As delações de 78 executivos da Odebrecht abalaram a República e mostraram como a maior construtora do país garantia lugar cativo nas principais obras públicas e apoio para contratos em 26 países. Entretanto, o ;modelo de negócios; não era exclusivo da empresa e também será detalhado em colaboração das empreiteiras Andrade Gutierrez e OAS. Esses acordos, destacam os investigadores, trarão ainda mais dor de cabeça para a classe política porque demonstram que os contratos só eram firmados por meio de pagamentos ilícitos. Eles detalharão ainda repasses de propina e caixa dois para parlamentares, prefeitos, governadores, magistrados e membros de tribunais de contas.
No caso da companhia mineira, os dirigentes foram chamados pelo Ministério Público Federal (MPF) para atualizar as informações repassadas ainda em 2015, quando assinaram o primeiro acordo. O que se sabe até agora é que a empreiteira mantinha uma área específica responsável pelo pagamento de propina e caixa dois para diversos agentes públicos, assim como a Odebrecht. Os procuradores estimam que a lista de autoridades citadas extrapolará as mais de 100 já apontadas, o que trará ainda mais dificuldade para o presidente da República, Michel Temer, aglutinar a base aliada.
O setor de propina da Andrade, destacam os investigadores, teria feito pagamentos após a empreiteira garantir participação nas obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), na Ferrovia Norte-Sul, em estádios da Copa do Mundo, além de obras no estado de São Paulo, como o Rodoanel e linhas do Metrô. Parte do esquema, detalhou um dos colaboradores, ocorria por meio de operadores, que recebiam repasses da construtora a partir de notas frias por serviços não prestados. Assim, parte significativa dos pagamentos ocorria em espécie.
O primeiro acordo de delação premiada foi firmado pela Andrade Gutierrez em maio do ano passado. O termo previa a devolução de R$ 1 bilhão aos cofres públicos em oito anos. Entretanto, não está claro que a convocação dos executivos para atualizarem as informações repassadas aos investigadores implicará em aumento desses valores. Enquanto restam essas dúvidas, a empresa registrou no ano passado o terceiro ano seguido de queda de receitas. O faturamento despencou de R$ 14 bilhões em 2014 para R$ 8 bilhões em 2016.
Os herdeiros da companhia cogitaram a possibilidade de buscar um novo sócio com capacidade de fazer um aporte significativo para equilibrar as contas da companhia. O plano foi abortado e o atual presidente, Ricardo Sena, sucessor de Otávio Azevedo, tenta garantir contratos no exterior e não depender, no que for possível, de contratos com entes públicos.
Ligações
No caso da OAS, um primeiro acordo de delação premiada do ex-presidente da empresa José Adelmário Pinheiro Filho, conhecido como Léo Pinheiro, foi abortado em agosto do ano passado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) após parte do conteúdo ter sido vazado. A empreiteira baiana, segundo relatos de investigadores, mantinha centralizado em Pinheiro o contato com políticos para distribuição de propina, diferentemente da Odebrecht, que teve 78 executivos envolvidos no caso. Agora a OAS deve envolver mais dirigentes nesse processo. Entre eles, a família Mata Pires, sócia majoritária e pouco citada, apesar de ter ligações profundas com o meio político. A esposa de Cesar Mata Pires, fundador da empresa, Tereza, é filha do ex-senador Antonio Carlos Magalhães. Em Salvador, berço da empresa, são comuns as piadas de que a sigla que dá nome à construtora significa ;Obrigado Amigo Sogro;.Apesar da ligação, as famílias romperam relações há anos e Cesar Mata Pires foi obrigado a vender a parte de uma TV na Bahia. Apontado como um homem de difícil relacionamento, Mata Pires agora precisa conseguir acordos de delação premiada e de leniência para tentar salvar a empreiteira, que está em recuperação judicial. Apesar de apontado por quem o conhece como um homem de personalidade difícil, ele precisará delatar autoridades públicas com as quais manteve relacionamento e que ajudaram a empresa a prosperar.
Antes da suspensão das negociações para um acordo de delação premiada, executivos da OAS apontaram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), integrantes da campanha da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e os senadores Aécio Neves (PSDB-MG) e José Serra (PSDB-SP) como beneficiários de recursos ilícitos. Pinheiro teria afirmado que o apartamento triplex no edifício Solaris, no Guarujá (SP), era destinado a Lula. A negociação em curso, comandada por procuradores em Brasília e em Curitiba (PR), envolve também a delação de magistrados e integrantes de tribunais de contas. Os procuradores querem ter acesso a toda a teia de relações dos executivos.