Natália Lambert
postado em 26/10/2017 06:00
;Toda gente tinha achado estranha a maneira como o Cap. Rodrigo Cambará entrara na vida de Santa Fé. Um dia chegou a cavalo, vindo ninguém sabe de onde, com o chapéu de barbicacho puxado para a nuca, a bela cabeça de macho altivamente erguida e aquele seu olhar de gavião que irritava e ao mesmo tempo fascinava as pessoas.; Assim como o lendário personagem de Érico Veríssimo, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), chegou ao centro do cenário político de repente e causou desconfiança. Rapidamente, conquistou espaço e aliados e, agora, no futuro pós-segunda denúncia contra o presidente Michel Temer, tem as rédeas do país nas mãos.
Na Câmara desde 1999, o filho do ex-prefeito do Rio de Janeiro César Maia aproveitou, em 2016, o cavalo selado que passou ao seu lado após a derrocada do ex-deputado e presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Com 285 votos, foi eleito à presidência da Câmara para cumprir um mandato-tampão até 1; de fevereiro de 2017 e, em uma manobra apoiada pelo governo, se reelegeu ao posto mais alto da Casa. ;Mais por consequência do que por estratégia;, na visão de aliados, se prepara agora para chegar ao Palácio do Planalto nas eleições de 2018.
No processo de análise da primeira denúncia, quando a Procuradoria-Geral da República acusou Temer de corrupção passiva, Maia se manteve afastado do processo de negociação para não sair com imagem de traidor, já que é o principal beneficiado caso Temer saia do cargo. Agora, na segunda denúncia, depois de ser chamado por alguns de ;covarde;, o carioca preferiu ser mais incisivo: ajudava o Planalto, mas depois tocaria uma agenda própria no Congresso. ;O Temer não tem mais governabilidade e o único caminho é entregar as decisões mais relevantes, especialmente, em relação às questões econômicas ao Congresso. Ele fica mais quieto e deixa o Rodrigo Maia e o Eunício trabalharem;, comenta um deputado da base aliada defensor desse ;parlamentarismo branco;.
E essa é a promessa de Maia. Ele prepara uma agenda de votações focada em projetos com mais apelo popular, principalmente, ligados à saúde e à segurança pública, e pretende jogar fora qualquer proposta de reforma que tenha a digital de Michel Temer. ;A ideia é trabalharmos em uma reforma da Previdência, por exemplo, que una o Congresso e se adéque ao ambiente possível para ser aprovada em um ano pré-eleitoral;, explica um correligionário do presidente da Casa.
Afastamento
Interlocutores no Palácio do Planalto garantem que Temer não está incomodado com a perda de protagonismo para Maia, até porque, com a aprovação de somente 3% da população, segundo pesquisas, o chefe do Executivo estaria ;até gostando; de sair dos holofotes para cuidar da própria imagem. ;O presidente não tem pretensões de se eleger em 2018, mas quer deixar um legado significativo. Então, se o Congresso conseguir tocar as reformas, é bom para ele também;, comenta um interlocutor. Na visão do líder do PMDB na Câmara, o crescimento de Maia está longe de ser um problema. ;Desde o começo, o presidente Michel governa com esta proposta de parceria com o Congresso. Quando ele fala em ;semipresidencialismo;, é exatamente o que ele defende;, afirma Baleia Rossi (SP).
Alguns peemedebistas apostam, inclusive, em Maia para a sucessão de Temer no poder, já que os principais medalhões da sigla estão sendo investigados em denúncias de corrupção. Apesar do desejo do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, de ser o candidato do Planalto, o partido não acredita na capacidade de angariar votos do titular da Fazenda. Já o DEM dispensa o apoio. ;A baixa popularidade de Temer vai colar em qualquer um. A tendência do Rodrigo agora é cada vez mais de afastamento do governo;, comenta um aliado.
Agora, o partido trabalha para ampliar a divulgação desse protagonismo de Rodrigo Maia, já que, na visão de grande parte da sociedade atual, os políticos estão desacreditados e no mesmo balaio. Citado nas planilhas de propina da Odebrecht como ;Botafogo;, acusado de ter recebido R$ 1 milhão em caixa dois, ao todo, nas campanhas de 2008, 2010 e 2012, o carioca só precisa tomar cuidado com a sede de poder. A paixão pelas armas e a ambição fizeram com que o xará descrito por Érico Veríssimo ignorasse conselhos de aliados e fosse à guerra, onde sucumbiu com uma bala no peito. ;Rei morto, rei posto.;
"Desde o começo, o presidente Michel governa com esta proposta de parceria com o Congresso. Quando ele fala em ;semipresidencialismo;, é exatamente o que ele defende;
Baleia Rossi (PMDB-SP), deputado federal
Voo sem barreiras
Apesar de estar no quinto mandato consecutivo na Câmara, a ascensão de Rodrigo Maia é recente. Confira os principais eventos que levaram Maia ao centro do poder:
; Afastado da Presidência da Câmara por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o então deputado Eduardo Cunha renuncia ao cargo em julho de 2016, obrigando o então vice-presidente da Casa, Waldir Maranhão (PP-MA), a convocar novas eleições.
; Apoiado por partidos como PSDB, PT e PMDB para neutralizar o ;Centrão; formado por Cunha, Maia é eleito para um mandato-tampão até 1; de
fevereiro de 2017.
; Mesmo tendo se comprometido a não concorrer à reeleição, Maia usa uma brecha no regimento para se candidatar novamente ao cargo e é reeleito com 293 votos, desta vez, com apoio da base governista.
; Em junho, o Supremo Tribunal Federal (STF) envia denúncia contra o presidente Michel Temer à Câmara. A condução imparcial dos trabalhos por Maia amplia o apoio a ele entre deputados da base e da oposição e no Planalto.
; Em setembro, uma nova denúncia chega à Casa e, novamente, Maia se fortalece, adotando, desta vez, uma postura mais impositiva sobre projetos a serem priorizados. As duas denúncias foram rejeitadas pelos deputados.