Politica

Conselho de Ética aprova punição a Jean Wyllys por cuspida em Bolsonaro

Parlamentar receberá uma censura por escrito; relator havia pedido a suspensão do mandato de Wyllys

Fernando Jordão - Especial para o Correio
postado em 05/04/2017 19:13
Jean Wyllys cospe em Jair Bolsonaro
O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) vai receber uma censura por escrito por ter cuspido no também deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ), durante a votação da abertura do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em abril do ano passado. A punição foi definida nesta quarta-feira (5/4), pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara, e deverá ser lida pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), encerrando o processo.
O relator do processo, Ricardo Izar (PP-SP), havia pedido a suspensão do mandato de Wyllys, inicialmente, por quatro meses. Pouco antes da votação, no entanto, ele recuou e recomendou uma suspensão de apenas um mês. Mesmo com a diminuição, a proposta foi recusada, por 9 votos a 4, pelos membros do conselho. Por unanimidade, eles decidiram pela censura por escrito.

A denúncia contra o deputado do PSOL foi apresentada pela Mesa Diretora da Câmara. Os dois parlamentares envolvidos já haviam prestado depoimento no Conselho de Ética. Wyllys disse ter reagido a ofensas homofóbicas de Bolsonaro. Este, por sua vez, negou as injúrias e afirmou ter dito apenas a frase "Tchau, querida", frequentemente utilizada por aqueles que eram favoráveis ao impeachment da ex-presidente. O relator entendeu que Wyllys foi provocado, mas avaliou que a atitude de cuspir em resposta foi injuriosa e incompatível com o decoro parlamentar.

Em nota, Jean Wyllys comemorou a decisão. Na avaliação dele, a aplicação da censura escrita mostra que "a tentativa de cassar ou suspender o mandato fracassou". "A pressão social valeu a pena. É uma vitória da democracia e, sobretudo das pessoas que se mobilizaram para impedir que um acordo de bastidores na Câmara calasse nossa voz", afirmou. Também na nota, ele lembrou alguns episódios de Bolsonaro que, no entendimento dele, mereciam ser punidos. Ele disse ser um "deputado material e intelectualmente honesto" por não estar "citado na Lava-Jato e nem na lista da Odebrecht", e reafirmou ter sido ofendido antes de cuspir no parlamentar do PSC. "Nunca antes na vida tinha cuspido em alguém (e não é a forma em que eu costumo agir, nem na Câmara, nem na minha vida privada), mas sou humano, tenho sangue nas veias e o grau de violência, desrespeito e ofensas que recebo desde que estou deputado é intolerável", justificou.

Confira, na íntegra, a nota com o posicionamento de Jean Wyllys:

"NOSSO MANDATO NÃO SERÁ SUSPENSO!

A tentativa de cassar ou suspender nosso mandato fracassou. Graças à mobilização da sociedade civil (em diferentes cidades e nas redes sociais) e ao apoio público de artistas, jornalistas, movimentos sociais e de direitos humanos, referentes políticos de diferentes partidos, acadêmicos brasileiros e do exterior, instituições, conselhos profissionais, ONGs e universidades; a maioria do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar não apoiou a manobra de alguns homofóbicos, integrantes do "baixo clero" da Câmara e da bancada fundamentalista e aliados de Eduardo Cunha, que queriam calar nossa voz e deixar sem representação os 144.770 brasileiros e brasileiras que votaram em mim nas últimas eleições, nas quais fui o sétimo deputado mais votado do estado do Rio de Janeiro.

Em toda a história da Câmara, apenas um deputado tinha sido punido com a suspensão do mandato, por envolvimento em gravíssimos atos de corrupção. O deputado fascista que me xingou dezenas de vezes no plenário e nas comissões, usando palavrões irreproduzíveis, inclusive, no microfone, nunca recebeu, sequer, uma advertência. Não foi punido por me insultar (nem mesmo quando me chamou de "cu ambulante" no microfone), como não foi punido quando disse que não estupraria Maria do Rosário apenas proque "é feia", ou quando homenageou um torturador na tribuna (e se referiu a ele como "o terror de Dilma Rousseff"), ou quando insultou ao vivo uma jornalista nos corredores da Câmara, chamando-a de "imbecil", ou quando agrediu fisicamente o senador Randolfe, ou quando falou que gostaria de assassinar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ou qualquer uma das outras vezes em que usou, no Congresso e nos veículos de comunicação, expressões misóginas, homofóbicas, racistas, xenófobas e discursos de ódio de todo tipo.

