Politica

Opinião: excluir militares do texto da reforma é decisão política

"A ação dos militares é tentar preservar o que o próprio governo garantiu no texto enviado ao Congresso: a exclusão da turma de farda nas novas regras"

Leonardo Cavalcanti
postado em 06/02/2017 09:04
Minutos depois de sacramentadas as duas vitórias do governo nas eleições da Câmara e do Senado, integrantes do Planalto definiram que a Reforma da Previdência será aprovada ainda neste primeiro semestre. A partir do placar conquistado pelo deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) e pelo senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), os principais ministros de Michel Temer pareciam mais do que empolgados com a tramitação da proposta. Interlocutores no Executivo e no Legislativo, entretanto, apontam um cenário mais complexo para os governistas, que até podem mudar as regras de aposentadoria em seis meses, mas isso está longe de garantir o texto integral enviado ao Congresso no ano passado.

Na última semana, o Exército divulgou um informe contestando ;soluções simplistas, genéricas ou que contenham apenas o viés contabilista; em relação à Reforma da Previdência. A ação dos militares, nesse caso, é tentar preservar o que o próprio governo garantiu no texto enviado ao Congresso: a exclusão da turma de farda nas novas regras de aposentadoria. Os integrantes das Forças Armadas tentam se antecipar a um movimento interno de técnicos na Esplanada para mudar o projeto, incluindo, assim, a caserna nas mudanças por causa do receio fundamentado de que a exceção possa levar outras categorias de servidores a buscarem também o privilégio. A decisão de não mexer com os militares foi política, o que contrariou os técnicos responsáveis pelos cálculos previdenciários da proposta. E aqui temos o primeiro embate, que deve ser ampliado para além da força do governo entre os parlamentares, mas na própria relação com as categorias.

[SAIBAMAIS]No caso dos militares, diz a turma dos números, a brecha pode ser ampliada com argumentos meramente políticos, pois sabe-se que parte do governo decidiu preservar a categoria para não perder o apoio dos fardados no atual cenário dividido do país. Não é uma encrenca das menores. A Defesa tem um dos principais orçamentos da Esplanada, juntamente ao da Saúde, Educação e da própria Previdência. Gasta-se muito, mas gasta-se mal. Números apresentados em 2015 mostravam que pouco mais de 72% do dinheiro reservado para o ministério militar serviam para pagar pessoal. E não paramos por aqui, pois 15% do gasto ia para a máquina e menos de 12% para investimento ; do último percentual, a parte para pesquisa e desenvolvimento tecnológico é ainda menor. Em um mundo de combates virtuais, onde as Forças de outros países avançam, ficamos para trás.

Um mergulho mais profundo nos números da Defesa é ainda mais desestimulante. O total de gente na ativa nas três Forças ; Exército, Marinha e Aeronáutica ; chega a 342 mil. O número de inativos e pensionistas, entretanto, é de 364 mil. Por aí dá para ver o tamanho do problema quando se fala em preservar a tropa na mudança das regras de aposentadoria. A conta com inativos e pensionistas bate os R$ 34 bilhões. Tais cifras entraram no cálculo dos técnicos que ajudaram a montar o projeto de Reforma da Previdência, mas mesmo assim foram desconsideradas pelos políticos. O que pendeu na decisão foi o argumento dos militares de que a profissão tem peculiaridades por causa das atividades e da formação.

Na guerra interna na Esplanada, técnicos da Previdência entram no debate com argumentos de que boa parte do militares cumpre, hoje, funções administrativas e uma pequena parcela atua em operações efetivamente, com horas extras e esforço adicional para entrar em combate. Por fim, há gente ainda que defende uma divisão para a situação dos militares em tempos de guerra e de paz. Esse pessoal lembra que é possível, do ponto de vista legislativo, criar diferenciações para as Forças em caso de guerra. Com tal discussão instalada, vê-se que a divulgação do informe do Exército foi uma clara tentativa de reagir antes de o projeto ser alterado. Mas é improvável que o Planalto mude as regras, sendo mais realista acreditar nas alterações do Congresso para preservar outras categorias na reforma. O que pode desfigurar o texto inicial.

Assim, voltemos à euforia inicial do governo com as vitórias de Maia e Eunício. O prazo de seis meses pode até ser factível. O que vai sair do projeto no Congresso é outra história.

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