A Lava-Jato só teve êxito, recuperou bilhões e se tornou a maior operação da história do Brasil por causa de uma "série de coincidência improváveis". A afirmação está no livro do procurador da República Deltan Dallagnol lançado nesta semana. Nele, o coordenador da força-tarefa da investigação que atingiu os principais políticos do Brasil conta detalhes das apurações de desvios de recursos públicos e traz os bastidores da derrota do Ministério Público no Congresso Nacional na votação do projeto das 10 medidas contra a corrupção.
Na obra, Dallagnol faz duras críticas ao sistema político e judiciário que, segundo ele, propiciam a impunidade dos criminosos de colarinho branco. O procurador faz uma lista de dificuldades enfrentadas no país na punição de poderosos. "Demora, anulação de casos, prescrição, penas baixas, indultos, ausência de criminalização do enriquecimento ilícito e falta de instrumentos aptos a recuperar dinheiro desviado", diz. O sistema, acredita ele, foi feito "para não funcionar".
Apesar de afirmar em vários trechos que "a saída para o Brasil não é a Lava Jato", ele diz que o caso "trata um tumor, mas o problema é que sistema é cancerígeno". Dividido em 10 capítulos, o livro de 319 páginas é dedicado a "cada brasileiro que tem mantido acesa a chama da esperança em um país mais justo, primando pela ética, defendendo a Lava Jato e apoiando a realização de reformas contra a corrupção".
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Narrado em primeira pessoa e em ordem cronológica, ele fala da infância, da adolescência e da disciplina para conseguir passar no vestibular para direito e no concurso para o MP. Em tom piegas, faz uma declaração de amor à mulher, Fernanda, "a melhor parte de nós dois", segundo ele. Também recorda das investigações que participou antes de coordenar a força-tarefa da Lava-Jato, como o escândalo de funcionários fantasmas na Assembleia Legislativa do Paraná e o caso do banco estatal paranaense, o Banestado, "que plantou a semente da Lava Jato" e envolveu crimes financeiros e desvios de recursos.
Na obra intitulada A luta contra a corrupção, ele admite que foi pego "de surpresa com a repercussão negativa" da apresentação que fez sobre a denúncia contra o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. "Difundiu-se a ideia da irracionalidade da acusação. Uma frase jamais dita por nós viralizou, como se estivéssemos pronunciado: ;Não temos provas, mas temos convicção;. Os dias seguintes foram bastante pesados", recorda. Ele argumenta que é comum fazer Powerpoint para facilitar o entendimento das acusações. "Seguindo o padrão das coletivas anteriores, para dar a ideia de conjunto probatório, foi preparada uma representação gráfica dos indícios que apontavam para a posição central do ex-presidente no esquema", explica. Sobre Lula, ele lembra que a condução coercitiva dele foi a 118; da Lava Jato e que "as anteriores não tinham gerado polêmica".
Dallagnol expõe que, após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, houve um temor muito grande em relação ao governo que assumira o Executivo nacional. "Tudo indicava ; como esperávamos ; que as pressões não diminuiriam ao longo da nova gestão. Pelo contrário, poderiam piorar", afirma. Ele também aproveita para rebater os críticos da Lava Jato ; que, segundo ele, se apegam a "teorias da conspiração" ;, e para comenta o fato de não investigar o mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. "Essa crítica não faz sentido para quem tem conhecimento do nosso sistema jurídico".
Trechos
Sobre as críticas
"Alegar atuação partidária significaria supor que centenas de agentes públicos se alinharam para praticar injustiças e prejudicar determinados políticos ou partidos, assumindo os riscos dessa decisão. Isso não faz sentido, é pura teoria da conspiração"
Apaixonado
"Novamente, entrei no ;modo disciplina; e abdiquei de outras dimensões da vida, focando o meu alvo. Fernanda me apoiou integralmente. Ela é a melhor parte de nós dois. Abnegada, perspicaz, doce e companheira, sempre me estimulou a encarar os desafios. Acabei passando em primeiro lugar no concurso para promotor, em segundo para juiz e em décimo para procurador da República"
Delações
"Em absolutamente todos os casos de colaboração na Lava Jato ; 100% deles ;, a iniciativa partiu do advogado que representava o réu, como estratégia da defesa, e jamais do Ministério Público. (...) A palavra do colaborador deve ser confirmada por outras"
A luta contra a corrupção (Editora Primeira Pessoa, 320 págs, R$ 39,90)