Eu sou um deputado honesto, material e intelectualmente. Não estou citado na Lava-Jato e nem na lista da Odebrecht, não recebi dinheiro de empreiteiras ; ou de qualquer outro setor empresário ; para a minha campanha, que foi barata e financiada por cidadãos e cidadãs com pequenas doações pela internet, e jamais na minha vida fui acusado de qualquer ato desonesto ou ilegal. Defendo, na Câmara, os direitos humanos, os direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores e as liberdades individuais. Sou autor de dezenas de projetos que dizem respeito aos direitos a à dignidade das pessoas, que os demais parlamentares podem concordar ou não, mas são projetos sérios, fundamentados e elogiados pelos especialistas. Fui premiado como o melhor deputado do Brasil em três oportunidades pelo Congresso em Foco e recebi diversas distinções nacionais e internacionais. Nunca agi de forma desonesta, contrária à ética ou ao decoro parlamentar. No dia da sessão do impeachment, tive uma reação espontânea, humana, contra os xingamentos e agressões que há anos recebo na Câmara por conta da minha orientação sexual e das minhas posições políticas.

Nunca antes na vida tinha cuspido em alguém (e não é a forma em que eu costumo agir, nem na Câmara, nem na minha vida privada), mas sou humano, tenho sangue nas veias, e o grau de violência, desrespeito e ofensas que recebo desde que estou deputado é intolerável. Sou permanentemente difamado. Inventam projetos de lei que jamais apresentei, coisas que eu jamais disse, ideias que não são minhas, e até editam minhas falas e fazem circular vídeos fraudulentos para me injuriar e caluniar. Dizem que quero mudar a Bíblia, que quero legalizar o casamento entre homens e animais, que quero obrigar as crianças a mudar de sexo, que propus implantar a religião islâmica nas escolas, que chamei cristãos de doentes, que disse que a Bíblia é uma piada, que prometi ir embora do Brasil se o impeachment fosse aprovado. Fazem circular essas mentiras nas redes sociais e convocam milhares de seguidores de páginas fascistas a me insultar nas minhas redes. Recebo ameaças de morte contra mim e contra a minha família e nada é feito para investigar sua origem. E, diante de tudo isso, naquele dia, quando aquela pessoa que não vou nem mencionar, depois de reivindicar publicamente a tortura e homenagear um torturador, me chamou de "veado", "queima rosca" e outras palavras homofóbicas e ofensivas, reagi como ser humano, cansado de tanta violência e desrespeito.

O Conselho de Ética, hoje, finalmente, decidiu não suspender meu mandato. A pressão social valeu a pena. É uma vitória da democracia, e, sobretudo, das pessoas que se mobilizaram para impedir que um acordo de bastidores na Câmara calasse nossa voz. Obrigado!

Agradeço a todos e todas pela solidariedade. Quero reconhecer muito especialmente os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Dilma Rousseff, que, apesar das diferenças políticas que têm comigo, expressaram publicamente sua solidariedade. Agradeço ao presidente da Casa, Rodrigo Maia, que é meu adversário político, mas jamais apoiou essa manobra, urdida pelo anterior presidente, Eduardo Cunha, atualmente preso. Agradeço aos deputados Júlio Delgado (PSB), Léo de Brito (PT) e Valmir Prascidelli (PT), que (junto aos meus colegas da bancada do PSOL e a vários outros), tiveram uma atitude muito corajosa no Conselho de Ética na defesa do nosso mandato. E agradeço especialmente ao PSOL, ao PT e à militância de muitos outros partidos, inclusive alguns com os quais temos muitas divergências, aos movimentos sociais e a todos os que se manifestaram nos últimos meses. Essa solidariedade coletiva me comoveu e me deu muita força para continuar lutando contra as injustiças!

Ninguém calará nossa voz"

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