Eduardo Militão, Julia Chaib
postado em 25/11/2016 07:18
O ex-ministro da Cultura Marcelo Calero afirmou em depoimento à Polícia Federal que o presidente Michel Temer reclamou da decisão de órgão subordinado a ele de embargar obra em prédio em que o titular da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, tem um apartamento de luxo em construção. Temer ainda disse ter sido surpreendido com ;boatos; de que o ex-ministro teria pedido uma reunião para gravar o encontro.
De acordo com Calero, o presidente da República criticou a atuação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, encaminhou o depoimento do ex-ministro à Procuradoria-Geral da República, que poderá pedir ao STF a abertura de inquérito ou arquivamento das apurações.
[SAIBAMAIS]Segundo a Presidência da República, Temer teve duas conversas com Calero. O ex-ministro da Cultura afirma que o presidente o chamou para conversar no dia 17. ;Nesta reunião, o presidente disse ao depoente que a decisão do Iphan havia criado ;dificuldades operacionais; em seu gabinete;, afirmou Calero à Polícia Federal. A assessoria de Temer informa que ;boatos; indicam que, no dia 17, o ex-ministro solicitou reunião ;somente com o intuito de gravar clandestinamente conversa com o presidente da República para posterior divulgação;.
De acordo com a Presidência, Temer ;jamais induziu algum deles a tomar decisão que ferisse normas internas ou suas convicções;. ;Assim procedeu em relação ao ex-ministro da Cultura, que corretamente relatou estes fatos em entrevistas concedidas;, continuou.
Calero afirmou à PF que recebeu ;a mais contundente; das ligações de Geddel em 6 de novembro. No telefonema, o ministro disse ao colega que pediria a demissão da presidente do Iphan, caso não fosse atendido. Geddel nega a declaração. Além disso, Calero afirma que o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, pediu que o Iphan não se manifestasse sobre a obra porque a questão estava sendo decidida na Justiça. Em 16 de novembro, num jantar no Palácio da Alvorada com senadores, Temer teria dito ao então titular da Cultura para ficar ;tranquilo;, caso fosse procurado por Geddel.
No dia 17, quando a decisão do Iphan havia sido tomada, Padilha perguntou como Geddel poderia recorrer. No mesmo dia, Calero se disse ;convocado; por Temer, quando ouviu sobre as ;dificuldades operacionais; e da necessidade de encaminhar o caso à advogada-geral da União, Grace Mendonça. O presidente ainda falou, de acordo com o depoimento à PF, que ;a política tinha dessas coisas, esse tipo de pressão;.
Em 18 de novembro, o secretário-geral da Casa Civil, Gustavo Rocha, ligou para Calero pedindo o encaminhamento do caso para a AGU. O então ministro da Cultura disse que não faria isso porque já havia falado com Temer na véspera. Para Calero, aquele pedido demonstrava a ;insistência; do presidente da República em uma interferência indevida. Naquele mesmo dia, pediu demissão da pasta.
Eliseu Padilha afirmou que decidiu falar com Calero depois de ter tomado conhecimento da discussão que havia em torno do empreendimento e sugeriu ao ex-ministro que levasse o caso à AGU, por se tratar de órgão competente a buscar ;soluções; para questões jurídicas que concernem órgãos da administração pública. ;O ex-ministro ignorou a sugestão;, disse Padilha.
Em nota, o Palácio informou que o objetivo era ;solucionar impasse na sua equipe e evitar conflitos entre ministros de Estado;. Temer ;sempre endossou caminhos técnicos para solução de licenças em obras ou ações de governo;. Ele confirma a indicação da AGU para tratar do assunto com base no Decreto n; 7.392/10. A norma diz que a Advocacia-Geral da União deve ;identificar e propor soluções para as questões jurídicas relevantes existentes nos diversos órgãos da administração pública federal;. Temer diz que ;estranha; a declaração de Calero de que ele ;teria enquadrado ou pedido solução que não fosse técnica;.