Otávio Augusto
postado em 10/05/2018 13:01
Um pacote de medidas contra a violência deve ser votado até o final de junho na Câmara dos Deputados. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, deve colocar para avaliação do plenário projeto da comissão de juristas coordenada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, propõe alterações na legislação penal e nas formas de financiamento da segurança pública. Além do endurecimento das leis para crimes de tráfico de drogas, de armas e de formação de milícias, o texto prevê mais recursos para o financiamento do setor (leia O que muda).
Quatro pontos do texto apresentado por Moraes chamam a atenção de especialistas: o aumento do tempo máximo de prisão de 30 anos para 40 anos; a requalificação de furto com o uso de explosivos, sequestro-relâmpago, posse, porte e comércio ilegal de armas como crime hediondos; a mudança de instância de julgamentos desses crimes, que queria passado à Federal; e a permissão para a infiltração de policiais em redes sociais e aplicativos para investigação de organizações criminosas.
Se aprovado, os cofres da segurança pública ganharam reforço de mais de R$ 5 bilhões. O texto prevê a aplicação de 4% do dinheiro arrecadado com as loterias no setor ; estimativa de receita de R$ 240 milhões. Além disso, o Sistema S (Sesi, Senai, Sesc, Senac, Senar, Sescoop e Sest) também destinariam 25% de seus recursos para a segurança pública.
Para Ignácio Cano, especialista em Segurança Pública da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), as medidas produziram poucos efeitos na redução da criminalidade. ;Mais importante que endurecer as penas, é melhorar as condições de investigação para se identificar autores de crime. Essa mudança penal traz uma sensação de que se está fazendo alguma coisa, mas não é o suficiente;, destaca. Segundo ele, se a Justiça Federal sofreria um ;colapso; se passasse a julgar os crimes hediondos. ;Estão agregando mais crimes nesta categoria e não haveria a possibilidade de julgamento;, conclui.
Marcelle Gomes Filgueira, professora especialista em segurança pública da Universidade Católica de Brasília, concorda. ;Os números da violência só serão reduzidos com o investimento em inteligência e integração das instituições. Precisamos de ações que trabalhem de forma articulada as instituições e parar com ações pirotécnicas que não produzem de resultado;, explica. O professor de direito penal da Universidade de Brasília (UnB), Cléber Lopes de Oliveira, completa. ;É óbvio que mais dinheiro é bem vindo, mas investir apenas em segurança não é suficiente. É possível que haja melhoria, mas o que traz resultados é ação coordenada;, explica.
Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Eunício Oliveira, receberam anteprojeto na noite da última terça-feira. Durante a entrega do texto, o ministro Alexandre de Moraes disse que o conjunto de medidas traz mais celeridade às investigações, ao processo e, principalmente, à punição da criminalidade organizada. ;Rapidamente, a população brasileira vai perceber;, acrescentou.
Agora, uma comissão mista será criada para que deputados e senadores possam debater o tema e chegar a uma redação final , o que tornaria a tramitação mais rápida. ;Quanto mais rápido pudermos ter um projeto moderno que endurece a lei, propõe soluções para a questão do financiamento, separa crimes de menor potencial de crimes graves, melhor;, afirmou Maia, durante o recebimento do texto.
Políticas públicas
Valter Marques especialista em combate a violência da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) diz que o conjunto de medidas está atento sobretudo a questões punitivas. ;É uma visão punitiva, que criminaliza os indivíduos sem se discutir a trajetória social do crime. A violência não se reduz apenas a uma questão policial. Ela reflete toda a desigualdade social característica do Brasil. Para combater a criminalidade é preciso desenvolver política pública de trabalho, educação, saúde e distribuição de renda;, explica.
Segurança não é explicada somente pela falta de policiamento, argumenta Lia Zanotta Machado, presidente da Associação Brasileira de Antropologia e professora do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília (UnB). ;O aumento da violência no Brasil deve ser pensado como o resultado da falta de presença do estado com políticas públicas. Tivemos algumas experiências de policiamento comunitário que deram certo, mas agora o resultado é nulo. O que se esperava das unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) é que o estado estivesse presente também com escola, saúde, esporte e cultura. Isso não aconteceu;, explica.
O que muda
Veja algumas medidas do projeto coordenado pelo ministro Alexandre de Moraes
>> Aumento do tempo máximo de prisão de 30 anos para 40 anos;
>> Redução das prisões nos casos de crimes de menor gravidade;
>> Furto com o uso de explosivos, sequestro-relâmpago, posse, porte e comércio ilegal de armas de uso restrito se tornam crimes hediondos;
>> Crimes hediondos passariam a ser julgados pela Justiça Federal;
>> Casos de roubos e homicídios qualificados passam a receber novos agravantes, o que possibilita o aumento de penas
>> Permissão para policiais se infiltraram em redes sociais e em aplicativos para investigação de organizações criminosas;
>> Criação de colegiados de juízes para a tomada de decisões a respeito de milícias e traficantes;
>> Aumento do tempo máximo de três anos que um menor de idade pode ficar recolhido após cometer uma infração;
>> Aplicação de 4% do dinheiro arrecadado com as loterias em segurança pública;
>> Destinação de 25% dos recursos do Sistema S para a segurança pública.