Agência France-Presse
postado em 07/04/2018 08:44
São Bernardo do Campo, Brasil - Foi a instituição que o viu crescer como líder sindical durante a ditadura militar que acabou lhe propulsando à presidência do Brasil e, mais recentemente, palco para o velório de sua esposa.
O Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo está intimamente ligado à vida do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, em um dos seus momentos mais difíceis, converteu-se agora em um "fortim" improvisado onde tenta se proteger da prisão.
"Ajudar Lula é ajudar o povo. Vamos resistir com ele", disse Nagela Royani, uma jovem do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), de 25 anos, deitada em um colchão diante da sede sindical.
Protegido por centenas de partidários que fazem um cordão de isolamento ao seu redor, o líder de esquerda, de 72 anos, está no segundo andar do prédio desde que um juiz emitiu, na quinta-feira, uma ordem de prisão de mais de 12 anos por corrupção, ignorando a proposta para se entregar.
Onde Lula está podem entrar apenas lideranças políticas, seus advogados, alguns representantes de movimentos sociais, familiares, ou os que conseguem convencer os vigilantes após passar por uma longa fila e, com sorte, conseguir uma "selfie" de presente.
A imprensa, recebida com reservas neste "bunker" onde quase todos a culpam parcialmente por esta situação "injusta", tem de se contentar com as aparições esporádicas de Lula através da janela.
O silêncio mantido pelo presidente mais popular da história do Brasil e favorito para as eleições presidenciais de outubro contrasta com o som do funk e com os discursos que saem a toda hora do carro de som na porta do sindicato.
Preparar para a vigília
Militantes de esquerda, do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e estudantes procedentes de todas as partes do Brasil entram e saem sem restrições deste prédio de vidro, quase sem móveis e repleto de cartazes que dizem "Não à prisão de Lula".
Sentado no chão do "hall" e usando uma mochila como almofada, Flavio Bento, um estudante de história de 25 anos, tenta se recompor da viagem de mais de sete horas que fez do Rio de Janeiro em um ônibus da União das Juventudes Socialistas.
Em sua mochila, tem apenas algumas camisetas, um agasalho e bandeiras que usará como colchão. Outros trouxeram "leite de magnésia" para se proteger de eventuais bombas de gás lacrimogêneo da polícia.
"É preciso estar sempre preparado. Vivemos em um estado de exceção, no qual a Constituição foi rasgada. Sempre dizemos: não temos medo de morrer, a revolução deve seguir", afirma este jovem, o primeiro em sua família a chegar à universidade, graças aos programas que Lula criou.
Indignadas mas mais tranquilas estavam as mulheres do grupo de Clara Piñol, uma aposentada de 64 anos que discutia a situação de Lula no terceiro andar do sindicato.
"Este local aqui é como se fosse meu. Muitos jovens dormem no palco de madeira, mas se fizer isto não levanto mais. Assim não durmo, mas quero ficar aqui", disse Piñol.
Apesar da preocupação com uma eventual incursão policial para deter Lula, uma roda de samba começa e pode ser ouvida inclusive no restaurante lotado do quarto e último andar do Sindicato.
Ulisses de Castro, operário de uma fábrica de automóveis, de 50 anos, dança animadamente com dois companheiros.
"É uma maneira do sindicato levar alegria ao povo. Aqui há gente que está muito tempo sem descansar, sem comer, sem asseio (...), estamos muito preocupados e momentos como este nos ajudam a ficar mais unidos", afirmou.
Como um bálsamo, de fundo, o estribilho de um famoso samba diz: "Tristeza, por favor vá embora".