O rastilho de pólvora espalhado no gramado do Congresso após a liberação do espaço para ocupação de manifestantes pró-impeachment da presidente Dilma Rousseff, há exatamente um mês, ameaça estourar neste fim de semana. Próximo do término do prazo de 48 horas para desocupação da área determinado pelos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), líderes de acampados avisam que vão resistir e que só sairão se forem retirados. O período para a saída acaba por volta das 19h deste sábado (21/11) hoje. O governador Rodrigo Rollemberg já avisou que, se os grupos não saírem pacificamente, utilizará a força policial.
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A decisão de permanecer na área pública controlada pela Polícia Legislativa é encabeçada pelo Movimento Brasil Livre (MBL), o primeiro a transformar em acampamento o espaço que já foi palco de movimentos como o das Diretas Já, dos caras-pintadas pedindo a saída de Fernando Collor e a histórica chegada de Luiz Inácio Lula da Silva ao poder. ;Teremos que ser retirados, pois por livre e espontânea vontade não sairemos;, avisa Alexandre Paiva, um paranaense que deixou a mulher e duas filhas cuidando do seu negócio para dormir em barracas e bradar a derrubada de Dilma do poder.
Próximo ao espelho d;água, os integrantes do MBL chegaram em 10, já somaram 70 e hoje não chegam a 30. Mais acima deles no gramado, e em maior número, estão os integrantes do Resistência Popular, que tem integrantes do Revoltados On-Line, um grupo com estrutura mais robusta preparado para alojar até 500 pessoas ; mas que somam pouco mais de 100. Muitos deles não estão acampados e moram na cidade, dando suporte aos outros que dormem em barracas e usam banheiros químicos.
;Vamos cumprir o prazo de 48 horas assim que a Central Única dos Trabalhadores (CUT) retirar tudo deles que estiver aqui;, informa a consultora organizacional Renata Friaça, que mora em Brasília e ajuda na parte operacional do movimento nos intervalos que tem entre as tarefas profissionais e os cuidados com as filhas em casa. De acordo com Renata, o prazo estipulado para retirada será cumprido, porém usado na integridade, já que o tamanho da estrutura montada exige mais trabalho para ser retirado. ;Aqui não tem baderneiro.;
Na parte superior das ocupações, após a Alameda dos Estados (já no gramado da Esplanada dos Ministérios), a ordem é uma só: não sair enquanto não for expedida uma ordem judicial. ;A condição é ter um mandado de segurança e não um acordo de gabinete;, reclamou Daniel Barbosa, representante da Cruzada pela Liberdade que defende a volta dos militares ao poder. Preso após dar dois tiros para o alto após um confronto com a marcha de mulheres negras, na última quarta-feira, ele havia sido solto no fim da manhã. ;As decisões estão sendo impostas à revelia do ordenamento jurídico.; Integrantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT) também estavam acampados no local desde o meio-dia de quinta-feira, mas saíram de lá após o acordo com os presidentes das Casas. Eles avisaram, porém, que se os grupos pró-impeachment não deixarem o local, voltarão, com mais gente.
Perfil
Os grupos pró-impeachment têm o mesmo fim ; a derrubada de Dilma ;, mas fazem questão de se separarem ideologicamente sobre os meios que cada um defende para alcançar seus ideais. Enquanto o MBL e os revoltados se contentam com a saída da presidente e a permanência do PMDB do vice-presidente Michel Temer no poder, o Movimento Patriota Nacional quer a intervenção e a volta dos militares ao comando do Brasil. ;A gente de ;impeachmistas; só incomoda, mas eles lá de cima (os intervencionistas) tratam o problema como uma batalha;, compara a cabeleireira Charlo Ferreson, que há 15 dias trocou temporariamente o Rio de Janeiro por Brasília para coordenar o acampamento dos Revoltados On-Line.
Os próprios líderes dos grupos que prometem ficar são bastante diferentes. Porta-voz dos intervencionistas, Daniel Barbosa tem 52 anos. Com quatro filhos e um neto, Barbosa deixou a vida em Porto Alegre em março para morar na Esplanada. ;Cinco anos atrás eu comecei a estudar política. Até então, eu era o que é chamado pela esquerda, um idiota útil, era como a grande maioria do povo brasileiro;, disse Barbosa, que já foi gerente nacional de vendas no ramo metal-mecânico, em uma empresa que não quis especificar e prestar consultorias. ;Um governo paralelo de transição civil-militar seria o ideal. Aí, nunca poderiam dizer que os militares deram golpe;, diz, ao explicar o que quer.
