Agência France-Presse
postado em 28/06/2017 13:03
Em qualquer lugar do mundo, um presidente com 7% de popularidade e acusado formalmente de corrupção teria sérios problemas para se manter no cargo, mas, no Brasil, Michel Temer está conseguindo, por ora, o que parece impossível. Quais seriam os motivos?
Corrupção enraizada
Temer é o primeiro presidente em exercício da história do país a ser acusado pelo Procurador Geral da República. A denúncia de corrupção passiva deve ser validada por dois terços da Câmara de Deputados para que possa ser enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Temer tem maioria no Congresso desde que assumiu o poder em maio de 2016, depois do impeachment da presidente Dilma Rousseff. Além disso, 185 dos 513 deputados estão sendo investigados, a maioria dentro da operação "Lava-Jato". "Isso cria uma rede de solidariedade", diz Sylvio Costa, diretor do portal Congresso em Foco. A queda de Temer poderá provocar um efeito dominó e muitos na Câmara não querem perder seus foros privilegiados.
Sem sucessor claro
Quando Dilma foi destituída pelo Congresso por manipulação das contas públicas, o caminho para sua substituição era claro. Em seu lugar, assumia seu vice-presidente, Temer, do PMDB, partido com o qual o PT se aliou para ter mais apoio no Congresso.
[SAIBAMAIS]Mas se Temer cair, para preencher o vazio de poder a Constituição prevê que o Congresso eleja quem o substitua no prazo de 30 dias. Neste caso, não há uma figura de consenso. Durante o primeiro mês, assumiria interinamente o presidente da Câmara de Deputados, Rodrigo Maia (DEM), que, apesar de também ser investigado por corrupção, é um dos nomes com maior força para concluir o mandato até o final de 2018.
A legitimidade de quem vai encabeçar o governo de transição, o terceiro em menos de um ano e meio, seria ainda mais questionada. Muitos no Brasil acreditam que este caos político deveria ser resolvido com eleições diretas, antes das marcadas para 2018. Mas, para isso, seria necessária a aprovação de uma emenda constitucional.
Apoio do mercado
Temer prometeu tirar o Brasil da pior recessão de sua história através de uma série de ajustes impopulares, mas que pretendem devolver a confiança aos investidores. Já conseguiu aprovar o congelamento dos gastos públicos durante 20 anos e abrir à iniciativa privada o setor petroleiro, mas faltam aprovar duas de suas principais bandeiras: as reformas trabalhista e da previdência.
O mercado espera com ansiedade essa aprovação, mas a crise política retarda o processo. "Há uma divisão do mercado, mas uma parte ainda acredita que seria melhor o Temer continuar. Porque a possibilidade de reformas é maior e porque há uma garantia maior de que permaneça a atual equipe econômica", afirma o analista Ricardo Ribeiro, da MCM Consultores.
Seu principal sócio no governo, o PSDB, também quer a aprovação dessas reformas antes das eleições, mas está dividido a respeito do custo político de permanecer fiel a um presidente com semelhante índice de desprestígio.
O partido está fragilizado, além disso, pelas investigações contra seu ex-líder Aécio Neves e parte de sua cúpula, e também não perde de vista que provavelmente precisará aliar-se ao PMDB de Temer se quiser a Presidência em 2019.
Silêncio nas ruas
Um dos motivos que levou à saída de Dilma foi a pressão de milhões de pessoas mobilizadas em todo o país. Mas o grito de "Fora Temer" tem sido tímido até agora nas ruas, apesar de 65% dos brasileiros acharem que sua saída seria melhor para o Brasil, segundo recente pesquisa Datafolha.
Os sindicatos protagonizaram a maior e mais violenta manifestação em 28 de maio passado, em Brasília, mas o PT do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva (2003-2010) tem seus próprios problemas de corrupção e não conseguiu gerenciar o descontentamento popular.
Ao negar-se taxativamente a renunciar, Temer complicou muito mais o cenário e, de alguma forma, está esticando ao máximo a solidez constitucional do país. "Mas o Brasil tem instituições muito fortes. Não existem hoje aventureiros buscando soluções fora da constituição, fora da institucionalidade. Então, para nós, esse é um conforto. É saber, seja o que for acontecer, que vai ser em decorrência do comprimento da Constituição", afirma a procuradora regional da República, Silvana Batini.