Denise Rothenburg, Paulo de Tarso Lyra
postado em 04/04/2017 08:15
Na posição de quem, daqui a 12 dias, assumirá uma cadeira no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o advogado Admar Gonzaga avisa: ;O TSE não pode atuar de forma a gerar instabilidade política no país;. Para ele, para impugnar um mandato, só com provas, para ;proteger a vontade soberana do eleitor;. Ontem, ao receber o Correio em seu escritório de advocacia em Brasília, na véspera do início do julgamento que poderá cassar a chapa Dilma-Temer, ele foi direto ao mencionar o viés político da Justiça: ;todas as constituições e cortes supremas do mundo são fruto de um pacto político;.
O advogado, entretanto, evita falar do julgamento que começará hoje, porque, afinal, se o processo seguir além do dia 16, quando o ministro Henrique Neves deixar o mandato no TSE, será obrigado a proferir o seu voto. O futuro ministro diz que não há democracia partidária, que é contra a prisão preventiva prolongada e que não vê problemas na Lei de Abuso de Autoridade. A seguir os principais trechos da entrevista.
Como é assumir o TSE em um momento tão delicado?
Eu não posso escolher momento. Naturalmente, se eu pudesse escolher, seria em um ambiente de mais normalidade. Encaro com responsabilidade. Estou preparado se acontecer alguma intercorrência que impeça o encerramento do julgamento nesta semana.
É possível terminar tudo rapidamente?
Não é adequado se encerrar um processo dessa maneira. Eu defendo, inclusive, que o TSE deveria ter, em seu regimento, a figura do revisor. Daria uma segurança maior para o tribunal e para o relator. O revisor atuaria como juiz que está auxiliando o relator.
E a possibilidade de pedido de vista?
Creio que seja até mesmo uma questão de responsabilidade. E, nesse caso, poderia também haver antecipação de voto de algum magistrado.
O que a gente observa lá atrás é que, quando o processo foi aceito, foram três pedidos de vista.
O senhor imagina mais neste momento?
Vejo isso com um quê de responsabilidade dos julgadores. É um processo enorme, com vários elementos sigilosos.
Esse pedido de antecipação é usual?
Mas temos a situação de ministros que estão prestes a sair. Não é usual e não se tem isso como algo elegante. A não ser que tenha uma justificativa muito forte. Se você está saindo e já tem um juízo de valor formado, por que não vai apresentar?
Qual o tamanho da instabilidade política gerada por esse julgamento?
Estamos experimentando os efeitos dessa instabilidade política. Coloque-se no lugar de um empresário ou alguém que pretenda fazer um contrato com o poder público em um momento como este, os investidores que talvez queiram apostar no Brasil, gerar emprego. Todos temos essa responsabilidade. Naturalmente, em qualquer país que você tenha um impeachment, uma cassação judicial ou política, gera-se um efeito muito negativo.
O senhor foi um dos responsáveis jurídicos pela criação do PSD. Não abriu uma porteira para a multiplicação de legendas?
Não me preocupo muito com a questão do número de partidos. Precisamos de uma cláusula de desempenho. Nosso sistema presidencialista, quando demanda fazer reformas de ordem política, tem que negociar com todos esses partidos e correntes em que a gente não identifica a questão ideológica.
O Correio mostrou que o presidente do Pros usou o fundo partidário para proveito próprio. Tem alguma forma de coibir isso?
Se o Pros usa dinheiro público em benefício de ordem pessoal dos dirigentes, isso é improbidade. Isso se responde na Justiça eleitoral e comum. Há previsão que o registro desses partidos seja cassado.
O senhor defende a lista fechada?
O sistema de lista fechado é o melhor. Mas não vejo a lista fechada hoje como aquilo que a gente precisa. Isso é uma mudança de foco. Não temos tradição de lista fechada. Mas não dá para usar dinheiro público em lista aberta, porque você dilui a responsabilização. Temos também a questão de democracia partidária. Os partidos têm de ter democracia da porta para dentro. As convenções ou pré-campanhas têm de ser para valer. Senão, teremos lista fechada da pior maneira possível, quando os filiados só vão para bater palmas porque tudo foi resolvido em reuniões fechadas.
[SAIBAMAIS]
Pela primeira vez, o STF criminaliza o caixa um. Não é um risco?
O TSE não pode atuar a ponto de trazer instabilidade política para o país. É preciso dar muita ênfase à segurança política e à soberania popular. A ação de impugnação de mandato eletivo (AIME) é de índole constitucional. Ela diz que o mandato eletivo só poderá ser impugnado com provas. Prova não quer dizer suspeita, ouvir dizer. Respeitar a soberania popular, não para proteger corrupto. É para proteger o mandato como algo que é expressão da cidadania. Tem que trazer materialidade contra um mandato que foi constituído com outorga do eleitor. E tem que correr em segredo de Justiça, para proteger a imagem do mandatário.
Esse conceito de sigilo não anda meio frouxo ultimamente?
Depende de em que pescoço a corda está. Quando dá um problema com o vice, querem acabar com o vice. Quando dá um problema com o suplente, termina com o suplente. Temos que definir um caminho e assumir as consequências dessa escolha.
Fundo eleitoral é viável?
É, se tivermos um sistema de controle adequado de aplicação. E tem de ficar sob responsabilidade dos partidos.
Defende a volta do financiamento empresarial?
Eu acho que poderia voltar. O STF só deu aquela interpretação porque viu que os mecanismos de controle estavam frouxos. Penso que, se o Congresso aprovar dentro de um limite, com as doações das empresas sendo feitas apenas para um partido com o qual se afine politicamente, isso poderia ser aprovado.
O STF não está se metendo muito na política?
Não. Ele age porque é provocado. A Constituição Federal é um pacto político. Não há como negar que há um viés político na atuação do STF. Mas é assim em todos os países.