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Impopular e atolado em corrupção, Congresso relembra o Pacote de Abril

Em abril de 1977, o então presidente Ernesto Geisel optou por fechar o legislativo e baixar série de medidas conhecidas como o Pacote de Abril

Maiza Santos*, Matheus Teixeira - Especial para o Correio
postado em 04/04/2017 06:03
No governo Geisel, em abril de 1977, o Conselho de Segurança Nacional decidiu pelo recesso parlamentar: portas fechadas por duas semanas
Há 40 anos, o Congresso tinha as portas fechadas pela terceira vez no regime militar. O contexto político guarda algumas semelhanças com os dias atuais. Após o sucesso do "milagre econômico" de 1970, o Brasil mergulhava em uma crise financeira e o governo enfrentava dificuldades para aprovar reformas no Congresso Nacional. Era abril de 1977 e o então presidente da República, general Ernesto Geisel ; que havia ganhado a eleição indireta com a promessa de fazer a transição para a democracia ;, optou por fechar o Legislativo e baixar uma série de medidas chamadas depois de Pacote de Abril. O parlamento ficou sem poderes por duas semanas e voltou a trabalhar sob novas regras, que garantiam ao Executivo maior controle sobre as duas Casas.

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Os tempos da ditadura militar passaram. O Brasil recuperou a democracia, elegeu presidentes civis por meio do voto e voltou a conviver com a liberdade de expressão. O Congresso, no entanto, embora não corra mais o risco de ter as portas fechadas, tem demonstrado, na opinião de especialistas, pouca evolução em relação aos direitos que a Constituição Federal de 1988 devolveu à população. Atolado em denúncias, vive um dos momentos mais impopulares da história e discute, assim como naquela época, mudanças para a classe jurídica nacional por meio da Lei de Abuso de Autoridade. A gota d;água para a ditadura instituir um recesso ao Parlamento foi justamente a reprovação da reforma do Judiciário por parte dos senadores.

O fechamento do Legislativo, contudo, teve outros interesses. Após sofrer uma derrota nas eleições de 1974, quando o MDB levou 16 das 22 cadeiras no Senado em disputa, os militares da Arena estavam assustados com o pleito marcado para o ano seguinte, em 1978. Geisel, aquele que tinha prometido levar o Brasil de volta à democracia, tirou os poderes do Ato Institucional 5 (AI-5) da gaveta para se garantir no poder. O historiador da Universidade de Brasília (UnB) Antônio José Barbosa lembra como tudo aconteceu. ;Essa foi a forma que o regime encontrou de se manter firme. O AI-5 foi o instrumento jurídico mais forte do período militar, de 1964 a 1985. Com o Congresso fechado, o grande acontecimento foi a mudança drástica na Constituição;, explica.

O Congresso fechou as portas em outros dois momentos durante a ditadura: em 20 de outubro de 1966, após o plenário ser invadido por forças militares do governo Castello Branco, ação que durou até 22 de novembro do mesmo ano; e após decretado o AI-5, em 13 de dezembro de 1968, permanecendo fechado até 21 de outubro de 1969. O AI-5 permitia também a cassação de mandatos eletivos, suspensão dos direitos políticos de qualquer cidadão e intervenção em estados e municípios. Ao todo, 333 políticos tiveram direitos políticos suspensos naquele ano.

A reabertura, em 1969, não significou grandes mudanças. ;Aconteceu em um momento favorável para o regime, quando o país crescia economicamente, com taxas elevadas e contava com apoio da classe média. Até 1973, foi um Congresso manietado, impossibilitado de agir como poder Legislativo e o governo surfando no milagre econômico que era sustentado no endividamento externo e arrocho salarial. Esse milagre acabou com a crise do petróleo. Em 1974, começou a abertura do regime, veio a grande vitória. No Senado, das 22 cadeiras em jogo, a oposição conseguiu 16;, explica Barbosa. As medidas do pacote de abril só começaram a perder força em 1980, quando o Congresso aprovou emenda restabelecendo as eleições diretas para governador e acabando com a escolha indireta de senadores.

Participação popular

;Hoje, o Congresso, por pior que seja em termos de qualidade dos políticos, fomos nós que elegemos. A agenda de retrocessos que está aí é de acordo com o Executivo, grupos econômicos e com quem os colocou lá. Durante a ditadura, não, o regime elegeu um Congresso sem legitimidade;, avalia a cientista política da Universidade de São Paulo (USP) Maria do Socorro Souza Braga. Para a professora, o momento deve ser de participação popular. ;Temos um realinhamento de grupos com agendas conservadoras que irão afetar principalmente os mais humildes. O Congresso que está aí quer impor reformas impopulares. A solução seria ter plebiscitos para as pessoas se manifestarem. A outra solução seriam novas eleições para a população decidir se os mantém ou não no poder;.

Baseado no AI-5
Confira as principais medidas determinadas pelo então presidente da República, Ernesto Geisel:
; Eleições indiretas para governador.
; Eleições indiretas de um senador por estado. Os outros dois continuavam a ser eleitos por voto popular.
; Redução do quórum para aprovar emenda constitucional de dois terços para maioria simples.
; Ampliação das bancadas do Norte e Nordeste na Câmara dos Deputados, onde costumava ter vitórias eleitorais.
; Aumento do mandato do presidente, que seria eleito indiretamente em 1978, de cinco para seis anos.
; Extensão às eleições estaduais e federais da Lei Falcão, que restringia a propaganda eleitoral em rádio e televisão, criada em 1976, só para as eleições municipais.
; Instituições de sublegendas na eleição direta para senador, que permitiu aos partidos apresentarem mais de um candidato. Os votos dados às sublegendas eram somados e a totalidade era atribuída ao candidato mais votado.


*Estagiária sob supervisão de Natália Lambert

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