Politica

Ameaça de alta abstenção muda estratégias de marqueteiros políticos

Desinteresse do eleitor, a depender do candidato na disputa, pode atrapalhar ou facilitar a chegada ao 2º turno

Deborah Fortuna
postado em 26/06/2018 06:00
Campanha de 2014 no Distrito Federal: avaliação é que neste ano o desencanto e, por tabela, a abstenção pode chegar a 40%

O alto número de abstenções nas eleições de segundo turno para eleger o novo governador do Tocantins, no último fim de semana, confirmou aquilo que já se sabia: o desencanto do eleitor brasileiro. O desafio, a partir de agora, para políticos pré-candidatos às eleições de 2018 é criar estratégias específicas para esse público. Em alguns casos, a depender do candidato, o número de desistências pode ser positivo. Em outros grupos, a população não sair se casa, pode ter um efeito devastador.

O Correio conversou com especialistas sobre como os votos não válidos podem interferir na corrida eleitoral. A tática é uma novidade, por mais que o histórico das últimas eleições mostre um aumento na descrença dos eleitores. Pesquisas apontam que o desencanto pode chegar a 40%. Isso acaba com o mito de que esse resultado poderia invalidar uma campanha inteira. Isso é uma notícia falsa que se espalhou nos últimos anos, mas que não condiz com a realidade, já que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) conta apenas os votos válidos nas eleições.

Mas isso não significa que tal conta não interfira na disputa, por exemplo, à presidência da República. Pesquisas recentes mostram que sem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições o número de eleitores que não votam aumenta. Pré-candidatos que buscam os votos de Lula, como Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (REDE), Manuela D;avila (PCdoB) e Guilherme Boulos (PSol) têm a tarefa de convencer o eleitor a sair de casa para votar neles.

Na mesma equação, um candidato como Jair Bolsonaro (PSL) pode sair favorecido, pois a chance do voto de Lula ir para o ex-militar é mínima. Assim, é melhor para Bolsonaro que esse público não vote. ;Todos os candidatos que são oposição a quem poderia receber os votos consolidados (de Lula, caso ele não dispute a eleição) vão se beneficiar com a eventual ausência (do petista) ou com os botões de nulo e branco;, disse a especialista em direito eleitoral e professora da Faculdade de Direito do IDP-São Paulo Marilda Silveira.

Ainda para a especialista, a abstenção de votos sempre foi elevada no Brasil, mas o que aconteceu de 2013, no auge nas manifestações, até 2018, é que esse número cresceu significativamente nas eleições. Para conseguir conquistar os votos dos eleitores que querem se abster, é necessário rever a estratégia eleitoral. ;Ela deve mudar para convencer as pessoas, porque acaba que todos os candidatos podem sofrer consequências. As eleições do Tocantins foram bem significativas nesse sentido;, afirmou Marilda.

As pesquisas recentes indicam que o número de abstenções deve crescer ainda mais este ano, em relação às últimas eleições gerais, em 2014. O último Datafolha indica que um em cada quatro brasileiros já admite que votará nulo ou em branco (23%). Em janeiro, o índice era de apenas 8%. Outra pesquisa que também indicou um resultado parecido foi a feita pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), em maio deste ano, que indicava 20,4% de eleitores que admitiam votar nulo ou em branco. Nessa pesquisa, esse era o segundo índice mais alto, perdendo apenas para os indecisos, com 39,7%. Nos cenários simulados, que estimulam o voto, os nulos e abstenções chegam a 30,5% no primeiro turno. Questionados sobre um possível segundo turno, há casos em que esse número pode chegar a mais da metade dos eleitores, com 52,8%.

Para o advogado eleitoral do escritório Boaventura Turbay, Daniel Falcão, ainda há muito para ocorrer até as eleições de outubro deste ano, e ainda é possível isolar um aumento nas abstenções, nulos e brancos. ;Está muito cedo para isso. A propaganda eleitoral só começa dia 16 de agosto, então ainda é cedo. Não acho que vá haver um aumento dos votos não válidos. Claro em que eleições proporcionais isso realmente pode acontecer, mas não vejo como isso pode acontecer para as presidenciais;, comentou o professor. ;Mas, se uma pesquisa no final de agosto, começo de setembro, apontar isso, podemos ficar preocupados. Por enquanto, acho cedo. As pessoas estão revoltadas com os políticos, e isso é natural devido aos últimos acontecimentos;, avaliou.

O consultor de comunicação, marketing digital e gestão de crise, Marcelo Vitorino, acredita que não há uma ;fórmula mágica; para superar esse problema, já que o eleitor está desacreditado. Apesar de Vitorino considerar que o caso de Tocantins seja diferente, já que houve uma ruptura de um mandato por causa da Justiça, é possível que haja um grande volume também de abstenções nas eleições de outubro, mas isso não deve ser tão diferente de 2014. ;Nas eleições passadas, ficamos perto dos 30% de votos não-válidos. Este ano, podemos ter algo parecido. Pode chegar até 38%;, afirmou. Isso acontece porque, para ele, este ano há um leque maior de escolhas. ;Já aconteceu outras vezes, por exemplo, no caso da Marina Silva. Pessoas que não queriam o Serra nem a Dilma, votavam nela. Depois, foi o mesmo com o Aécio. Você não tinha opção, e hoje você tem;, avaliou.

Sem motivação

A eleição que elegeu Mauro Carlesse teve 75% dos votos válidos, ou seja, 368,5 mil votos. Mas, de acordo com os dados divulgados, houve grande abstenção por parte dos eleitores. Com mais de 1 milhão no estado, apenas 663,2 mil foram às urnas. Os votos em branco somaram 17,2 mil (2,59%), e os nulos 155,6 mil (23,4%). No entanto, a soma dos percentuais de pessoas que não foram votar, assim como aquelas que anularam o voto, ultrapassou mais da metade do eleitorado, com 58,3% do total. As eleições foram convocadas no estado, após o governador eleito em 2014, Marcelo Miranda, ser cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por arrecadação ilícita de recursos durante o período de campanha.

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