Ana Dubeux
postado em 04/12/2016 15:36
Vamos analisar um dado bem simples. Dos 874 mil presos no Brasil, menos de 1% está lá porque roubou seu dinheiro, esse mesmo que você paga em impostos e espera ver aplicado em melhorias nos hospitais, nas escolas, nas estradas. Essas pessoas que deveriam estar presas, e não estão, usam essa verba para conhecer o mundo, hospedar-se nos hotéis mais caros, comer nos restaurantes cinco estrelas e viver uma vida que afronta os brasileiros que conhecem a mais triste miséria imposta por um país desigual.Desde a Lava-Jato, os corruptos ; políticos e empresários; começaram a ser presos. A operação, que desvendou o esquema de corrupção na Petrobras, já recuperou uma fortuna. Agora, quase R$ 7 bilhões podem retornar aos cofres públicos com a delação premiada dos mais de 70 membros da ;família Odebrecht;, que promete ser histórica. Gostem ou não dos promotores da força-tarefa e do juiz Sérgio Moro, achem ou não que, em algum momento, houve excessos, o fato é que a Lava-Jato impôs uma mudança numa realidade que reinava absoluta: a impunidade. É óbvio que a vingança viria a galope. E ela veio de maneira sórdida.
O Brasil ainda estava em choque com a trágica queda do avião da Chapecoense, emocionava-se com as homenagens no Brasil e na Colômbia, condoído com o mais triste episódio do esporte brasileiro, quando o Congresso Nacional ; sempre ele ; tramou, de forma ardilosa, na calada da noite, um golpe para desfigurar o projeto das 10 medidas contra a corrupção, resultado de uma vontade coletiva, chancelada por 2 milhões de brasileiros. Deputados decretaram ali, mais uma vez, sua intenção de manter inalterado o estado de coisas que sempre se impôs: aos corruptos, toda a honra e toda a glória da impunidade.
Renan Calheiros, o senador pendurado pelo STF, tentou apressar o trâmite e ajudar a referendar o conjunto de medidas que agora torna os promotores reféns de uma mordaça jamais vista. Não conseguiu, pelo menos por enquanto. Mas é provável, se a sociedade não der um grito de alerta e pressionar fortemente, que os políticos consigam aprovar uma lei que intimida, censura e limita a ação do Ministério Público.
Além do alcance do cidadão comum, o teor das medidas a serem analisadas agora pelo Senado é uma violência também contra os direitos humanos, pois afeta muitas rotinas de promotores. Não poder abrir inquérito sem a certeza da condenação, não poder falar sobre ações em curso, indenizar investigados não condenados... Isso inviabiliza qualquer investigação. Casos de violência doméstica, por exemplo. O anonimato garantido pelo Disque Denúncia, que já iniciou tantos inquéritos, também fica prejudicado.
Enfim, a tal iniciativa que pretende inibir abuso de autoridade, na verdade, pretende simplesmente limitar ; e muito ; qualquer investigação. Ou você acredita mesmo que os políticos que aprovam emendas dessa natureza em plena madrugada, com o país em choque, estão preocupados em garantir algo mais que não seja o seu próprio direito de seguirem leves e soltos, independentemente das arbitrariedades que cometam?