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Politica

Porta-voz da perplexidade

Porta-voz da perplexidade

;É tempo de partido/De homens partidos;. (;) ;Calo-me, espero, decifro/As coisas talvez melhorem/São tão fortes as coisas/Mas eu não sou as coisas e me revolto;, escreveu Carlos Drummond de Andrade em Nosso tempo. O poema ganhou uma insuspeitada atualidade em face da polarização ideológica que divide o país e torna qualquer tentativa de diálogo uma relação potencialmente explosiva. Os ânimos estão exacerbados. Há uma dificuldade enorme de ouvir o outro.

Já fui chamado de ;direitista;, ;esquerdista;, ;golpista; e ;petista;. Não sou nem quero ser porta-voz de nenhum partido. Reservo-me o direito de ser independente. Não considero inapelavelmente certo ou desculpável tudo que a esquerda faz nem concordo com as limitações da direita.

No documentário O Sol ; Caminhando contra o vento, dirigido por Tetê Moraes, sobre o jornal editado por Reynaldo Jardim, sobre a virada turbulenta dos anos 1960, de revoluções por minuto, existem duas trilhas sonoras: Pra não dizer que não falei de flores, de Geraldo Vandré; e Alegria, alegria, de Caetano Veloso. Vandré representava a disciplina da esquerda clássica, com suas certezas inapeláveis na revolução. Já Caetano se identificava com o campo progressista, mas não conseguia acreditar nas supostas verdades do movimento. Naquela época, ficava com a postura anárquica de Caetano, caminhando contra o vento, sem lenço e sem documento.

Ninguém sabe qual a melhor saída para a crise a esta altura dos acontecimentos. Tomo posição, mas me recuso a aderir aos fundamentalismos. Não aceito o argumento dos petistas de que ;todos roubam, por quê só prendem os líderes do PT?;. Também refuto as alegações de alguns adversários do PT. Assisti a um debate de tevê em que um sociólogo badalado afirmou, a certa altura, que justiça social era uma ;maçaroca ideológica sem o menor sentido;.

Os integrantes da roda de debates ficaram embasbacados como se ele tivesse dito algo inteligentíssimo. Discrepo, como diria Antonio Houaiss. Sem justiça social, sem saneamento, sem educação de qualidade e sem trabalho, todos serão atingidos pela violência, por epidemias, pela ignorância e pela estagnação do desenvolvimento.

Existem indícios de que Temer tentará destruir a Operação Lava-Jato, a pretexto de restituir a ordem do direito. Já circulam notícias de que o preferido de Temer para ocupar o cargo de ministro da Justiça é o criminalista Antonio Claudio Mariz de Oliveira, que assinou o manifesto dos advogados contra a Operação Lava-Jato, publicado nos principais jornais do país.

Em face desse quadro tão delicado, em meio a uma recessão econômica, como exigir alinhamento compulsório a Dilma ou a Temer? Humildemente, declaro que sou porta-voz apenas das minhas indignações, incertezas, dúvidas e perplexidades.