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'Me considero um bode expiatório', diz Donadon ao ter mandato cassado

Diante do voto aberto, o agora ex-deputado federal recebeu 467 votos pela cassação e voltou para a cadeia sem o mandato



Há seis meses, Donadon circulava com desenvoltura no plenário, abraçando colegas mais próximos, parando para fazer um lanche e sorrindo ao lado de parentes. Subiu à tribuna, falou da falta de água para tomar banho e da má alimentação do Complexo Penitenciário da Papuda, onde está detido desde junho, e fez um apelo emocionado. Desta vez, o rondonense estava apreensivo. No início da semana, avisou que iria novamente se defender na tribuna, mas, ontem, desistiu. No fim da tarde, quando seu advogado, Michel Saliba, contava a decisão à imprensa, Donadon surgia em outra porta.

O ex-parlamentar entrou no Congresso por volta de 18h30, acompanhado de seguranças, por um túnel subterrâneo do Anexo I da Câmara, passou pela área do almoxarifado e subiu por um elevador de carga. Chegou de moletom, calça jeans e tênis ; tudo branco, como manda o figurino da Papuda. Ficou cerca de duas horas na sala de reunião da Mesa Diretora, onde arrumou o cabelo e vestiu um terno completo. Perguntado se havia conseguido tomar um banho, ele riu e confirmou.

O advogado jurou ter sido surpreendido pela chegada do cliente. ;Estou tão surpreso quanto vocês, ele vai ser massacrado no plenário;, reclamou. Mais tarde, Saliba explicou que os agentes da penitenciária teriam levado Donadon à Câmara contra sua vontade. ;Ele não queria vir, mas eles acharam lá que era obrigatório e o trouxeram;, relatou o defensor. Já que estava lá, o rondonense decidiu que queria defender-se na tribuna. Saliba e outros parlamentares, porém, o convenceram do contrário. ;Isso ia sangrar mais ainda a imagem dele.;

Donadon ficou sentado no plenário, discreto, ao lado de outro advogado e cercado de seguranças e jornalistas. Abraçou apenas poucos servidores e dois parlamentares ; Wladimir Costa (SDD-PA), que o procurou, e Cândido Vaccarezza (PT-SP), que estava por perto. Apesar dos apelos da defesa, ele falou à imprensa. ;O voto aberto vai fazer com que meus colegas votem contra o coração e a vontade deles, é uma prisão;, disse. ;Meu processo começou quando era voto secreto, estão rasgando a Constituição, mudando a regra no meio do jogo, me considero um bode expiatório perseguido politicamente;. Perguntado se gostaria de voltar à política, respondeu: ;Sendo liberado, por que não? Fiz meu trabalho com muito carinho e amor.; O ex-deputado ouviu o restante da defesa de seu advogado na tribuna e, logo em seguida, saiu pela última vez do plenário da Câmara, sem esperar o resultado.

;Meu processo começou quando era voto secreto, estão mudando a regra no meio do jogo, me considero um bode expiatório;
Natan Donadon, ex-deputado federal

Nova chantagem do PMDB
Depois de abrir mão de indicar nomes aos ministérios em que tem representantes no comando, a bancada do PMDB na Câmara anunciou ontem que votará contra todas as propostas consideradas prioritárias pelo governo. Isso inclui cinco projetos com urgência constitucional, como o Marco Civil da Internet, que trancam a pauta, e vetos presidenciais. ;Não é que sejamos contra os projetos. Queremos apenas limpar a pauta;, comentou o líder do partido, Eduardo Cunha (RJ). A legenda é a maior da Casa ; com 75 deputados ; e vem travando longas batalhas com o Palácio do Planalto desde que Cunha assumiu a liderança, no início de 2013.

Memória
Autoridade na cadeia
O deputado Natan Donadon (sem partido-RO) está preso em ala especial da Papuda desde junho de 2013. Ele foi o primeiro congressista a cumprir pena de regime fechado durante o exercício do mandato. Donadon se entregou em 28 de junho, após ser condenado a 13 anos, 4 meses e 10 dias de prisão por formação de quadrilha e peculato. Os crimes envolvem o desvio de mais de R$ 8 milhões da Assembleia Legislativa de Rondônia. Ele nega ter cometido qualquer crime. Depois da prisão, Donadon foi expulso do PMDB. A Câmara suspendeu o salário do parlamentar e exonerou os funcionários de seu gabinete.