Politica

Fim da greve dos caminhoneiros é novo teste para o governo Temer

Palácio do Planalto quer a retomada do diálogo com a Câmara dos Deputados e o Senado

Rodolfo Costa
postado em 03/06/2018 07:59
Temer espera que manifestações não ganhem corpo a partir de agora
A esperança do governo Michel Temer é que a saída de Pedro Parente do comando da Petrobras dê fôlego ao governo. A queda do executivo da Petrobras abre as portas para mudanças na política de reajuste de preços dos combustíveis. A medida é importante sob a ótica política por dois motivos. Possibilita ao Palácio do Planalto a retomada do diálogo com a Câmara dos Deputados e o Senado. E pode evitar que elevações do custo da gasolina deem motivos para a população ir às ruas manifestar contra o governo.

Há cinco anos, insatisfações com aumentos nos valores de passagens de transporte coletivo levaram brasileiros às ruas, em junho, num processo que deu início à derrocada da ex-presidente Dilma Rousseff. A situação atual começa a despertar preocupação com o descontentamento da população. Os primeiros sinais do desgaste foram dados com a greve dos caminhoneiros, que contou com apoio de pessoas identificadas com a esquerda e a direita.

Após pronunciamento de anúncio de acordo com a categoria, Temer lidou com os primeiros ;panelaços; em bairros nobres de diferentes capitais. Manifestantes tomaram as ruas nos primeiros dias da última semana em protestos com pautas diversas, mas todas envolvendo em comum o apelo pela redução dos combustíveis. A greve dos caminhoneiros expôs a fragilidade do governo em lidar com a situação. Não apenas sob o ponto de vista negocial com a categoria, mas também sob a ótica do diálogo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE). A sintonia que antes existia entre Planalto e Congresso deu lugar a um distanciamento. Diante das discussões do alto custo do óleo diesel e sobre como reduzi-lo, os presidentes das duas casas do Parlamento criticaram a atual política de reajuste de preços da Petrobras e acenaram com uma trégua apenas para aprovar as medidas de interesse dos transportadores.

Sem Parente na Petrobras, o governo pode, agora, construir uma narrativa que possibilite a retomada do diálogo com o Congresso, avalia o analista político Paulo Calmon, diretor do Instituto de Ciências Políticas da Universidade de Brasília (UnB). Uma eventual ingerência sobre a estatal, no entanto, não assegurará plena governabilidade a Temer. Mas pode evitar uma derrocada melancólica e dar fôlego para a pré-candidatura emedebista de Henrique Meirelles, ex-ministro da Fazenda. ;No frigir dos ovos, permitirá que o governo construa um espaço novo de negociação, reforçe acordos, e proponha novas alianças;, analisa.

Interferência

Em pronunciamento na sexta-feira, Temer declarou que não haverá, por parte do governo, ;qualquer interferência política de preços; da estatal sob o comando do próximo presidente, Ivan Monteiro. Não foi claro, entretanto, se o modelo atual será mantido. O discurso não convence o economista-chefe da corretora Spinelli, André Perfeito. ;Não tenho a menor dúvida que haverá congelamento do custo de combustíveis. A atual gestão está politicamente insustentável e vai colocar a Petrobras para servir o povo;.

[SAIBAMAIS]Os ganhos políticos que o governo pode acumular com o represamento de preços dos combustíveis, porém, são incertos, adverte Perfeito. Para ele, o congelamento nos combustíveis manterá o dólar subindo e também provocará uma alta da taxa básica de juros (Selic) em outubro. Tal movimento trará efeitos sobre a inflação, obstruirá uma demanda por crédito e freará o consumo das famílias. O efeito prático disso deve, nos cálculos dele, levar o Produto Interno Bruto (PIB) a crescer 1,6%, abaixo da previsão da equipe econômica do governo, de 2,5%. Um crescimento mais baixo, por sua vez, compromete uma geração maior de empregos e renda. ;Todo esse cenário deságua em uma desidratação do capital político;, avalia.

Coligação

A lentidão na retomada da economia é uma das variáveis que podem comprometer os bônus políticos com mudanças na política de preços da estatal. Outra é a possibilidade de Temer ser denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) uma terceira vez, situação que não joga a favor do governo e da pré-candidatura de Meirelles, que poderia absorver os impactos negativos da decisão.

Para o especialista em política brasileira Sérgio Praça, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), não seria uma surpresa o cenário turbulento empurrar de vez o MDB a propor uma coligação com o PSDB. ;Se encaminha para isso. E o MDB ainda tem muito a oferecer, como tempo de televisão na propaganda eleitoral gratuita, fundo eleitoral, e a estrutura política nos estados;, analisa.

O ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, Carlos Marun, avalia a situação política e eleitoral de outra forma. Para ele, o cenário atual não aponta nenhum candidato de centro forte o suficiente para indiscutivelmente atrair as outras pré-candidaturas do espectro político. Por esse motivo, ele não vê motivos para o MDB abandonar a campanha de Meirelles. ;Não tem candidato com viabilidade no campo do bom senso. O caminho não é esse, de procurar coligação, mas pode ser o de construção de um projeto;, considera.

A análise eleitoral do governo após a greve dos caminhoneiros ainda está sendo feita. ;Obviamente que a crise terá impactos e teremos que fazer uma avaliação. Mas ainda não fiz;, admite Marun. Ele afirma, no entanto, que as manifestações nas ruas recordam mais o período que antecedeu a instauração do regime militar em 1964 do que as manifestações de junho de 2013. ;Tivemos há 54 anos gente pedindo nas ruas uma intervenção e a esquerda provocando. Agora, tivemos um lado pedindo (caminhoneiros) e outro provocando (greve dos petroleiros). A diferença agora foi a absoluta observância dos militares à legalidade;, justifica.

Temor de fake news

O Palácio do Planalto produziu vídeos para redes sociais em que nega a notícia de que haverá novo movimento de paralisação dos caminhoneiros nos próximos dias. O material diz que ;caminhoneiros de verdade; voltaram ao trabalho com o acordo fechado com o governo e a suposta mobilização é organizada por radicais que ;tentam botar medo nas pessoas espalhando mentiras por aí;.

;É importante que você não acredite em qualquer coisa que chegue para você nos grupos da família ou do trabalho;, diz o vídeo. O governo defende no material que todas as reclamações dos motoristas foram atendidas, como a redução do preço do diesel, a adoção de uma tabela nacional de fretes e a reserva de 30% do transporte da Conab para autônomos.

A estratégia do governo ocorre como uma ação de contrainformação diante de caminhoneiros independentes que estariam se mobilizando para protestar hoje e amanhã em Brasília. Organizadores dizem, nas mesmas redes sociais, que poderiam levar até 50 mil caminhões para a capital federal. Em algumas mensagens, manifestantes sugerem estocar comida e encher o tanque de combustível.

O Planalto diz que há ;aproveitadores; se mobilizando ;para se promover;. ;Não acredite nessas pessoas. E tenha consciência na hora de passar para frente informações. Na dúvida, não passe;, conclui um dos vídeos.

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