O país gasta mesmo com os cofres vazios. Somente nos primeiros seis meses deste ano, a dívida pública, interna e externa, consumiu mais de R$ 700 bilhões dos R$ 940 bilhões já executados pelo governo. Do que sobrou, apenas a administração pública foi responsável por um gasto superior a R$ 10 bilhões. Em 2016, segundo levantamento da ONG Contas Abertas, o custo só com serviços relacionados a carros oficiais foi de mais de R$ 1,6 bilhão. O valor é muito superior ao destinado a diversos ministérios, como, por exemplo, o do Meio Ambiente, que terá de se virar com R$ 446,5 milhões neste ano.
Na conta, estão incluídas as faturas de manutenção, combustível, melhorias, locações de automóveis. Apenas com combustíveis e lubrificantes foram consumidos R$ 328 milhões. Com acessórios, mais de R$ 1 milhão. O maior orçamento é do Ministério da Defesa, que gastou R$ 768,6 milhões, destes, R$ 346,4 milhões em carros de combate. O segundo maior custo é do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), que aplicou R$ 246 milhões, seguido da Educação, com R$ 139,5 milhões. Para o economista e secretário-geral da Contas Abertas, Gil Castello Branco, os números estão subestimados, já que há outras formas de o governo lançar no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) os gastos com aluguel de veículos.
O presidente do Conselho Federal de Economia, Júlio Magaya, atribui os gastos exorbitantes à má gestão. ;O governo projeta um deficit de R$ 139 bilhões para as contas públicas este ano, mas o rombo deve ser maior, perto de R$ 160 bilhões. Isso tudo é por causa da má gestão. Temos órgãos com muitos funcionários e outros com equipes ineficientes. O governo aumentou, no ano passado, os gastos com pessoal em R$ 22 bilhões e agora pensa em reduzir R$ 1 bilhão. É evidente que tudo isso poderia ser reduzido, não só com pessoal, mas também com veículos e outros bens;, comenta.
Autor do projeto de lei 3.108/15 que pretende restringir o uso de carros oficiais para os presidentes dos Três Poderes, o vice-presidente, os ministros e os comandantes das Forças Armadas, o deputado federal Pedro Cunha Lima (PSDB-PB) comenta que a redução da máquina pública é uma demanda difícil de atender, mas necessária. ;Esse assunto precisa deixar de ser tabu e tem de ser feito com o envolvimento de toda a elite do funcionalismo público. Não dá para aumentar imposto de gasolina e não cortar comissionados. Os gastos do orçamento com serviços que não têm retorno direto à população precisam ser cortados;, defende. Aprovado por unanimidade na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara no último dia 14, o projeto vai ao Senado.
No Senado, cada parlamentar tem direito a um carro oficial alugado além dos institucionais. Em 2015, a Casa tinha 127 veículos locados e dois oficiais. Em 2011, a primeira-secretária da Casa decidiu não ter mais frota própria para reduzir gastos com manutenção, peças, lavagem e equipamentos ; uma economia estimada em R$ 2,6 milhões. Neste mês, a frota será renovada por veículos zerados. Em um novo modelo de contratação, o Senado contratou uma só empresa para locação e lavagem dos automóveis pelo valor anual de R$ 3,3 milhões. Na Câmara, os deputados integrantes da Mesa Diretora, titulares e suplentes, e os órgãos vinculados a ela têm o benefício. Em 2015, o total de veículos locados foi 50 e oficiais 23, segundo estudo da consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira.
Sobre os gastos, o Ministério da Justiça esclarece que dispõe de 12 veículos para atender as próprias demandas fornecidas por locação, no entanto, ressalta que possui uma frota de veículos militares que despendem um alto custo de manutenção. O MEC esclarece que o valor total inclui as universidades e institutos federais e que a atual gestão diminuiu os gastos de 5,6 milhões, em 2015, para R$ 4,3 milhões em 2016. Procurada, a Defesa não respondeu.
Táxi
Apesar de impressionantes, as altas cifras gastas com meios de locomoção já são fruto de medidas restritivas impostas pela União nos últimos anos. Em outubro de 2015, a então presidente Dilma Rousseff alterou, por meio de decreto, as regras e limitou o uso exclusivo de carro oficial ao presidente, ao vice-presidente, aos ministros, aos comandantes das Forças Armadas e aos ex-presidentes. Para os demais cargos, o uso dos veículos tem de ser compartilhado. No ano passado, o Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão elaborou um estudo para identificar os gastos e lançou, em fevereiro deste ano, o sistema TaxiGov, ainda em fase de teste em 12 pastas e com previsão de extensão total até 2018. O contrato anual com a empresa vencedora da licitação ficou estimado em R$ 12,7 milhões.
Dados da pasta mostram que, até o início deste mês, 2.348 usuários haviam se cadastrado no sistema e feito 16.462 corridas, percorrendo 131.000km. O custo das viagens ficou em R$ 445 mil, gerando uma economia de R$ 703 mil, 61,24% comparada ao contrato anterior, de R$ 1,1 milhão. Em junho deste ano, provocado por uma representação, o plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) permitiu que os serviços de transportes por meio de aplicativos, como o Uber ou Cabify, possam concorrer na licitação do sistema. A pasta ainda avalia como incluir a mudança. (NL e RS)
Máquina desgovernada
Em 2016, a administração pública gastou mais de R$ 1,6 bilhão com veículos, entre manutenções,
combustíveis, melhorias e locações de automóveis. Confira detalhes do levantamento da OnG Contas Abertas:
Acessórios R$ 1.059.330,80
Carros de combate R$ 1.059.330,80
Combustíveis e lubrificantes R$ 328.980.079,67
IPVA R$ 3.159.319,96
Locação R$ 495.856,60
Manutenção e material para manutenção R$ 514.747.520,99
Melhorias e adições R$ 10.800.538,86
Taxas e pedágios R$ 1.524.488,7
Estacionamento R$ 3.065.439,68
Estacionamento (Polícia Federal) R$ 149.153,96
Veículos de tração mecânica R$ 375.027.307,51
Veículos diversos R$ 102.508.287,36
Total R$ 1.687.930.182,50
Fontes: Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados e OnG Contas Abertas