Deborah Fortuna
postado em 14/06/2018 06:00
O Supremo Tribunal Federal (STF) deve decidir hoje sobre a legalidade das conduções coercitivas contra investigados. O julgamento começou há duas semanas, mas, ontem, a decisão avançou no sentido de que a medida continue sendo aplicada. Durante o julgamento, quatro ministros votaram pela constitucionalidade da prática, e dois votaram pela proibição. Ainda faltam cinco magistrados.
O resultado de hoje pode interferir diretamente na Operação Lava-Jato e em outras investigações. Apesar desse recurso ser utilizado há quase 30 anos, as controvérsias sobre o tema só começaram durante as ações no âmbito da Lava-Jato, que atingiu integrantes da cúpula do poder Executivo e Legislativo. Apenas nessa operação, a condução foi utilizada mais de 200 vezes. Desde então, a medida já atingiu casos emblemáticos, por exemplo, o então presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, Jorge Picciani (MDB), e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que foi conduzido a depor em março de 2016.
O debate chegou ao Supremo por duas Ações de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs), propostas pelo PT e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O partido afirma que o ;preceito fundamental violado é a liberdade individual, assegurada aos indivíduos para que não sejam compelidos, de qualquer forma e por qualquer meio, a produzirem provas contra si mesmo em processos criminais;. O pedido foi feito em abril de 2016.
No ano passado, o relator do caso no Supremo, ministro Gilmar Mendes, proibiu provisoriamente a condução coercitiva. Após essa decisão, foi verificada que as prisões temporárias cumpridas pela Polícia Federal cresceram. Na época, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, recorreu da decisão e pediu o restabelecimento das coercitivas. Agora, cabe ao plenário da Corte decidir se a medida continua suspensa ou não.
Julgamento
Para se formar maioria na Corte, é necessário que pelo menos seis ministros concordem com a decisão. Na semana passada, o ministro-relator Gilmar Mendes já tinha votado contra a condução coercitiva, por entender que ela viola os direitos do investigado. Ontem, o julgamento foi retomado com o voto do ministro Alexandre de Moraes, que abriu uma divergência parcial. Ele votou para manter a condução, mas com ressalvas. Segundo Moraes, a medida ;representa expressiva privação da liberdade de ir e vir;, e só pode ser adotada se o investigado não atender a intimação prévia para o interrogatório. ;Os órgãos estatais não podem ser impedidos de exercer o seu ato previsto na legislação. Entre eles, a determinação compulsória perante autoridade competente para realização de interrogatório. Mas, desde que o investigado não tenha atendido à intimação, injustificadamente;, opinou.Em seguida, o ministro Edson Fachin, relator dos processos da Lava-Jato no STF, abriu total divergência de Gilmar Mendes e abriu um terceiro entendimento dentro da Suprema Corte. Segundo o magistrado, a condução pode ser decretada caso o investigado não atenda à intimação, ou em substituição a medidas mais graves, por exemplo, a prisão preventiva ou temporária. Durante o voto, Fachin falou sobre as desigualdades entre o tratamento daqueles que têm dinheiro e poder em comparação àqueles que não têm.
A condução coercitiva está prevista no artigo 260 do Código de Processo Penal. O texto explica que a medida deve ser tomada ;se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à presença;.
Durante o julgamento, a ministra Rosa Weber acompanhou o relator Gilmar Mendes. Do outro lado, Fachin foi acompanhado por Luís Roberto Barroso e Luiz Fux. ;A condução coercitiva é constitucional com força nas medidas cautelares que são autorizadas pelo magistrado, assegurada a presença do advogado, assegurado o direito ao silêncio, assegurada a integridade física do investigado e, evidentemente, que qualquer abuso, qualquer erro, deve ser coibido;, afirmou Fux.