Na mais dura resposta internacional aos Estados Unidos desde que vieram à tona as denúncias de que o país estaria espionando nações amigas, a presidente Dilma Rousseff confirmou ontem o adiamento da visita de Estado que faria a Washington em 23 de outubro. Seria a primeira com esse status no segundo mandato de Barack Obama e a única programada para este ano pelo governo americano. Em notas divulgadas quase ao mesmo tempo, o Planalto e a Casa Branca disseram que a decisão foi acertada entre os dois governantes. Uma nova data não foi marcada, mas Washington sinalizou com a disposição de que seja no prazo mais breve possível. A resposta brasileira foi uma clara demonstração de descontentamento com as explicações apresentadas até agora sobre a prática dos serviços de inteligência dos EUA, que não pouparam sequer as comunicações da presidente.
O comunicado do foi formulado para dar uma resposta sem aumentar a temperatura da crise diplomática. ;Na ausência de tempestiva apuração do ocorrido, com as correspondentes explicações e o compromisso de cessar as atividades de interceptação, não estão dadas as condições para a realização da visita na data anteriormente acordada;, diz a nota. O texto menciona o telefonema que a presidente recebeu de Obama na noite anterior. Os dois concordaram que não havia clima para a visita, inclusive pelo risco de que novas denúncias surgissem às vésperas da chegada de Dilma, ou mesmo durante a estada. O presidente americano comprometeu-se a buscar uma solução para o impasse, mas dificilmente isso seria possível em tempo para a visita de Estado.
Confira na íntegra as notas oficiais emitidas pelo governo sobre o cancelamento da viagem da presidente Dilma Roussef aos Estados Unidos:
Nota do Palácio do Planalto
A presidenta Dilma Rousseff recebeu ontem, 16 de setembro, telefonema do presidente Barack Obama, dando continuidade ao encontro mantido em São Petersburgo à margem do G-20 e aos contatos entre o ministro Luiz Alberto Figueiredo Machado e a Assessora de Segurança Nacional Susan Rice.
O governo brasileiro tem presente a importância e a diversidade do relacionamento bilateral, fundado no respeito e na confiança mútua. Temos trabalhado conjuntamente para promover o crescimento econômico e fomentar a geração de emprego e renda. Nossas relações compreendem a cooperação em áreas tão diversas como ciência e tecnologia, educação, energia, comércio e finanças, envolvendo governos, empresas e cidadãos dos dois países.
As práticas ilegais de interceptação das comunicações e dados de cidadãos, empresas e membros do governo brasileiro constituem fato grave, atentatório à soberania nacional e aos direitos individuais, e incompatível com a convivência democrática entre países amigos.
Tendo em conta a proximidade da programada visita de Estado a Washington ; e na ausência de tempestiva apuração do ocorrido, com as correspondentes explicações e o compromisso de cessar as atividades de interceptação ; não estão dadas as condições para a realização da visita na data anteriormente acordada.
Dessa forma, os dois presidentes decidiram adiar a visita de Estado, pois os resultados desta visita não devem ficar condicionados a um tema cuja solução satisfatória para o Brasil ainda não foi alcançada.
O governo brasileiro confia em que, uma vez resolvida a questão de maneira adequada, a visita de Estado ocorra no mais breve prazo possível, impulsionando a construção de nossa parceria estratégica a patamares ainda mais altos.
Secretaria de Comunicação Social da
Presidência da República Federativa do Brasil
Nota da Casa Branca
Ontem, o presidente (Barack Obama) falou pelo telefone com a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, dando seguimento ao diálogo que tiveram em São Petersburgo e à reunião entre a embaixadora (Susan) Rice e o ministro das Relações Exteriores do Brasil (Luiz Alberto Figueiro) na semana passada.
Os Estados Unidos e o Brasil desfrutam de uma parceria estratégica que tem por base os valores democráticos compartilhados e o desejo de levar diante um crescimento econômico de base ampla, com criação de empregos. O convite do presidente Obama à presidente Rousseff para a primeira visita de Estado de seu segundo mandato é um reflexo da importância que ele confere a essa crescente parceria mundial e à estreita conexão entre os povos dos Estados Unidos e do Brasil.
O presidente afirmou que compreende e lamenta as preocupações geradas no Brasil pelas revelações de supostas atividades de inteligência norte-americanas, e deixou claro que mantém o compromisso de trabalhar com a presidente Rousseff e seu governo, pelos canais diplomáticos, a fim de superar essa questão como fonte de tensão em nosso relacionamento bilateral.Como o presidente declarou anteriormente, ele ordenou uma ampla revisão da postura de inteligência dos Estados Unidos, mas esse processo demorará muitos meses a ser concluído. O presidente Obama e a presidente Rousseff aguardam positivamente a visita de Estado, que celebrará nosso amplo relacionamento e não deve ser obscurecida por uma questão bilateral isolada, não importa o quanto essa questão seja importante ou desafiadora. Por esse motivo, os presidentes concordaram em adiar a visita de Estado da presidente Rousseff a Washington marcada para o dia 23 de outubro.
O presidente Obama aguarda com esperança a oportunidade de receber a presidente Rousseff em Washington, em data a ser decidida por acordo. Outros importantes mecanismos de cooperação, entre os quais diálogos presidenciais sobre cooperação política, econômica, energética e de defesa, continuarão.
Secretário de Imprensa da Casa Branca, Jay Carney