Leonardo Cavalcanti, Helena Mader, Ana Maria Campos
postado em 04/09/2016 08:01
O governador Rodrigo Rollemberg se impôs um isolamento político na discussão sobre o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Desde que o processo foi aberto na Câmara, ele evitou se posicionar sobre a cassação. Hoje, após a conclusão, Rollemberg se sente à vontade para comentar o episódio, que classifica como ;doloroso; ; apesar de rejeitar duramente o discurso de golpe. Para o governador, a opção de silenciar foi acertada. ;Se eu tivesse, em algum momento, tomado qualquer posição, isso contribuiria para a radicalização em Brasília e comprometeria a segurança;, justifica.
Com a efetivação do presidente Michel Temer, Rollemberg busca estreitar as relações para avançar em negociações importantes para o Distrito Federal, como a correção dos valores repassados anualmente para o Fundo Constitucional. ;O presidente Temer tem sido atencioso. Tenho convicção de que, daqui para frente, esse relacionamento institucional só se ampliará.;
Em entrevista ao Correio, Rollemberg analisou os maiores desafios do presidente, defendeu o ajuste fiscal e a revisão das regras da Previdência. O governador falou ainda sobre as crises mais recentes enfrentadas no DF, como a negociação com a Polícia Civil e a Operação Drácon, que atingiu a cúpula da Câmara Legislativa.
O Brasil está melhor ou pior depois do impeachment?
O Brasil superou uma fase que precisava superar. O momento é de união e de olhar para frente. Nós temos inúmeros problemas e desafios e a agenda do Brasil, neste momento, é a da retomada do desenvolvimento. Só vamos conseguir isso com união, espírito público, deixando interesses pessoais e partidários em segundo plano.
Defensores da ex-presidente Dilma Rousseff insistem na tese de golpe. Qual a sua opinião sobre isso?
Não considero que tenha havido um golpe. Nós tivemos um processo político, doloroso, comandado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal. Acho que a história vai julgar os fatos, quando a gente tiver uma distância maior do que temos hoje, vai julgar do ponto de vista político, mas nós temos as instituições, no Brasil, funcionando normalmente. O grande desafio agora é construir a agenda do desenvolvimento.
Por que o senhor não tomou partido durante o processo?
Eu tomei uma decisão, que considero absolutamente correta, como governador de Brasília, de garantir que as manifestações e o processo pudessem ocorrer com tranquilidade e segurança. Considero que essa postura foi vitoriosa. Se eu tivesse, em algum momento, tomado qualquer posição, isso contribuiria para a radicalização em Brasília e comprometeria a segurança. Nós tomamos uma medida de fazer o que chamamos de corredores da democracia, permitindo que as pessoas pudessem se manifestar livremente e chegamos ao fim desse processo sem nenhum incidente grave.
Para Brasília, em termos de negociação política e busca de recursos, que diferença faz?
O presidente Michel Temer tem sido muito atencioso com o Distrito Federal. Eu tive a oportunidade de estar com ele, pelo menos, três vezes, sozinho, outras vezes, com os governadores, e o presidente tem demonstrado atenção especial. Tenho convicção de que, daqui para frente, esse relacionamento institucional só se ampliará.
Em uma dessas reuniões, houve um mal-entendido. O senhor declarou que o Planalto analisaria um pedido do governo para ajudar na concessão do reajuste da Polícia Civil, e o presidente posteriormente negou. Esse episódio foi superado?
Em relação ao presidente Michel Temer, não houve mal-entendido algum, tanto é que, no mesmo dia, o presidente fez questão de me telefonar para esclarecer que, de forma alguma, tinha pensando aquilo. Tenho compreensão das dificuldades do governo federal, ele tem compreensão dos problemas do Distrito Federal e de outras unidades da Federação. E o que percebo é uma vontade de construir juntos alternativas para melhorar o ambiente político e econômico.
O ex-vice-governador Tadeu Filippelli, um dos principais assessores de Temer, tem pretensões de concorrer ao governo. Isso pode comprometer as relações?
