Politica

Decisão do STF sobre foro privilegiado gera confusão jurídica

O ministro Dias Toffoli destacou que o ideal, para manter a segurança jurídica, seria aplicar para todos as 54 mil autoridades que têm julgamento com base na função que exercem

Renato Souza, Deborah Fortuna
postado em 05/05/2018 07:00
Ao restringir o foro privilegiado apenas para crimes cometidos durante o mandato parlamentar, e que estejam ligados às atividades legislativas, o Supremo Tribunal Federal (STF) deixa em aberto uma série de dúvidas. Juristas e os próprios ministros afirmam que é complexa a tarefa de decidir quais crimes estão ou não ligados ao cargo de deputados e senadores. Um dos exemplos é do deputado Jair Bolsonaro, acusado de fazer apologia ao estupro. As afirmações que resultaram em processo foram ditas nos corredores da Câmara e em entrevista a um jornal.

Por ter dito que a deputada Maria do Rosário ;não merecia ser estuprada;, Bolsonaro se tornou réu no Supremo Tribunal Federal (STF) em junho do ano passado, por suposta apologia ao crime de estupro e por injúria. As acusações, que são analisadas com base no Código Penal, ocorreram durante o mandato de deputado. Mas podem ser enviadas para a Justiça comum por não estarem relacionadas às atividades desenvolvidas na Câmara.

Durante a sessão que restringiu o foro privilegiado, mas não acabou com o benefício nem para parlamentares nem para outras autoridades, o ministro Dias Toffoli destacou que o ideal, para manter a segurança jurídica, seria aplicar para todos as 54 mil autoridades que têm julgamento com base na função que exercem. ;Temos que, de acordo com o princípio da isonomia, aplicar essa interpretação a todos. Temos que fixar a competência do STF para julgar membros do congresso exclusivamente quanto aos crimes praticados pela diplomação ; independente da relação ou não da função pública. Quanto aos demais cargos ; temos que ir além dos congressistas. E exclusivamente aos crimes praticados após a diplomação ou nomeação, com relação ou não da sua função. Nesse segundo item, atingiríamos um número muito expressivo de prefeitos;, afirmou.

Assim que tiver uma ação enviada para a primeira instância, os advogados do político poderão recorrer e alegar que a situação está relacionada ao exercício do mandato caso isso não seja absolutamente claro nas circunstâncias do fato. De acordo com a decisão do STF, mesmo que saia do cargo, o parlamentar ainda será julgado no Supremo se o processo estiver na fase das alegações finais, ou seja, quando estiver aberto o prazo para que o réu se manifeste.

Os processos relacionados aos parlamentares não mudam automaticamente para as instâncias inferiores. O professor Conrado Gontijo, especialista em direito penal da Fundação Getulio Vargas (FGV), afirma que os ministros terão que analisar caso a caso. ;A análise deve ser feita no caso concreto. De fato o STF reviu a interpretação que ele tinha sobre o foro por prerrogativa de função. Antes qualquer parlamentar que tivesse processo de natureza criminal poderia ser julgado no Supremo. Com essa decisão, o que fica no Supremo são só crimes que ocorreram durante o exercício do mandato e que tenham ligação com o cargo. Mas não existe uma predefinição disso;, afirma.

O professor lembra que o assunto pode ser debatido novamente no plenário do Supremo. Isso deve ocorrer por conta das divergências que devem surgir com o andamento dos processos. ;Isso ainda deve gerar repercussão posteriormente. Haverá casos em que não é tão simples avaliar se têm ligação com o cargo ou não. Pode ser que o MPF apresente a denúncia e o parlamentar, no seu direito de defesa, diga que deve ser julgado pelo Supremo. Como não existe uma definição objetiva, vai gerar muita discussão.;

A decisão do STF não tem repercussão geral, que se aplicaria automaticamente aos demais tribunais do país e poderia atingir prefeitos, deputados estaduais e juízes. Mas nada impede que sejam adotadas práticas parecidas, de acordo com a vontade de cada tribunal. (RS e DF)

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