Guilherme Mendes - Especial para o Correio
postado em 26/10/2017 20:04
A votação que salvou a pele de Michel Temer na Câmara trouxe, novamente, a sensação de protagonismo do poder Legislativo sobre o Executivo. O preço - fiscal e político - para ver a segunda denúncia barrada, enfraquece um Planalto já sem apoio popular e com uma base aliada que recuou nos últimos meses. Assim, crescem as chances dos últimos 431 dias do mandato de Temer não terem a influência do cargo que o peemedebista ocupa, deixando à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal o real poder de articulação e decisão sobre a agenda política.
A ideia, conhecida como "parlamentarismo branco", não passou despercebida dentro da Câmara nesta quinta-feira, um dia depois de o plenário rejeitar a denúncia contra o presidente por 251 votos a 233. "Esta história de ;parlamentarismo branco; existe há muito tempo, e vai continuar existindo", afirmou ontem um dos líderes da articulação do governo dentro da Casa, Beto Mansur (PRB-SP). O deputado garantiu que a existência desse acordo entre Senado, Câmara e Planalto, durante o governo Temer, foi essencial para se aprovar as medidas tomadas pelo governo desde o ano passado, como o teto de gastos públicos e a reforma trabalhista.
Cientistas políticos ouvidos pelo Correio entendem que, apesar da dificuldade que o governo teve em fortalecer a sua base aliada desde a primeira denúncia, em agosto, as relações entre os dois poderes não serão mudadas tão radicalmente quanto se cogita.
Na visão do pesquisador da fundação Getúlio Vargas (FGV), Humberto Dantas, uma das razões para isso é o ano eleitoral. "O Brasil, e principalmente os políticos, já estão mergulhados em 2018". O cientista político acredita que a postura do Congresso deve evitar grandes desgastes. "Isto não é parlamentarismo branco, mas apenas o ritmo político do país".
Para o professor da universidade Mackenzie, Roberto Gondo, o momento não será de controle completo. "Ele (o poder Executivo) não se torna refém no sentido de mudar todas suas propostas, mas se torna refém no sentido de não conseguir aprovar tudo da forma que o executivo quer", afirmou. O professor não enxerga muitos riscos para as alianças costuradas por Temer até o final de seu mandato, mas que agora, as condições são diferentes. "O Executivo vai precisar ter um pouco mais de humildade na hora de promover propostas para Câmara. Não vai poder colocar pela goela", disse.
A hora da Câmara
Para Roberto Gondo, a rejeição da denúncia contra Michel Temer abre caminho para que o Democratas, partido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), aumente sua influência e ganhe espaço dentro da discussão política. Hoje, Maia recebeu o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, em sua residência oficial, no que pode ser interpretado como um sinal de que Maia poderia tomar o lugar de Temer para discutir a agenda de reformas direto com Meirelles. Segundo o ministro, o encontro foi para debater a reforma da previdência, que ele acredita poder ser votada ainda este ano. Para o Humberto Dantas, porém, a tentativa não deverá surtir efeito: "nunca houve reforma previdenciária em ano eleitoral neste país", disse.
Mas o consenso é que, independente da pauta a ser votada a partir de agora no Congresso, as condições de diálogo e negociação entre os dois lados mudaram. "É impossível você imaginar que, depois de duas denúncias, o governo não tenha que avaliar os resultados e avaliar os últimos meses e avaliar de que forma restaurará sua maioria", disse Rodrigo Maia, pouco depois do fim da votação. Maia ainda disse acreditar que, "pela experiência dele, ele (Temer) irá refletir que foram meses difíceis para a Câmara dos Deputados".
A opinião é partilhada pelo líder do PSD, deputado Marcos Montes. "O governo tem que ter muita serenidade agora para realinhar tudo e ver os erros cometidos. Temer tem capacidade e autoridade para isso". O deputado, porém, lembrou que a recuperação do prestígio da presidência na Casa passa por um parlamento comandado pela ajuda do parlamento. "Esta é a oportunidade que nós estávamos esperando".