e que está sendo demarcada pelo governo para entregar aos aborígenes.
A principal lei repudiada pelos indígenas é uma emenda constitucional (PEC 215), que transferiria do Executivo ao Legislativo a competência de aprovar e demarcar terras indígenas e parques de preservação ambiental.
"Entregar o controle da definição de terras indígenas a um Congresso com uma poderosa bancada do setor agropecuário é um perigo. É uma medida da bancada agropecuária para retirar o poder do Executivo sobre esta área", disse à AFP o deputado Máriton de Holanda (PT-RO), coordenador da Frente Parlamentar de Defesa dos Povos Indígenas.
Outra reforma em estudo no Parlamento autorizaria criar concessões a produtores agropecuários dentro de terras indígenas. As autoridades pretendem, ainda, regulamentar a exploração de minério em terras indígenas e a advocacia geral da União aprovou recentemente uma medida que proíbe ampliar terras indígenas reconhecidas no passado.
Frente parlamentar
"São nossas danças tradicionais para abençoar este local e para que nos ajude em nossa luta", explicou uma indígena Macuxi, da reserva Raposa Serra do Sol, que dançou com um grupo de mulheres indígenas vestindo saias de palha. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), comprometeu-se a levar seus apelos a uma reunião de líderes de partidos.
"Nunca aceitarei o desmatamento em áreas indígenas, nunca aceitarei a construção de hidroelétricas e a exploração de minério em terras indígenas", concluiu o cacique Raoni, que disse querer levar suas reivindicações à presidente Dilma Rousseff.
Segundo o censo de 2010, dos 194 milhões de habitantes do Brasil, 896.900 são indígenas, distribuídos em 305 etnias, que falam 274 idiomas.
O deputado Sarney Filho (PV-MA) afirmou, em discurso no Plenário da Câmara, que os índios decidiram continuar ocupando o Plenário 1 das comissões permanentes (local de reunião da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, CCJ) enquanto o presidente Henrique Eduardo Alves não resolver o impasse sobre a instalação da PEC 215/00.
O projeto transfere do Poder Executivo para o Congresso Nacional a decisão final sobre a demarcação de terras indígenas no Brasil. Na última quarta-feira (11/4), foi aprovada a instalação de uma comissão especial para tratar da PEC.
Mais cedo, o presidente da Câmara havia suspendido a instalação da comissão especial por 45 dias. Entretanto, a negociação sobre o tema não teve continuidade, e os índios decidiram permanecer no Plenário 1.
Com informações de agências