Jornal Correio Braziliense

Politica

Em delação, Funaro detalha atuações de planos de saúde para aprovação de MP

Duas empresas negam que tenham cometido ilegalidades


Na delação premiada do doleiro Lúcio Funaro, um trecho do anexo 26 conta, em detalhes, a ação de companhias de saúde suplementar para a aprovação de uma medida provisória no Congresso. Segundo Funaro, que era o operador do esquema de propinas do PMDB, a MP 656/2014, que viria a se tornar lei no início de 2015, beneficiaria diretamente duas empresas da área: a Amil e a Rede D;or.

As duas empresas negam que tenham cometido ilegalidades, mas a confissão de Funaro ganha corpo quando se analisa a tramitação da MP, que se tornou a Lei n; 13.097. Com 32 capítulos e 169 artigos, a norma é um emaranhado de decisões e alterações em outras leis existentes, beneficiando diversos setores, de pneus a geradores de energia eólica. No artigo 142, que altera uma lei vigente desde o governo Collor, fica permitida a participação ;direta ou indireta, inclusive controle, de empresas ou de capital estrangeiro na assistência à saúde;. Medida que afetaria, diretamente, empresas de planos de saúde, como a Amil e a Rede D;or.

Dois ex-deputados apresentaram emendas a favor das empresas. A principal delas, a que muda o artigo 142, é assinada pelo ex-deputado Manoel Junior (PMDB-PB), cuja campanha para eleição em 2014, segundo o Serviço de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE), do Tribunal Superior Eleitoral, recebeu R$350 mil de empresas ligadas ao ramo da saúde e ao farmacêutico, além de R$ 200 mil do banco BTG Pactual, à época sócio minoritário da Rede D;or. Uma segunda proposta veio do também ex-congressista Newton Lima (PT-SP), que acabou não aprovada. Também em 2014, Newton recebeu dois pagamentos diretamente da Amil, no valor de R$145 mil, mas acabou não sendo reeleito para o cargo.

A base de dados do SPCE revela que os CNPJs relacionados à Amil desembolsaram R$ 26,3 milhões em doações para candidatos e partidos nas eleições de 2014 ; valor 25 vezes maior que o R$1,02 milhão gasto na campanha de 2010. Responsável por mais de 6 milhões de clientes e 24 milhões de consultas por ano, a empresa teve, entre as duas eleições, um fato relevante: em 2012, foi vendida ao fundo norte-americano UnitedHealth, por US$ 4,9 bilhões (R$ 9,89 bilhões, no câmbio da época). Mesmo que a compra de 90% das ações pelos norte-americanos não fosse permitida pela Constituição (que, antes da MP, proibia a participação de capital estrangeiro na área), a troca de donos não causou preocupação no mercado. Após a aquisição, porém, o perfil de ação da operadora de saúde em relação ao lobby com políticos mudou.

Na eleição de 2010, além de doar para deputados, a Amil repassou R$ 100 mil ao então candidato à reeleição no Rio, Sérgio Cabral (PMDB), e R$ 200 mil ao candidato ao Senado César Maia (DEM). Em 2014, o padrão mostrou-se mais agressivo, com uma doação de R$ 500 mil ao então candidato ao governo de São Paulo, Paulo Skaff (PMDB), e cinco doações para a campanha de Dilma Rousseff (PT) à reeleição, totalizando R$ 7 milhões.

Outra empresa com participação ativa nas doações de 2014 foi o BTG Pactual. Comandado por André Esteves, o banco tinha, durante as eleições de 2014, uma fatia de 24% da Rede D;or. Segundo a delação de Lúcio Funaro, tanto a Amil quanto a Rede D;or enviavam propina diretamente ao deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), hoje preso em Brasília pela Lava-Jato, pela aprovação da MP. Na delação, o doleiro afirma que o contato entre Cunha e as operadoras de saúde era feito diretamente com Edson Bueno, o fundador da Amil, e André Esteves, preso no fim de 2015 por suspeita de envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras.

Enquanto os CNPJs da Rede D;or não apresentam doações nas eleições de 2014, o BTG Pactual, por meio de diversas subsidiárias, gastou quase R$ 53 milhões em doações a diversos candidatos e partidos, incluindo
R$ 9,5 milhões para o comitê de Dilma. O banco também doou R$ 500 mil a Eduardo Cunha.


R$ 26 milhões
Valor doado pela Amil a políticos na campanha eleitoral de 2014

;Regras cumpridas;

Em nota, a Amil afirma que ;cumpriu e continuará cumprindo as regras que orientam as doações para campanhas políticas e vai cooperar com as autoridades no que for solicitada;. A Rede D;or, responsável pelos hospitais da rede São Luiz, também garante em nota que ;nunca fez nenhuma doação aos políticos citados na referida delação; e ;nega veementemente qualquer envolvimento no caso;.
O BTG, que vendeu suas ações dentro da Rede D;or sete meses depois das eleições, também se manifestou por meio de nota. O banco afirma que ;nunca realizou pagamento ilegal ou ofereceu promessa de vantagem indevida a qualquer autoridade e que repudia insinuações levianas a seu respeito;. Sobre as doações, a empresa garante que ;mantém e manteve contato com autoridades relevantes a fim de colaborar com o desenvolvimento de medidas legais que contribuam para a modernização do Brasil;.

Sem contato


O ex-deputado Newton Lima, do PT paulista, não foi localizado. O ex-deputado Manoel Junior, que também é o autor da emenda que beneficia as operadoras de saúde, hoje é vice-prefeito de João Pessoa (PB) e também não foi encontrado pela assessoria de imprensa da prefeitura.