Paulo de Tarso Lyra
postado em 03/06/2017 08:00
De todos os fios desencapados que podem causar estragos por conta das delações premiadas, o que está mais adiantado é o de Antonio Palocci, ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil nos governos Lula e Dilma. Ele, que trocou de advogado, preterindo José Roberto Battochio justamente para cortar os laços umbilicais com o ex-presidente petista, tem apresentado muita munição contra Lula. E não só. As declarações feitas pelo petista incluem bancos, setores automotivo e sucroalcooleiro, e relações suspeitas de empresas com a Receita Federal.
Segundo o Correio apurou, até o momento Palocci já apresentou 12 anexos em sua delação. Neles constam documentos, comprovações de reuniões e nomes de pessoas com as quais se relacionou ao longo do período em que foi ministro. Mas também longe da Esplanada, em conversas para arrecadação de recursos para a reeleição de Lula em 2006 e na primeira vitória de Dilma, em 2010, quando foi o coordenador-geral da campanha, auxiliado pelo então presidente do PT, José Eduardo Dutra, e pelo futuro ministro da Justiça José Eduardo Cardozo. O trio, à época, foi apelidado de ;Os três porquinhos;.
De tudo o que Palocci falou até o momento, a principal munição atinge o BTG Pactual, banco que foi presidido por André Esteves, preso em novembro de 2015, acusado de obstrução das investigações da Lava-Jato. Foi liberado poucas semanas depois, mas o fantasma do crescimento mal explicado do banco nos anos do PT no poder continuam assombrando os petistas. Estão na mira, por exemplo, as compras de outros bancos pelo BTG. O Correio não conseguiu contato com a defesa do BTG, que, em reportagens anteriores, garantiu que André Esteves sempre esteve disponível para responder a questões relativas às investigações.
Palocci já apresentou munição contra representantes do setor automotivo. Durante os governos do PT, sobretudo os anos de Lula no Planalto, o setor foi muito beneficiado por desonerações de impostos como uma maneira de impulsionar o consumo interno e permitir que o país superasse a crise econômica de 2008. O PT já estava ciente desse risco. Um cacique partidário confidenciou ao Correio, tão logo surgiram as primeiras especulações de que Palocci estaria disposto a delatar em busca de penas mais brandas, que as medidas provisórias editadas durante os anos da retomada econômica ; incluindo o período em que o mundo desabava por conta da crise do subprime nos Estados Unidos ; poderiam ser mortais para Lula.
Palocci permaneceu no posto até 2006, mas foi sucedido por Guido Mantega. Nos apelidos dados pelos delatores da Odebrecht, Palocci é o ;italiano;, e Mantega o ;pós-Itália;. Também é alvo de investigações da Lava-Jato, embora, diferentemente de Palocci, permaneça em liberdade, Mantega lembrou-se esta semana de uma conta na Suíça, não declarada, com depósitos de US$ 600 mil. Para uma das vozes mais influentes da esquerda petista, isso é um sinal dos solavancos pelos quais o partido terá de atravessar. ;Minha impressão é de que isso é um detalhe perto do que está por vir nos próximos dias. Motivo pelo qual temos que manter a calma e segurar mais essa onda;, previu Valter Pomar.
A delação de Palocci, segundo fontes que acompanham as discussões até o momento, também apontam benefícios tributários para empresas do setor sucroalcooleiro. Ao longo dos 10 últimos anos, eles foram estimulados em programas de aumento de álcool no composto da gasolina, nos projetos para retomada da produção de etanol e no reembolso de 0,3% do valor do imposto equivalente às exportações do setor.
Palocci também tem muito a dizer sobre as negociações conduzidas pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), alvo das ações do Ministério Público e da Polícia Federal dentro da Operação Zelotes. Ainda há informações de que o ex-todo-poderoso ;xerifão; da economia detalhou ações suspeitas conduzidas pela Receita Federal em relação a uma empresa indiana do setor de cigarros. Nada que envolva os grandes produtores nacionais.
Em relação aos demais fios desencapados, poucas novidades até o momento. A Procuradoria-Geral da República reforçou o pedido de prisão contra o agora ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, mas juristas que acompanham o caso acham difícil que o pedido seja acatado neste momento. Avaliam que ele devolveu os R$ 500 mil que estavam na mala entregue pela JBS e que, agora, por estar com os holofotes centrados em si, não teria condições de ;obstruir a Justiça;. E o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha continua hermético quanto à possibilidade de fechar acordos de delação premiada.