Agência Estado
postado em 28/09/2016 08:44
Um grupo de 30 homens recolheu, na madrugada de terça-feira (27/9) suplementos do jornal Extra e exemplares do jornal O Fluminense no depósito de distribuição, no centro de Niterói, na Região Metropolitana do Rio.As publicações traziam reportagem sobre denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra Eduardo Gordo, ex-presidente da Câmara Municipal de São Gonçalo (cidade vizinha a Niterói) e candidato a vereador pelo PMDB. Ele é acusado de participar de um esquema de fraudes que desviou R$ 35 milhões do Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo a denúncia, Gordo teria recebido R$ 57 mil de propina em três ocasiões.
Os homens chegaram ao centro de distribuição às 3 horas e perguntaram pelo "jornal com a matéria do Gordo". Eles queriam comprar todos os exemplares. No caso do Extra, a reportagem foi publicada em suplemento que circula em São Gonçalo e não pode ser vendido separadamente. Mesmo assim os homens fizeram questão de pagar pelos suplementos. Eles também seguiram os caminhões que já haviam deixado o depósito, a fim de recolher os exemplares. "Eles quiseram dar aparência legal ao recolhimento. Impediram a distribuição regular do Extra, levando todos os suplementos que não estavam à venda. Impediram a circulação da notícia", disse o diretor de Redação do Extra, Octavio Guedes.
[SAIBAMAIS]O Fluminense chegou a distribuir jornais para assinantes, mas a edição não circulou em Niterói e São Gonçalo. "O Fluminense nunca havia sido alvo desse tipo de ação orquestrada. Havia a clara intenção de que o jornal não circulasse, o que para a gente demonstra que foi um atentado contra os preceitos constitucionais de liberdade de imprensa", afirmou a diretora de Jornalismo Multimídia do Grupo Fluminense, Liliane Souzella. A edição digital do jornal, restrita aos assinantes, foi aberta a todos os internautas.
Associações. O recolhimento dos exemplares foi criticado pela Associação Nacional de Jornais (ANJ), pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI). A ANJ classificou o episódio como "atitude violenta e antidemocrática". "A inconformidade diante da missão da imprensa e o recurso a ações típicas do crime organizado são incompatíveis com a convivência democrática, pois sonegam à sociedade o direito de fazer opções políticas informadas", afirmou o vice-presidente da ANJ, Francisco Mesquita Neto.
Em nota, a Abraji repudiou o episódio. "Recolher o jornal não muda os fatos e constitui crime contra a liberdade de imprensa. A população de São Gonçalo tem o direito de conhecer seus candidatos", diz o texto. O presidente da ABI, Domingos Meirelles, qualificou o episódio como "deplorável e alarmante" e pede que o caso seja investigado
Gordo não retornou aos contatos do jornal O Estado de S. Paulo. A defesa do candidato se negou a dar entrevista. O candidato postou um vídeo em seu perfil no Facebook, cercado pela mulher, filhos e netos, em que se diz perseguido por adversários políticos. "Será que de quatro em quatro anos, com minha trajetória política, eu sou bandido, eu sou traficante, eu sou miliciano, eu sou ladrão? Por que só de quatro em quatro anos?", questiona. Internautas reagiram ao recolhimento dos jornais. "Parabéns ao grupo que conseguiu dar mais divulgação ainda para a matéria", escreveu uma pessoa no perfil do candidato.