Já Fernando Holiday, um dos coordenadores do MBL, tem 19 anos. Estudante de um curso pré-vestibular, ele veio de São Paulo a contragosto dos pais para lutar pelos ideais do movimento. Ele começou um curso de filosofia, mas desistiu e quer estudar história. Ele aderiu ao MBL em janeiro. Além de defender o impeachment de Dilma, ele cobra a saída de Cunha da Presidência da Câmara. ;Passo 24 horas do meu dia aqui. Grande parte dos acampados deixou o emprego, outros revezam e há um grupo permanente;, explica.
Unidos pelo impeachment
Desde outubro, metade do gramado em frente ao Congresso é ocupada por manifestantes que pedem o impedimento da presidente Dilma Rousseff. Saiba mais como funcionam os grupos:
Na parte mais próxima ao espelho d;água
Integrantes do Movimento Brasil Livre (MBL) chegaram ao local em 21 de outubro, com a intenção de ficar lá até que houvesse uma resposta sobre a análise dos pedidos de impeachment. Na parte mais próxima ao Congresso já houve 70 barracas, segundo os organizadores. Hoje, há menos de 30 integrantes do movimento e de outros grupos simpatizantes.
O que querem?
O impeachment da presidente Dilma Rousseff
Como comem?
Uma cozinha foi improvisada embaixo de uma tenda para dar conta da alimentação dos acampados. Por lá, eles cozinham de tudo, mas comem muito macarrão instantâneo
Como conseguem os alimentos?
Segundo os organizadores, não há doações de partidos, mas de integrantes de legendas da oposição. Maria Lúcia Bicudo, filha de um dos autores de um pedido de impeachment, é uma das que auxiliam o movimento. Mantimentos também são comprados com o dinheiro arrecadado pelo grupo com a venda de itens do MBL em uma loja on-line
Banheiro?
Há cerca de 20 banheiros químicos no local
Como tomam banho?
No Parque da Cidade ou em casa de moradores de Brasília
Como se mantêm?
Por meio de doações
Luz?
Há um gerador na tenda para garantir luz à noite e a possibilidade de carregar os celulares
Mais acima, na maior parte do gramado
Integrantes do Movimento Resistência Popular chegaram ao local no dia 28. Lá, montaram uma grande tenda. Há integrantes do grupo Revoltados On-line e outros em cerca 50 barracas, ocupadas por pessoas de diversos estados.
O que querem?
O impeachment da presidente Dilma Rousseff
Como comem?
Há uma cozinha improvisada e uma pequena churrasqueira no local. Os alimentos são doados ou comprados com o dinheiro arrecadado por meio da venda de itens na loja on-line do grupo.
Como se mantêm?
Por meio de doações
Banheiro?
Há cerca de 20 banheiros químicos no local
Como tomam banho?
No Parque da Cidade ou em casa de moradores de Brasília
No gramado da Esplanada dos Ministérios, atrás dos mastros da Alameda dos Estados
Os primeiros integrantes do Movimento Patriota Nacional, chamados pelos outros de intervencionistas, chegaram ao local em março deste ano. Desde então, o grupo tem reunido simpatizantes. Há cerca de 50 barracas no local. Compõem o movimento a Cruzada pela Liberdade, a União Patriótica Nacional e a Intervenção Popular Maranhão.
O que querem?
O impeachment da presidente Dilma Rousseff, a convocação de novas eleições e um governo militar
Como comem?
Há uma cozinha improvisada no local
Como se mantêm?
Por meio de doações
Banheiro?
Usavam os dos ministérios ao redor, mas foram proibidos. Há espécies de penicos improvisados. Algumas mulheres compraram fraldas descartáveis
Como tomam banho?
Em casa de moradores de Brasília
O acampamento em frente ao Congresso é ilegal?
Há uma norma do Congresso que impede acampamentos em frente ao parlamento. O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), porém, concedeu autorização para os integrantes do MBL ficarem no local. Por isso, só foi possível ocupar metade da área, já que o uso da outra parte foi proibido pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL)