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Por que as eleições presidenciais deste ano lembram as de 1989

Disputa acirrada, presidente desgastado, PT e PDT buscando a hegemonia no campo da esquerda. Cenário atual lembra muito o da primeira eleição pós-ditadura

Alessandra Azevedo
postado em 07/08/2018 06:00
Debate com os principais candidatos em 1989: semelhanças e diferenças com a disputa deste ano
Terminadas as convenções partidárias, o saldo de concorrentes ao Planalto é de 13 nomes ; número que ainda pode diminuir até o fim do prazo para os registros oficiais, em 15 de agosto. As pesquisas eleitorais apontam para uma corrida acirrada entre os primeiros colocados até aqui. Além disso, PT e PDT disputam a hegemonia da esquerda e o ocupante do Planalto amarga índices negativos de popularidade. Tudo muito parecido com 1989, as primeiras eleições depois da ditadura militar.

Naquele ano, 22 candidatos disputaram a Presidência da República. E, assim como tem sido em 2018, a disputa entre PT e PDT pela hegemonia da esquerda foi acirrada. Mas, apesar das semelhanças, os momentos históricos não poderiam ser mais diferentes: no fim da década de 1980, um dos motivos para o grande leque de alternativas era a empolgação pela retomada do sistema democrático, da qual todos os partidos queriam fazer parte e, por isso, lançaram candidatos próprios. Já este ano, é o contrário, explicam especialistas. A desesperança da população, a resistência da crise econômica e a falta de credibilidade no sistema político, juntos, abrem espaço para candidaturas ; não pela empolgação, mas pela desilusão. ;São situações muito distintas. O sistema partidário brasileiro hoje está muito mais rígido, e o jogo está muito mais claro que no passado, quando a fragmentação se devia à novidade;, avalia o cientista político Carlos Pereira, da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresa, da Fundação Getulio Vargas (Ebape/FGV).

Apesar dos contextos diferentes, as duas eleições em questão ocorrem em meio a algum tipo de crise. Em 1989, a inflação alta, sem sucesso do governo de José Sarney em contê-la, foi uma das razões para que 22 vários partidos se prontificassem, nas campanhas, a resolver o problema. Este ano, a insatisfação tem como pano de fundo uma crise econômica e um patamar elevado de desemprego. ;Estávamos numa crise econômica muito séria, também profunda, só que à época era de hiperinflação. Essa circunstância em relação à economia é semelhante;, lembra Geraldo Tadeu Monteiro, coordenador do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas sobre a Democracia, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

O cientista político Sérgio Praça, da FGV, diz que, além da insatisfação com a economia, havia o descontentamento com o partido do governo, na época, o PMDB, atual MDB. ;Eles estavam no poder desde 1985 e dominaram a Assembleia Constituinte. Não foi à toa que o Ulysses Guimarães (MDB), nome forte e conhecido, teve só 3% dos votos. As pessoas queriam renovação, e muitos partidos se prontificaram a isso;, explica. Em 2018, a insatisfação é mais profunda e afeta diretamente várias legendas, com destaque a PT, PSDB e MDB. ;Em 1989, apesar do desgaste do então PMDB, que pagou o preço naquele momento por ter apoiado o governo Sarney, o sistema partidário ainda era muito recente, oriundo das mudanças ocorridas a partir do início dos anos de 1980, e gozava de prestígio junto ao eleitorado;, compara o cientista político Ricardo Ismael, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Outra semelhança com as eleições de 1989 é a baixa popularidade do presidente da República, que tira da disputa a figura do ;candidato do governo;, que costuma participar, com destaque, da corrida eleitoral. A situação de Michel Temer, que hoje conta com 3% de popularidade, se assemelha à de José Sarney naquela época ; em setembro de 1989, ele tinha 5% de popularidade. Isso abre espaço para que outro candidato tente ;roubar; os votos que, em um cenário normal, iriam para o nome governista. ;O governo não estar bem avaliado é um fator para que aumente o número de candidaturas. O candidato do governo, quando tem popularidade, sempre começa com vantagem. Veja FHC, Lula, Dilma, que foram reeleitos. Mas, quando o governo está mal-avaliado, não lança candidato e abre um espaço que todo mundo quer ocupar;, explica Geraldo Tadeu.

Em 2018, além da crise insistente, outra crise assombra os eleitores e é aproveitada pelos políticos: a institucional. Os escândalos de corrupção levam a um quadro com mais candidatos que o normal ; a média foi de nove por pleito, entre 1994 e 2014 ;, diz Carlos Pereira, da FGV. ;Na primeira eleição depois da redemocratização, o jogo estava muito aberto. Fazia sentido todos os partidos tentarem suas chances. Agora, a motivação é que há um choque sem precedentes do sistema político. A corrupção fragilizou a maioria dos partidos e tornou inelegível o principal candidato de esquerda. Isso que abriu o jogo desta vez, tanto para a esquerda, porque todos querem os votos de Lula, quanto para a direita;, avalia o especialista.

A cientista política Silvana Krause, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), atribui o alto número de candidatos à instabilidade política e à possibilidade de agora, depois de anos, haver uma oportunidade para romper com o ciclo PT-PSDB, já que os dois partidos estão envolvidos em escândalos de corrupção. O líder de um deles está preso e o outro não tem muito carisma e não desponta muito nas pesquisas, apesar das alianças que conseguiu firmar. ;A conjuntura de descontentamento do eleitor naturalmente fez muitas lideranças resolverem lançar candidaturas;, apontou Silvana.

Atores

Depois das eleições de 1989, o PT conseguiu a hegemonia na esquerda. Ele passou a ser o principal ator na disputa com o centro, representado pelo PSDB. Em 1989, a diferença entre Lula, o candidato petista, e Leonel Brizola, do PDT, foi de menos de 1% dos votos, em uma disputa acirrada pelo eleitorado esquerdista. O cabo de guerra entre os dois partidos, por enquanto, não é muito diferente do que acontece em 2018 entre Ciro Gomes (PDT) e o candidato petista. Depois de quase 20 anos hegemônico, garantindo participação no segundo turno, o PT volta a disputar com o PDT um nome de centro-esquerda para representar essa fatia do eleitorado. ;Estamos revivendo aquela disputa, de certa forma;, conta Tadeu. O cientista político João Feres lembra que há diferenças nessa comparação. ;O PT, à época, era um partido menor, muito longe do que se tornou hoje. O PDT continua mais ou menos do mesmo tamanho. São partidos de tamanhos diferentes.;

Cabeça a cabeça

Collor (PRN) - 30,47%
Lula (PT) - 17,18%
Brizola (PDT) - 16,51%
Covas (PSDB) - 11,51%
Maluf (PDS) - 8,85%
Afif (PL) - 4,83%
Ulysses (PMDB) - 4,73%
Freire (PCB) - 1,13%
Aureliano (PFL) - 0,88%
Caiado (PSD) - 0,72%
Camargo (PTB) - 0,56%
Enéas (PRONA) - 0,53%
Marronzinho (PSP) - 0,33%
Gontijo (PP) - 0,29%
Zamir (PCN) - 0,27%
Lívia (PN) - 0,26%
Eudes (PLP) - 0,24%
Gabeira (PV) - 0,18%
Celso Brant (PMN) - 0,16%
Pedreira (PPB) - 0,12%
Horta (PDCdoB) - 0,12%
Armando (PMB) - 0,01%

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