Politica

Cunha põe fim a uma relação que nunca existiu com o governo Dilma

Relação entre o presidente da Câmara e a chefe do Executivo sempre foi marcada por conflitos dentro do Congresso

Jacqueline Saraiva
postado em 17/07/2015 15:16

Cunha em discurso na manhã de hoje

O ato "rebelde" do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ao oficializar nesta sexta-feira (17/7) o rompimento pessoal com o Palácio do Planalto, é apenas mais uma evidência do fim de uma relação que, na verdade, nunca existiu entre ele e o governo da presidente Dilma Rousseff (PT). Suportá-lo já não vinha sendo nada fácil para o Planalto ; e vice-versa.

No pronunciamento de hoje, o peemedebista apenas oficializou o que já era claro para todo o Congresso. Num ato de retaliação contra o governo, após ter sido citado em delação do lobista Júlio Camargo à Operação Lava-Jato, Cunha se disse vítima de uma conspiração política, negou ter recebido propina e acusou o governo de tê-lo colocado na posição de investigado pela Polícia federal. ;Essa lama, em que está envolvida a corrupção da Petrobras, cujos tesoureiros do PT estão presos, essa lama eu não vou aceitar;, disse. Cunha também acusou o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de agir para ser reconduzido ao cargo.

O próprio partido, em nota, tratou de deixar claro que o ato de Cunha é ;a expressão de uma posição pessoal;. ;A Presidência do PMDB esclarece que toda e qualquer decisão partidária só pode ser tomada após consulta às instâncias decisórias do partido: comissão executiva nacional, conselho político e diretório nacional;, escreveu o partido. O deputado, no entanto, afirmou que vai defender que o PMDB saia do governo. "Eu, como político e deputado do PMDB, e não como presidente da Câmara, vou pregar no congresso do PMDB, em setembro, que o PMDB saia do governo;.

Alfinetadas no discurso de posse
As atitudes do parlamentar mostram sempre um posicionamento contrário ao clima de ;tom conciliador; pregado por ele no discurso de posse na presidência da Casa, em 1; de fevereiro deste ano. À época, Cunha chegou a afirmar que não havia, por parte do PMDB, ;nenhum julgo de retaliação; contra o governo. ;Nós falamos que não seríamos oposição;, disse. No entanto, no mesmo texto, dito diante dos colegas congressistas, o peemedebista criticou a ;interferência; do Planalto nas eleições para a presidência da Casa e impôs seu papel de resistência. ;Nós assistimos a uma tentativa de interferência do Poder Executivo, ou de parte dele, dentro da eleição do Poder Legislativo. Mas, o parlamento, pela sua independência, sabe reagir;. E reagiu.

A presidente Dilma Rousseff, ao lado do deputado Eduardo Cunha, durante a cerimônia comemorativa do Dia do Exército e de Imposição da Comenda da Ordem do Mérito Militar

Fusão de partidos
Conhecido como exímio conhecedor do regimento da Casa, Cunha também foi uma dor de cabeça para a presidente Dilma na votação do projeto sobre fusão de partidos políticos (PL 23/15). O parlamentar, contrariado com os vetos da líder do Executivo, avisou que trabalharia ;com toda força; para derrubar os pontos rejeitados por Dilma e para impedir na Justiça a criação do Partido Liberal (PL). Em 25 de março, o "Diário Oficial da União" publicou a sanção de Dilma com dois vetos. Um dos trechos vetados era o que determinava prazo máximo de 30 dias para políticos com mandato migrarem para uma nova legenda criada a partir de fusão sem serem enquadrados na lei de infidelidade partidária. Cunha classificou os vetos como "estranhos" e considerou que a postura do governo piorava "com certeza absoluta" a relação com o Congresso.

Marco Civil
A "guerra fria" entre os dois também ficou evidente na aprovação do Marco Civil da Internet (Lei n; 12.965), no ano passado. Cunha, que sempre procurou defender as grandes empresas de telecomunicações, chegou a colocar o próprio partido e mais de cem milhões de internautas no centro do tiroteio contra o Planalto, para tentar derrubar o que ele chamava de "projeto do governo". Só não conseguiu justamente pelo fato de o texto ter sido desenvolvido de forma colaborativa com a sociedade. Com medo dos desgastes, o presidente da Câmara à época, o deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), acelerou a votação da proposta.

Delação
O lobista Júlio Camargo afirmou que o suborno cobrado por Eduardo Cunha, referente a dois contratos de navios-sondas da Petrobras que somavam R$ 1,2 bilhão, assinados entre 2006 e 2007, foi pago por intermédio de Fernando Baiano. O doleiro Alberto Youssef participou da transação. O valor total devido em propina pelo executivo era 10 milhões de dólares. Uma parte para Baiano e a outra para Cunha. Camargo apresentou planilhas para provar os repasses feitos em contas do exterior e também pagos diretamente às empresas de Baiano, apontado como o operador do PMDB no esquema de corrupção.

O presidente da Câmara reafirmou que já se encontrou duas vezes com o lobista Fernando Baiano, mas para discutir a medida provisória dos Portos. Cunha chamou Camargo de mentiroso. ;Quem não deve não teme. Ele está mentindo;, refutou. ;Desminto com veemência as mentiras do delator e o desafio a prová-las;, afirmou o parlamentar, em nota distribuída minutos antes.

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