Um manifesto online, assinado por 51 acadêmicos especializados em estudos sobre o Brasil em universidades estrangeiras, diz que a democracia brasileira encontra-se ;seriamente ameaçada; pelo atual clima político. O documento, que convoca intelectuais estrangeiros a aderirem ao texto, já recebeu mais de mil subscrições até a manhã de hoje (28), desde que foi lançado, há quatro dias.
[SAIBAMAIS]Idealizado pelo historiador James Green, da Universidade Brown, em Rhode Island, nos Estados Unidos, e o sociólogo brasileiro Renan Quinalha, pesquisador convidado na Brown, o manifesto reconhece a legitimidade e a necessidade do combate à corrupção por meio de inquéritos como os da Operação Lava Jato, mas acusa o que seriam abusos na condução da investigação e afirma que ;setores do judiciário, com o apoio de interesses da grande imprensa, têm se tornado protagonistas em prejudicar o Estado de Direito;.
;Tomamos a iniciativa de organizar esse abaixo-assinado por conta da grave situação política que o Brasil atravessa hoje. Recebemos uma chamada de acadêmicos brasileiros pedindo solidariedade na defesa da democracia e atendemos prontamente a esse chamado;, disse Green, por email, à Agência Brasil. ;Nossa intenção foi somar a comunidade acadêmica internacional às diversas iniciativas que estão se proliferando pelo Brasil.;
Green é autor dos livros Além do Carnaval ; A Homossexualidade Masculina no Brasil do Séc. XX (Unesp, 2000) e Apesar de Vocês ; Oposição à Ditadura Brasileira nos Estados Unidos, 1964-1985 (Companhia das Letras, 2009), que analisa as relações Brasil-EUA no período e conta a história de pessoas que combateram o regime militar brasileiro a partir do país norte-americano.
O texto é assinado, entre outros, por brasilianistas como Barbara Weinstein (New York University), autora de diversos livros sobre o Brasil pós-colonial; Elizabeth Leeds (Massachussets Institute of Technology ; MIT), que é também cofundadora e presidente de honra do Fórum Brasileiro de Segurança Pública; e Jean Hébrard, professor na Ecóle de Hautes Études en Sciences Sociales, em Paris. Assinam ainda intelectuais brasileiros que no momento atuam fora do país, como o especialista em literatura brasileira Pedro Meira Monteiro, que leciona na Universidade Princeton, em Nova Jersey, nos Estados Unidos, e o historiador Sidney Chalhoub, professor convidado na Universidade Harvard, em Massachussets (EUA).
Impeachment
No manifesto, os acadêmicos enxergam um sério risco de que a retórica contra a corrupção esteja sendo usada para desestabilizar um governo democraticamente eleito, citando que o mesmo expediente fora utilizado antes da queda do ex-presidente João Goulart (1964), dando espaço à ditadura militar subsequente. À Agência Brasil, Barbara Weinstein criticou o processo de impeachment em curso no Congresso.
;Caso surjam evidências de algo mais sério do que ;contabilidade criativa;, ou se você puder encontrar uma maioria de dois terços da Câmara dos Deputados que se acredite nunca ter cometido qualquer ato que possa ser descrito como ;corrupto; ou ;desonesto;, então talvez eu possa considerar legítimo que eles decidam se Dilma permanece no cargo ou é impedida;, disse Weinstein. ;Acho muito improvável.;
Para Chalhoub, um dos historiadores brasileiros de maior projeção internacional, ;o processo de impeachment tem bases muito frágeis, como já mostraram vários juristas. E está sendo conduzido por parlamentares sobre os quais pesam acusações de gravidade ímpar. Destituir uma presidenta desse modo fragiliza a democracia, é um golpe contra ela, traduz apenas o inconformismo dos derrotados nas eleições de 2014. Esse é um momento decisivo da democracia brasileira;, disse ele à Agência Brasil. Dos mais de mil subscritos no abaixo-assinado disponível no site Avaaz, grande parte é composta por acadêmicos do México e da Argentina, mas há intelectuais de países diversos, como África do Sul, Índia, Japão e Turquia.