Este momento exige de todos muito espírito público, exatamente para que possamos, unidos, enfrentar os problemas do país. Eu não vejo no Filippelli um político da tese do quanto pior, melhor. Se precisar contar com o apoio dele, não tenho dificuldade de dialogar com ninguém para o bem de Brasília.
Temer, logo na primeira aparição pública, reclamou da base e do PMDB. Da sua experiência como parlamentar, é possível confiar e ter fidelidade desse grupo hoje?
O presidente Temer foi parlamentar por muitos anos, foi presidente da Câmara dos Deputados e, se tem uma característica que podemos identificar nele, é uma habilidade muito grande no trato político. Portanto, tenho a impressão de que isso facilitará muito a relação com o Congresso. E essa era uma dificuldade que a gente percebia na presidente Dilma.
O Senado quis fazer um ;morde e assopra; com a presidente Dilma?
Sem dúvida. Foi uma forma de atenuar uma posição. Mas não me cabe comentar uma decisão do Senado, tomada soberanamente, em uma sessão presidida pelo presidente do Supremo.
Tem expectativas de que o governo federal corrigirá o valor do repasse do Fundo Constitucional?
Quando o Fundo Constitucional foi criado, no Distrito Federal, em 2003, ele custeava a totalidade das despesas da segurança, da educação e da saúde. E o fundo, no nosso entendimento, é do Distrito Federal. Mas hoje temos que completar os orçamentos da educação e saúde com R$ 8,3 bilhões de recursos próprios. E todo recurso não utilizado pelo fundo no fim do ano é recolhido para o Tesouro Nacional. Nós estamos discutindo esse tema, no âmbito do Tribunal de Contas da União, porque entendemos que esses recursos são do Distrito Federal e é importante que eles permaneçam no fundo.
Qual o papel do Fórum de Governadores nesta nova presidência?
Papel muito importante de construir uma agenda positiva para o Brasil. E a agenda positiva é da recuperação, da retomada do crescimento econômico. Vamos ter uma reunião em 12 de setembro, todos estarão aqui por ocasião da posse da ministra Cármen Lúcia.
De que forma o desfecho do impeachment e a efetivação no cargo mudam a atuação de Temer?
É claro que, enquanto transitório, o então vice-presidente Temer tinha limitações de definições, de atitudes, de ações. A partir de agora, ele é o presidente da República. Cabe a ele tomar as medidas necessárias e definitivas para o controle do gasto, para a retomada do desenvolvimento. Por outro lado, tem uma sinalização muito clara para o mercado de que nós viramos uma página da história. Eu sempre disse que, nesse processo, o fundamental era virar essa página para que o Brasil pudesse começar a olhar para a frente.
Ajuda na retomada econômica?
Tenho a impressão de que sim. Nós já começamos, aqui em Brasília, a colher resultados positivos na economia. Tivemos, no mês de julho, uma redução de 4 mil desempregados em relação ao mês anterior. O número ainda é elevado, mas houve uma redução importante. E, pelo segundo mês consecutivo, tivemos a criação de duas mil vagas na construção civil. Dos quase 13 mil documentos de Habite-se que tínhamos pendentes quando assumimos o governo, 9 mil já foram liberados. Fizemos uma reformulação na Central de Aprovação de Projetos, duplicamos o número de técnicos.
Quais os erros que Temer não pode cometer e o que deve ser priorizado?
A falta de diálogo foi uma das coisas que comprometeram a gestão da presidente Dilma. Nesse sentido, Temer é muito habilidoso. Por outro lado, é tomar as medidas necessárias para o equilíbrio financeiro da União. Medidas duras, mas necessárias. O ajuste fiscal é importante. Temos, sim, que controlar o gasto com pessoal, o gasto com custeio, para que o país possa, cada vez mais, ter um volume maior de recursos para investimentos. Nesse sentido, a renegociação com os estados é muito importante porque a economia acontece nos municípios e nos estados. A Previdência tem de ser enfrentada e é muito importante que esse debate seja feito de forma transparente, com serenidade e profundidade. E as pessoas têm de perceber que, se não houver reforma, a própria aposentadoria dos servidores públicos ficará comprometida. Eu tenho feito esse debate com os sindicatos, inclusive por causa do debate das organizações sociais. Hoje, os sindicatos precisam ter uma visão mais holística em relação ao problema do gasto com pessoal, porque, senão, isso inviabilizará o próprio setor público.
