Os três grandes grupos que se revezam no centro do ringue não brigam apenas entre eles. Disputam internamente também. Se existe uma reclamação generalizada da classe política quanto ao ativismo exagerado de juízes, desembargadores e integrantes do Ministério Público, internamente esses grupos tampouco se entendem. A condenação de Lula a 12 anos e um mês de prisão forçará a reabertura do debate sobre a prisão em segunda instância. Dentro do Supremo Tribunal Federal, este tema se tornou conflituoso, beirando o tabu. Mas será enfrentado em breve.
A Corte, nesse assunto, está completamente dividida. O resultado final representará uma mudança de paradigmas que norteiam a Lava-Jato ou confirmará um rumo que o combate à corrupção vem tomando. Um desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) afirmou, em conversa reservada com o Correio, que ;o Supremo pedir a palavra final em todos os processos que envolvem decisões já tomadas nos tribunais desprestigia os demais membros do Judiciário ; juízes de primeira instância e desembargadores;.
Nas palavras dele, os magistrados passam a ter ;decisão de treino;, e passa a valer apenas o entendimento do Supremo ;que é quem vai sentenciar de verdade;. ;Isso certamente foi impulsionado por causa da condenação de Lula, e é sabido que a ministra Cármen Lúcia não quer deixar arestas neste assunto antes da eventual prisão dele.; Ex-integrante da força-tarefa do MPF na Lava-Jato, Bruno Calabrich acredita que, ;se o STF mudar de posição ; antes ou depois de uma eventual prisão de Lula ; será prejudicial para todo o Judiciário brasileiro;.
Na opinião dele, ;o que estava se aplicando no Brasil antes da mudança de entendimento do Supremo era irracional. Porque, na prática, com bons advogados, você conseguia retardar um processo por muitos anos e assegurava impunidade. Ou o processo se prescrevia ou o condenado falecia;.
;Sangria;
O advogado Roberto Bertoldo, que representa vários políticos encrencados com a Justiça e costuma conversar com atores de diversos níveis de poder, confirma que o atual momento é uma incógnita para todos. E que ninguém sabe, a curto prazo, como sair do enrosco institucional no qual o país se meteu. É bom lembrar que, assim que o atual governo chegou ao poder, esperava-se que o ritmo da Lava-Jato fosse anuviado. Ficou famosa a frase do então ministro do Planejamento e hoje líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR): ;Primeiro estancar essa sangria;.
Constrangido, o peemedebista depois afirmou que se referia à crise econômica. Pode até ser. O fato é que a sangria não foi estancada. O PMDB do Rio implodiu nas investigações do juiz Marcelo Bretas; o PSDB entrou em convulsão por causa da J e da Odebrecht, sendo obrigado a mudar de presidente para tentar reencontrar o protagonismo político. E o presidente Michel Temer teve que queimar o capital político para convencer os deputados a, por duas vezes, brecarem pedidos de autorização de investigação elaborados pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot.
O temor de muitos é de que, com o PT enfraquecido e Lula fora de combate eleitoralmente ; com o risco, inclusive, de ser preso ;, a guilhotina se volte para as demais legendas com mais intensidade, como o PMDB e PSDB, para não se passar a imagem de uma justiça seletiva. ;A condenação de Lula é uma página importante da crise. Se virão outras condenações, isso se dará pela consequência dos processos e investigações, não por vingança;, disse o tesoureiro nacional do PSDB, deputado Sílvio Torres (SP).