Rosana Hessel
postado em 26/02/2018 06:00
A urgência na crise de segurança pública e a absoluta falta dos 308 votos mínimos necessários para que o governo aprovasse na Câmara a reforma da Previdência obrigaram o Planalto a mudar o foco para a intervenção federal no Rio. Mas não há como desconsiderar a existência do rombo nas contas previdenciárias. E ela ainda é agravada por outro motivo. Um levantamento feito pelo Ministério do Planejamento a pedido do Correio revela que o governo pagou R$ 56,76 bilhões em benefícios previdenciários via ações judiciais no ano passado. Isso equivale a uma despesa média mensal de R$ 4,73 bilhões, e essa conta, para piorar, cresce mês a mês.O assessor especial do Ministério do Planejamento Arnaldo Lima reconhece que não há como recuperar toda essa despesa judicializada e que, mesmo se isso fosse possível, essa medida não compensaria o adiamento da reforma da Previdência. Se a PEC fosse aprovada nos moldes da última proposta, a economia nas despesas com benefícios neste ano seria em torno de R$ 5 bilhões e chegaria a R$ 14 bilhões em 2019, custo adicional que agora deverá ser previsto no Orçamento do ano que vem.
Vale lembrar que o rombo previsto no Orçamento deste ano, apenas para o sistema de aposentadorias privado, o RGPS (Regime Geral da Previdência Social), deverá somar R$ 190,3 bilhões, valor 4,6% acima do deficit de R$ 182 bilhões registrado em 2017. Logo, esses pagamentos de benefícios via decisões judiciais representam nada menos que 31,2% do buraco do RGPS no ano passado e pouco mais de 10% dos R$ 542,29 bilhões efetivamente pagos para os beneficiários do setor privado em 2017, de acordo com dados do Planejamento.
Lima fez o levantamento e ficou surpreso com o tamanho dessa fatura que está incluída, normalmente, nas despesas obrigatórias. Mas nem sempre elas podem ser previstas, por se tratarem de ações judiciais. ;Esse é um primeiro mapeamento.Vamos tentar entender onde há decisões comuns e olhar detalhamento esses dados para ter uma noção se quem está recebendo esses benefícios tem realmente direito;, disse Lima. O detalhamento será feito pelo Comitê de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas Federais (Cemap), órgão interministerial coordenado pelo Planejamento. ;Após o detalhamento, vamos criar uma estratégia com nossos advogados para identificar as irregularidades, e o passo seguinte será um diálogo com o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) para adotar uma visão mais coordenada das decisões judiciais;, explicou.
Conforme os dados, apenas cinco benefícios respondem por 80% dos R$ 56,76 bilhões pagos via decisão judicial. A liderança ficou empatada com as aposentadorias por idade e por tempo de serviço, com R$ 12,8 bilhões cada uma. Em seguida, a aposentadoria por invalidez, com R$ 9,5 bilhões, e, na sequência, pensão por morte (R$ 5,6 bilhões) e auxílio-doença (R$ 4,4 bilhões).
Comprovação
De acordo com Lima, 91% das ações judiciais para o pagamento das aposentadorias por idade beneficiam trabalhadores rurais. ;Como esse beneficiário não trabalha com carteira assinada e não existe uma comprovação de contribuição ao INSS, apenas testemunhal ou de uma carta de sindicato, a judicialização acaba sendo mais provável;, destacou. O técnico contou que os casos dos auxílios-doença e aposentadorias por invalidez também acabam indo parar na Justiça porque dependem, muitas vezes, de perícia médica. Já as pensões por morte acabam sendo questionadas nos tribunais em função de vários fatores.São Paulo é o estado com o maior volume em valores das despesas judicializadas entre os cinco principais elencados pelo Planejamento, respondendo por 23,56% do total, ou R$ 13,37 bilhões. Em segundo lugar ficou o Rio Grande do Sul, com R$ 6,59 bilhões. Minas Gerais, na terceira colocação, respondeu por R$ 5,20 bilhões; Santa Catarina, por R$ 4,13 bilhões; e, Paraná, por R$ 3,88 bilhões.
Lima contou que outro tema que será tratado pelo Cemap, em conjunto com o Ministério da Saúde, serão os custos judicializados com medicamentos, que, segundo ele, atingem mais de R$ 1 bilhão por ano. A União acaba arcando com os custos quando famílias entram na Justiça para terem acesso a remédios de alto custo em casos de enfermidades graves. ;Talvez não seja agora que iniciaremos essa discussão, mas ela será retomada em algum momento;, destacou.