O senhor falou das organizações sociais, um projeto polêmico. Com essa nova configuração da Câmara
Legislativa, será mais fácil negociar a aprovação?
Na medida em que o debate avança, com honestidade, lealdade, as pessoas se convencem da necessidade das organizações sociais. Eu tenho feito rodas de conversa e faço a pergunta: quem está satisfeito com o modelo de saúde? Nós temos organizações sociais de muito boa qualidade, como o Icipe, que dirige o Hospital da Criança. É um atendimento gratuito, que presta contas mensalmente dos recursos recebidos e só recebe pelos procedimentos realizados. Qual é o problema de ampliarmos isso nas Unidades de Pronto Atendimento? Que hoje, no modelo atual, não conseguem oferecer o serviço de que a população precisa. Portanto, a gente faz esse debate, com honestidade, sinceridade e franqueza, e mostrando ao servidor que ele não vai ter prejuízo algum, pelo contrário, vai melhorar as condições de trabalho porque terá mais gente para ajudá-lo.
O senhor tem sido muito pressionado, pelas polícias, pelo pagamento do reajuste paritário com a Polícia
Federal. Como superar isso?
É um desafio que está colocado e reconheço a legitimidade dos policiais civis de pleitearem a isonomia, mas é muito importante a transparência dos números para que as pessoas possam perceber a realidade em que estamos. A última vez em que o Brasil viveu dois anos de recessão ou de depressão econômica foi em 1930. A realidade é que temos ainda R$ 1,2 bilhão de dívidas do governo passado. E precisamos de mais R$ 1 bilhão para fechar este ano, para não entrar com o orçamento do ano que vem comprometido. É esse o ambiente que temos para negociar qualquer reivindicação salarial.
As projeções da Fazenda levam em conta uma possível proposta de aumento para a Polícia Militar e para os Bombeiros também?
Embora o termo adequado não seja isonomia, é claro que, se a gente der o aumento para a Polícia Civil, vai despertar a reivindicação da Polícia Militar. Não dá para acharmos que a Polícia Civil será um mundo isolado. Isso, sem dúvida, aumenta a dificuldade.
Há um clima muito forte de rivalidade entre policiais civis e militares. Como é que se resolve isso?
Com bom senso e instrumentos legais. O nosso entendimento é de que essas são manifestações isoladas que devem ser identificadas e punidas. E, para isso, temos o Ministério Público, para evitar qualquer exagero de parte a parte.
Sobre a crise na Câmara, como o senhor avalia a postura de deputados que querem colocar no colo do governo o escândalo? A Celina Leão atribuiu ao senhor a responsabilidade pela divulgação.
Os fatos são muito claros e o Ministério Público está investigando. Tudo ficará muito claro ao fim das investigações.
O senhor tem algum palpite do que levou a deputada Liliane Roriz a gravar essas pessoas e entregar as fitas na investigação?
Não tenho a menor ideia.
O senhor se surpreendeu?
Sim, não só a mim, mas deve ter surpreendido a maioria dos parlamentares, tanto as gravações, como a divulgação das investigações.
Arrepende-se de ter apoiado a candidatura à presidência da Celina?
Não. Naquele momento era o nome que tinha condições de presidir a Câmara. É importante registrar que a Câmara Legislativa teve uma postura muito colaborativa com o governo no primeiro ano e nós temos a expectativa de que, nestes quatro meses, a Câmara continue dando uma contribuição significativa a Brasília, não é ao governo, é para a cidade.
Essa crise na Saúde, em relação às investigações, surgiu porque a Câmara criou uma CPI que deslanchou com as gravações da Marli Rodrigues, do SindSaúde, inclusive do seu vice. Como está a relação com ele hoje?
É uma relação fria. As gravações revelam, no mínimo, muito pouco compromisso com o governo.
Então, em uma possível candidatura, o senhor escolheria outro vice?
