Politica

Especialistas: crise, violência e corrupção abastecem onda conservadora

Pontos negativos fortalecem sentimento de mudança radical no país e abrem espaço a candidatos de frentes como a evangélica, a da bala e a rural

Letícia Cotta*, Rodolfo Costa
postado em 05/06/2018 06:00
Manifestações em vários pontos do país, durante paralisação de caminhoneiros, pediam intervenção militar para estancar os problemas

O pensamento conservador ganha força no Brasil. A onda está se disseminando pelas ruas e ganhou eco em manifestações de apoio à intervenção militar. Embora a defesa de um regime liderado pelas Forças Armadas não encontre respaldo na própria cúpula do poder militar, especialistas avaliam que a tendência é de que o movimento fortaleça frentes parlamentares que atualmente dominam o Congresso Nacional, como a evangélica, a da segurança pública e da agropecuária, também conhecidas como bancadas da bala e ruralista. Atualmente, os integrantes das três respondem por cerca de 70% dos 513 deputados da Câmara.

A greve dos caminhoneiros foi o empurrão que faltava para levar brasileiros defensores do regime militar às ruas. Faixas com frases como ;intervenção militar, buzine; foram estampadas em veículos parados no estacionamento do Estádio Mané Garrincha, em Brasília, e nas estradas, durante os dias de paralisação. Para o sociólogo e cientista político Paulo Baía, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), esse movimento está associado ao desejo de ter problemas facilmente resolvidos. Essas pessoas acreditam que a presença dos militares seria capaz de melhorar educação, saúde, segurança pública no país, além de garantir o combate à corrupção.

;Eles (intervencionistas) têm a ideia mágica, pelo que eu já pude conversar com alguns deles, de que a intervenção militar resolve tudo. Eles não têm um projeto, mas consideram que uma base militar seria capaz de amenizar a angústia que sentiram nos últimos dias;, disse Baía. O que começou com uma greve por redução de impostos e do preço do óleo diesel, encontrou ressonância no desejo de mudança radical de alguns grupos, e o discurso contra corrupção voltou ao centro dos discursos.

Embora o professor da UFRJ avalie os pedidos por intervenção militar como uma onda com ideologias mais restritas que o movimento conservador, ele não descarta que os anseios de intervencionistas desaguarão em votos para candidatos conservadores, como o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ), pré-candidato à Presidência da República. O apelo pelo ex-militar também tende a favorecer candidaturas de aliados do parlamentar, em um efeito cascata. ;As bancadas da bala, ruralista e evangélica têm um lastro social e certamente vão crescer em outubro, com esses votos e outros;, ponderou.

O crescimento da onda conservadora não é um fenômeno recente, mas ganhou força desde o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e dos escândalos de corrupção desbaratados pela Operação Lava-Jato, avalia o sociólogo e cientista político Alessandro Farage, coordenador da Instituto RioTech. ;O brasileiro teve várias experiências traumáticas nos últimos anos. Uma crise econômica que elevou o desemprego e intensificou problemas de segurança pública, com ampliação de violência e crimes. Tudo isso em um cenário em que a esquerda ficou muito queimada pela forma como o PT saiu do poder, mas também pelo descrédito dos demais partidos;, analisou.

Posição privilegiada
A defesa da segurança e o discurso contra a corrupção ganharam o centro das atenções no discurso conservador. Por esse motivo, militares da reserva, policiais militares e trabalhadores ligados a essas categorias ganham posição privilegiada na pauta eleitoral, sobretudo candidatos mais personalistas, que apoiam agendas próprias, e não do partido. ;Ficou mais fácil para um político que não é identificado com uma legenda passar a ideia e imagem de honestidade;, ponderou o sociólogo e cientista político Fábio Metzger, professor da Uniesp.

Os evangélicos ganham eco em aspectos semelhantes, principalmente em eleitores que identificam a necessidade de defender assuntos ligados a questões morais e costumes, pondera o especialista.

Para o coordenador da Frente Parlamentar da Segurança Pública, deputado Alberto Fraga (DEM-DF), houve um enfraquecimento da esquerda. ;A esquerda mergulhou o país na insegurança pública, na desmoralização e na inversão total dos valores. Tudo isso serve de bandeira para o crescimento de outras bancadas;, avaliou.

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