postado em 22/04/2014 20:17
O Marco Civil Internet foi aprovado por unanimidade na noite desta terça-feira (22/4) pelo plenário do Senado Federal. Para entrar em vigor, a "Constituição da internet", como o projeto vem sendo chamado, precisa agora da sanção da Presidência da República. A aprovação da lei pelos senadores, ainda que a toque de caixa, deve ser usada como trunfo por Dilma Rousseff na abertura da NetMundial, evento sobre a rede mundial de computadores que começa na quarta-feira (23), em São Paulo, e na qual estarão presentes representantes de dezenas de países.
[SAIBAMAIS]Apesar da unanimidade, a forma como o Marco Civil tramitou no Senado Federal provocou reações indignadas da oposição. Para que o projeto fosse aprovado a tempo de ser mencionado pela presidente Dilma, quase não houve discussão da matéria pelos senadores, que enviaram ao Executivo praticamente a mesma proposta recebida da Câmara dos Deputados.
O que muda
O Marco Civil da Internet estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para pessoas que usam e empresam que provêm serviços de internet no Brasil. Dentre outros pontos, os pilares do projeto são a garantia da privacidade dos usuários - com a criação de normas para a armazenagem de dados pelos provedores, e a proibição da venda das informações dos internautas; da liberdade de expressão - com a instituição da obrigatoriedade de ordem judicial para que um conteúdo seja retirado do ar por um provedor - e a neutralidade da rede. Este último ponto significa que não pode haver diferença no tratamento ou cobrança do usuário com base no conteúdo acessado.
Com a pressa, reparos futuros
Embora a oposição tenha firmado a necessidade de mais tempo para discussão sobre o tema, uma manobra regimental do governo possibilitou a inversão de pauta e colocou o projeto como primeiro item da Ordem do Dia desta terça-feira (22/4).
Mais cedo, o líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), garantiu que haverá oportunidade de ajustes do texto no futuro, por meio de medida provisória. De manhã, duas comissões permanentes haviam aprovado o projeto - a de Constituição e Justiça (CCJ) e a de Ciência e Tecnologia (CCT). A terceira comissão de mérito pela qual o projeto deveria passar foi a comissão de fiscalização e controle, a CMA, que deu seu parecer já no plenário.
O relator ad hoc, Ricardo Ferraço (PMDB-ES), destacou que o projeto é fruto de um amplo ciclo de debates e consultas feitos, inclusive, pela rede de computadores. De acordo com ele, o Marco Civil foi construído pelos usuários num processo inovador, inclusivo e democrático.
"O resultado foi um texto maduro, equilibrado e inteligente, que balanceia os direitos e obrigações dos usuários", disse Ferraço.
Ele lembrou que hoje os administradores de sites de hospedagem podem retirar conteúdos mediante notificações. A partir da nova lei, isso terá de ser feito apenas por determinação judicial. Na opinião dele, o Brasil está dificultando a ação de hackers e serviços de espionagem de dados e comunicações.
- Essa é uma norma legal para coibir a cooperação das empresas de internet com agências e serviços de espionagem eletrônica, como a norte-americana NSA. A evolução tecnológica tornou difícil, senão impossível, a plena garantia da privacidade online. Mas o sigilo das comunicações pela internet estará certamente mais protegido com as novas regras para guarda e disponibilização de dados pessoais.
Ferraço concordou que o texto merecia mais análise, mas disse que está satisfeito com a promessa feita por Braga de que ele poderá ser revisado mais tarde. O senador Walter Pinheiro (PT-BA) também considerou a hipótese:
- Este é um conjunto de diretrizes que aponta para o ordenamento do uso da internet. Aperfeiçoamentos podem ocorrer, futuramente.
No debate, Pinheiro lembrou que a sobrevivência tem sido difícil para os pequenos provedores de internet. Os que dominam o mercado, afirmou, estão ligados a grandes empresas de telecomunicações.
"A neutralidade determina o caminho e a qualidade do serviço prestado, tendo em vista o direito do cidadão. O Marco Civil permite completar a obra de liberdade de comunicação e a quebra de monopólios que tínhamos no país", explicou.
Críticas
O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) disse que a oposição poderia impedir a votação obstruindo-a ou apresentando emendas de plenário, mas não o faria. Contudo, lamentou a posição da presidente Dilma e o "afã dos senadores em querer agradá-la". Como os demais senadores da oposição, ele pedia tempo para aperfeiçoar o texto.
O artigo 31 foi um dos que estava na mira de Aloysio. O texto determina que "até a entrada em vigor de lei específica, a responsabilidade do provedor de aplicações de internet por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros, quando se tratar de infração a direitos de autor ou a direitos conexos, continuará a ser disciplinada pela legislação autoral vigente". Aloysio traduziu o enunciado como se dissesse "a lei de direitos autorais deve ser respeitada até quando for modificada". "Isso é ridículo", resumiu o parlamentar.
A oposição focou, ainda, a redação do artigo 10, que trata da guarda e da disponibilização dos registros de conexão e de acesso a aplicações de internet, como de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas. O texto motivou dúvidas durante a votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) porque havia preocupação sobre a abrangência do termo ;autoridades administrativas;, que podem requisitar dados cadastrais, por exemplo.
O senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), relator do projeto na comissão, concordou com a troca de "autoridades administrativas" por "delegado de polícia e o Ministério Público", mas ele não foi adiante porque faria o projeto voltar para a Câmara, e isso não era interesse do governo.
Entre os principais pontos do projeto, está o artigo 9;, que protege a neutralidade de rede. Ou seja, o tratamento isonômico de quaisquer pacotes de dados, sem distinção de preços para a oferta de conteúdo. A regra determina tratamento igual para todos os conteúdos que trafegam na internet.
Assim, os provedores ficam proibidos de discriminar usuários conforme os serviços ou conteúdos que eles acessam - cobrando mais, por exemplo, de quem acessa vídeos ou aplicações de compartilhamento de arquivos (que exigem maior utilização de banda larga).
Tramitação
Encaminhado pela Presidência da República em 2011, o Marco Civil foi aprovado na Câmara dos Deputados no final de março deste ano, depois de estar em pauta por dois anos. No Senado, o texto já chegou com pedido de urgência constitucional, ou seja, com prazo de 45 dias para análise. Não levou nem um mês para ser votado.
A proposta começou a ser discutida em 2009 e foi elaborada pelo governo tendo como base o documento "Princípios para a governança e o uso da internet", do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). O texto, que passou por consulta pública entre 2009 e 2010, busca estabelecer uma regulamentação geral sobre o uso da internet.
(Com Agência Senado)