Gabriela Vinhal - Enviada especial
postado em 29/04/2018 08:00
Atibaia (SP) ; A quase 20km do centro da cidade localizada a uma hora de carro de São Paulo, o sítio Santa Bárbara, peça central do próximo processo contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a ser julgado, tornou-se uma verdadeira atração turística na região. Não apenas entre os moradores, mas também entre os visitantes, que vão ao município distante 66km da capital paulista para fugir da poluição e da rotina exaustiva da metrópole.
Desde março de 2016, quando a propriedade foi alvo pela primeira vez da Operação Lava-Jato, o clima na região mudou. "Foi uma correria doida no dia em que os ;polícia bravo; vieram aqui. Era helicóptero para tudo quanto é lado. Foi assim que descobrimos quem poderia ser o dono do lugar. Nunca imaginamos", conta um morador da região.
Outra moradora diz que, daquele dia em diante, não deixou mais de ser perguntada sobre o local. "Todo mundo que não é daqui, mas vem passar alguns dias, pergunta onde é o ;sítio do Lula;. Sempre tem alguém interessado", conta, explicando que está a caminho da casa da irmã, que mora a dois lotes do Santa Bárbara.
A acusação é que o ex-presidente recebeu das empreiteiras OAS, Odebrecht e Schahin propinas no valor de R$ 1 milhão, por meio de reformas no lugar. Localizada no bairro Portão, a propriedade fica em uma viela perpendicular à rua principal da localidade. A entrada, um tanto quanto discreta, tem largura que permite a passagem de apenas um carro por vez. O jardim que dá acesso ao local está bem cuidado. A pintura, em dia.
Sem sinal de Lula
Quem mora nas redondezas vê pouco movimento de entra e sai do Santa Bárbara ; a não ser do caseiro, que mora na chácara com a mulher, o enteado e o filho. Vai à cidade com um jipe cinza, que pertence à propriedade.
A entrada para a chácara é escondida, sendo preciso saber com precisão onde é localizada ; ou conhecer muito bem a região. No acesso, há uma ponte estreita, que parece não receber manutenção há algum tempo. Não há sinalização com o nome da propriedade, como todas ao redor têm.
O Correio tocou a campanhia por mais de cinco vezes, mas não houve retorno. Questionados sobre a presença de Lula na região, antes de ser deflagrada a operação, moradores relatam que nunca o viram. ;Se passou por aqui, foi em um carro com vidro escuro. Nunca andou a pé também, senão alguém o teria visto;, diz um atibaiano.
É possível ver duas câmeras de segurança. O aviso "Cuidado com o cão" anuncia a presença de um cachorro de médio porte, parecido com o fila brasileiro. O bairro é envolto por uma mata verde, composto por chácaras e vilas de casas mais simples. Distante do centro de Atibaia, o local é silencioso, onde, durante o dia, pode-se observar moradores fazendo caminhada pela avenida, que não tem calçada ou ciclovia.
Para a população, a polêmica nada influenciou na vida da comunidade. Não sabem se o proprietário é o petista, ou se é um colega dele. Mas, como em um consenso, agradecem a antena de telefone instalada no portão. ;Não sou petista. Ainda não sei nem em quem vou votar este ano. Mas uma coisa é certa: depois que instalou a antena da Oi aqui, nossa vida mudou;, comemora, rindo, uma moradora. No local, a internet 3G não funciona, tampouco há sinal telefônico de outras operadoras para realizar ligações.
Entenda o processo
O segundo processo que envolve o sítio de Atibaia está cada vez mais próximo da sentença, mas ainda não há uma data para o juiz Sérgio Moro bater o martelo. O Supremo Tribunal Federal (STF), no entanto, decidiu retirar trechos de delações dos ex-executivos da Odebrecht dos processos que envolvem o petista. Para três dos cinco ministros, as partes nas quais os delatores relatam o suposto repasse de verbas indevidas para Lula, incluindo a reforma de um sítio de Atibaia (SP), não estão relacionadas diretamente com a Petrobras, que é a investigação original da Lava-Jato. Portanto, não deveriam ser consideradas por Moro.
Contudo, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, disse, na sexta-feira, que pretende recorrer contra a decisão da segunda turma do Supremo. Ela deu a declaração em Paris, onde tinha agenda sobre a cooperação com o Ministério Público francês sobre a corrupção envolvendo os Jogos Olímpicos, a compra de submarinos e o caso Areva. Segundo Dodge, um estudo está sendo realizado pela Procuradoria-Geral da República, mas ainda vai aguardar a publicação do acórdão da decisão para definir ;qual recurso é cabível; e ;qual é o limite da impugnação;.
Dodge ressaltou que o tema é ;uma de suas prioridades no retorno ao Brasil; e que quer entrar com o recurso. ;O ajuizamento está sendo estudado, (assim como) as possibilidades de haver recurso sobre o assunto;, disse. ;A minha expectativa é de que caiba um recurso e que nós consigamos apresentar um argumento cabível de ser examinado nesta fase processual e nesta situação.; (GV)
Os indícios
Confira informações que, segundo o Ministério Público, ligam Lula ao sítio
; A relação próxima entre os proprietários formais com o ex-presidente e seus familiares
; Veículos de utilização do ex-presidente teriam ido ao sítio mais de 250 vezes entre 2011 e 2016
; Agentes de segurança pessoal do petista também estiveram no local por centenas de vezes e, inclusive, instalaram câmeras de segurança na propriedade
; Mensagens eletrônicas foram trocadas entre o caseiro da chácara e o Instituto Lula
; A localização de diversos bens pessoais de Lula e de seus familiares, como vestuários, vinhos e um barco, que leva o nome do petista e da mulher Marisa Letícia
; A apreensão de notas fiscais emitidas com o nome da ex-primeira-dama sobre bens encontrados no sítio. Há também faturas em nome de auxiliares de Lula e de empregados da Odebrecht no apartamento do ex-presidente em São Bernardo relacionadas a bens encontrados na chácara
; Dois pedalinhos que ficam estacionados no lago do sítio com o nome dos dois netos do ex-presidente: Pedro e Arthur
; A cozinha do local foi reformada pela mesma empresa que fez a cozinha do tríplex do Guarujá (SP)