Olha, a eleição está tão longe e temos tantos desafios para enfrentar que, sinceramente, não estou pensando em eleição neste momento. Estou pensando em como chegar ao fim deste ano, que será um ano muito difícil em função das dificuldades orçamentárias e financeiras. Acho que o ano que vem tem tudo para ser melhor, nós temos alguns investimentos importantes que estão acontecendo e vão mudar a vida da nossa população.
O senador Hélio José, seu suplente no Senado, está constrangendo o DF com essa história de ;contratar até melancia;?
É importante deixar claro que a escolha do suplente do Senado não foi uma escolha minha. Foi uma escolha do PT na ocasião. Mas não é uma postura conveniente a um senador da República
E a escolha do vice foi sua?
Foi do PSD.
Voltando para a crise na Câmara Legislativa. O senhor teme que Liliane Roriz tenha te gravado?
Não, absolutamente. Não tenho a menor preocupação.
O senhor acha que, por ter deputados investigados e que ; embora afastados ; continuam na Câmara influenciando, a CPI da Saúde perdeu a legitimidade, o foco?
Eu acho que a CPI da Saúde poderia prestar um grande serviço ao governo do DF se ela fizesse uma investigação profunda e isenta sobre os processos que podem ser melhorados, porque este é o grande desafio da Saúde. Fazer uma CPI para uma área tão delicada e sensível com o objetivo de se fazer enfrentamento político é um desserviço à população.
Os delegados e agentes de segurança pública colocaram os cargos à disposição e estão cobrando que a decisão seja publicada no Diário Oficial. O senhor vai exonerar todo mundo?
Brasília é reconhecida por ter as melhores instituições de segurança pública. Eu não acredito que profissionais como delegados e agentes vão perder essa imagem de melhor polícia do Brasil por uma questão salarial. Essa questão, nós resolvemos com diálogo e, se não for possível resolver agora, poderá ser possível mais na frente.
E o Eric Seba fica no comando?
O Eric Seba é um excelente profissional, uma pessoa comprometida com a instituição e com a cidade e tem demonstrado uma lealdade muito grande. A sua permanência seria uma garantia de manutenção dessa qualidade.
Em outubro, está previsto que o governo pague o reajuste salarial de 32 categorias. Ele será pago?
Estamos trabalhando fortemente, buscando aumentar nossa arrecadação e construir alternativas que possam garantir o pagamento dos aumentos.
O orçamento do DF é usado quase integralmente para pagar salários. Como é gerir essa situação?
Essa é uma reflexão que o Brasil precisa fazer. A população tem que saber que, ao aumentar os gastos com o pessoal, uma parcela muito grande da população, que não é servidora pública, acaba pagando por isso, por meio de impostos, de taxas, porque o dinheiro não dá em árvores. Ao mesmo tempo, se não tivermos recursos suficientes para um custeio adequado, vai faltar medicamento, equipamento, vão faltar recursos para alimentação hospitalar, para a limpeza pública, para o custeio do transporte público. Por outro lado, precisamos ter investimentos. O que desenvolve uma cidade, um país, é o desenvolvimento. A população precisa participar desse debate.
O governo conduzia uma grande operação de derrubada de casas em condomínios ilegais no Altiplano Leste, mas a Justiça suspendeu. Qual a sua opinião sobre isso?
Estamos utilizando os mesmos critérios que adotamos no Sol Nascente para outras regiões, como o Altiplano Leste e a Orla do Lago. Devemos dar um basta à cultura de ocupação irregular e grilagem de terras públicas. Definimos o critério de fazer a desocupação nas áreas que foram construídas recentemente ou destinadas a equipamentos públicos. Apesar de todas as recomendações do Ministério Público, as pessoas continuam vendendo lotes naquela área e, por isso, fomos obrigados a agir por determinação judicial. A mesma coisa, eu digo do Lago Sul, vai ser um salto civilizatório para Brasília abrir a Orla do Lago para toda a população. Há duas coisas no Distrito Federal que vamos fazer no nosso governo: a desocupação e abertura ordenada da Orla do Lago e o fechamento do lixão juntamente com a incorporação das centrais de triagem e dos catadores de material reciclável de forma digna ao processo de produção e separação dos resíduos sólidos.