Eduardo Militão
postado em 16/01/2016 09:50
A possibilidade de parlamentares investigados na Operação Lava-Jato perderem os mandatos, agora ou no futuro, está longe de um consenso entre juristas. Os sete congressistas denunciados até agora pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, estão nesta situação. O Ministério Público pediu o afastamento imediato do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), do cargo de deputado, usando uma mudança na lei feita em 2011. Quanto aos deputados Nelson Meurer (PP-SC), Vander Loubet (PT-MS) e Arthur Lira (PP-AL) e ao senadores Benedito Lira (PP-AL), Delcídio do Amaral (PT-MS) e Fernando Collor (PTB-AL), Janot defende que eles percam o cargo apenas após a condenação pelo Supremo Tribunal Federal. Em todos os casos, a Corte não recebeu as acusações para transformar os inquéritos em ações penais e começar o processo judicial.Especialistas concordam que o afastamento de um presidente de Casa Legislativa dessa envergadura política é inédito na história brasileira. Mas, para uns, é constitucional tirar Cunha do cargo já. Para outros, seria precipitação. Ao mesmo tempo, a perda do mandato dos demais parlamentares em caso de condenação não está garantida. Isso porque há episódios contraditórios e ainda confusos envolvendo os congressistas condenados do mensalão e o deputado Natan Donadon (PMDB-RO), preso até hoje por desvio de dinheiro.
O ex-presidente do STF Carlos Ayres Britto estuda o tema há seis meses e entende que é preciso separar os dois tipos de casos. De acordo com os argumentos enviados por Janot ao Supremo, Cunha usava a função de congressista e presidente da Câmara para atrasar os processos contra ele tanto no Judiciário quanto na Casa, onde é alvo de investigação por quebra de decoro parlamentar, o que pode lhe custar o mandato. E o Código de Processo Penal (CPP) prevê a suspensão do cargo nessas circunstâncias.
Ayres Britto lembra que a Constituição converge para esse pensamento porque permite afastar até a presidente da República antes de se concluir um processo de impeachment ; como o sofrido por Dilma Rousseff. ;O presidente da Câmara não é chefe de Poder;, frisou Ayres Britto ao Correio. ;E o chefe do Poder maior, que é o presidente da República pode, no curso do processo, com a abertura do processo ser afastado. É o espírito do (artigo) 319 (do Código de Processo Penal).;
Sem sentido
No caso de Meurer, Loubet, Artur e Benedito Lira, Ayres Britto entende que não há polêmica. A lei e a Constituição permitem que os deputados percam os cargos no fim do processo, quando condenados e não couberem mais recursos, o chamado ;trânsito em julgado; da ação. Nem todos, no entanto, pensam assim.
Mestre em direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, o professor Luiz Tarcísio Teixeira Ferreira acredita que os demais parlamentares devem perder seus mandatos como o STF já definiu no caso do mensalão: imediatamente. Mas ele destaca que a Câmara não cumpriu a ordem do tribunal à época e ficou adiando uma definição. Demorou tanto que houve a ordem de prisão dos deputados em novembro de 2013, episódio que forçou os próprios parlamentares a renunciaram aos cargos, e fez o assunto perder o sentido naquele momento.
No caso do deputado Natan Donadon, em 2010, o Supremo não determinou a perda imediata do mandato. Em 2013, quando ele foi preso pela Polícia Federal por ordem da corte, é que os parlamentares julgaram-no duas vezes. Na primeira, mantiveram o mandato. Na segunda, cassaram. O advogado criminalista Ticiano Figueiredo entende que o Supremo pode mudar de entendimento em uma eventual condenação na Lava-Jato. ;O entendimento para o Natan foi um; posteriormente o Supremo entendeu de maneira diversa para o mensalão e agora temos que ver se o Supremo vai manter esse entendimento ou, diante da nova composição, adotará nova postura diante desses fatos.;
Perplexidade
Reservadamente, um advogado da Lava-Jato entende que há muita discussão a ser feita. Para ele, sequer se sabe quem deverá julgar o afastamento imediato de Cunha, se o relator, Teori Zavascki, ou se a 2; Turma do STF, com cinco ministros, ou se o plenário da corte. Ele destaca que afastamento assim só costumam atingir prefeitos e vereadores, nunca senadores e deputados.
Para Ticiano Figueiredo, Janot deveria ser mais cauteloso e só pedir o afastamento de parlamentares no fim dos processos. Ele entende que o Ministério Público faz pressão no Judiciário. ;Causa perplexidade a maneira como o procurador-geral pede medidas extremas que deveriam se adotadas, se fosse o caso, apenas na condenação;, disse ele. ;Ele pede ao Judiciário que antecipe as medidas sem juízo definitivo de culpa, mas simplesmente em função do cargo que determinado investigado ocupa.;
Tarcísio Ferreira concorda com a legalidade do afastamento, mas apenas do cargo de presidente da Câmara, e não de deputado. ;É um absurdo ele (Eduardo Cunha) ser investigado pela Procuradoria-Geral da República e pelo parlamento, e continuar presidente da Câmara;, avaliou o jurista.